(*) Onara Lima

Uma empresa ou fundo de investimentos devem observar a forma como a governança dos aspectos socioambientais afetam os seus negócios influenciando os resultados econômicos, valor da empresa (materialidade financeira), mas, também devem estar atentos à forma como as suas operações afetam os stakeholders e o ambiente (materialidade de impacto). Essas questões estão no cerne de algo chamado “dupla materialidade”. Embora o tema traga as suas complexidades, estamos possibilitando uma melhor análise a partir de um mergulho mais profundo e um olhar mais amplo sobre os aspectos ESG.

A materialidade é um conceito de contabilidade financeira, e sua utilização e relevância através de uma estratégia de sustentabilidade no mundo dos relatórios, identifica os temas mais pertinentes para a empresa e seus stakeholders dentro da agenda ESG e desempenha um papel tanto na preparação das divulgações e sua verificação, pensando no processo de auditoria dos relatórios, que contribuiu para agregar confiabilidade e transparência ao documento.

Contextualizando o cenário na linha do tempo, a Comissão Europeia foi o primeiro organismo oficial a publicar uma definição de dupla materialidade nas suas orientações de 2019 sobre relatórios não financeiros. O EFRAG (European Financial Reporting Advisory Group) foi responsável pelo primeiro conjunto de normas europeias para a elaboração de relatórios de sustentabilidade ESRS (European Sustainability Reporting Standards), exigindo que as empresas reportem usando uma perspectiva de dupla materialidade em conformidade com as Normas Europeias de Relatórios de Sustentabilidade, publicada em julho de 2023.

Em 2021, a GRI (Global Reporting Initiative) acolheu favoravelmente a proposta de CSRD (Corporate Sustainability Reporting Directive) da União Europeia (EU), que confirmou a adoção da dupla materialidade, reportando tanto os fatores de sustentabilidade que afetam a empresa, como o impacto da empresa na sociedade e no ambiente (materialidade externa), para identificar riscos e oportunidades financeiramente relevantes. Este conceito impulsiona a sustentabilidade e apoia uma melhor tomada de decisões por parte de investidores e outras partes interessadas.

De acordo com a IFRS (International Financial Reporting Standards), um tema é material se influenciar a percepção dos investidores sobre o valor de uma empresa; o quanto pode representar um risco material para o negócio. Recentemente, o ISSB (International Sustainability Standards Board) estendeu, com a IFRS, o conceito de materialidade financeira para sustentabilidade, fornecendo duas definições de dupla materialidade:

 A materialidade financeira dos tópicos de sustentabilidade descreve como a sustentabilidade impacta o desempenho financeiro e as perspectivas de uma empresa.

 A materialidade do impacto da sustentabilidade define como as atividades, operações e cadeia de valor de uma empresa impactam as partes interessadas externas e o mundo em geral.

Embora o foco das Normas IFRS seja a materialidade financeira, vale observar que impactos financeiros na organização decorrentes de riscos e oportunidades relacionados à sustentabilidade ESG, possuem relação com impactos positivos e negativos gerados pela empresa.

Por que a dupla materialidade pode ser uma ferramenta estratégica organizacional. Para as empresas, a abordagem de dupla materialidade deve ser considerada na avaliação de riscos, oportunidades, tomada de decisões estratégicas, planejamento de curto, médio e longo prazo, levando em consideração o setor de atuação e o seu contexto organizacional, bem como a maturidade da companhia nos aspectos ESG, incorporando a perspectiva de dentro para fora, e de fora para dentro.  A abordagem da dupla materialidade pode ter impactos causados ​​diretamente pelas próprias operações, produtos ou serviços da empresa, ou impactos ligados à cadeia de valor, extrapolando para a montante e a jusante da empresa, não se limitando apenas às relações contratuais diretas.

Neste exemplo, se um processo de terceirização de um serviço, utilizar trabalho infantil em algum ponto da sua cadeia de fornecimento, isso representa um risco material, mesmo que a própria empresa possa não ter causado conscientemente ou contribuído diretamente para o impacto negativo. Outro exemplo de dupla materialidade no setor dos serviços financeiros envolve a forma como os bancos avaliam as suas práticas e carteiras de empréstimos para se certificarem de que não estão financiando, mesmo que indiretamente, atividades prejudiciais ao meio ambiente. Estas decisões podem ter um impacto no desempenho financeiro do banco e o risco de crédito.

A utilização do conceito da dupla materialidade possibilita que a estratégia do negócio esteja conectada com os temas de sustentabilidade, identificar o que é mais relevante para a organização, para os seus stakeholders, focada em uma governança bem estruturada e transparente, contribuindo para uma melhor tomada de decisões fundamentadas sobre a materialidade, e garantir que o tempo e os recursos sejam direcionados a partir dessa matriz.

Seria a Dupla Materialidade o caminho factível para o tão falado “Gerar valor compartilhado”? Ou o caminho para internalizar as externalidades, reduzindo os riscos inerentes ao negócio?

Como sabemos, sustentabilidade não é sobre “OU”, mas sim sobre “E” …. Logo, independentemente de críticas, “E” aplausos, o fato é que a Dupla Materialidade terá cada vez mais espaço “E” veio para ficar.

(*) Onara Lima é executiva de Sustentabilidade.

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