Quando assumiu a presidência da República em 2003, em sua terceira tentativa (fora derrotado por Fernando Collor, em 1989, e duas vezes por Fernando Henrique Cardoso (1994 e 1998, ambas no primeiro turno), Luiz Inácio Lula da Silva pôs no ministério da Fazenda Antonio Palocci, no Banco Central do Brasil (que ainda não era independente) Henrique Meirelles e na Casa Civil José Dirceu. 

Lula entregou a administração aos três e se deu muito bem. Limitou-se a fazer discursos para o povão, pronunciamentos nos quais a grande vítima era a língua portuguesa, e a fazer viagens ao exterior, onde se refestelava nas suítes presidenciais de hotéis estrelados. 

Nos encontros com seus colegas chefes de Estado, fazia, sem perceber, o papel de bobo da corte. “Esse é o cara”, divertia-se Barak Obama, dando palminhas nas costas do presidente brasileiro.  

Enquanto isso, Antonio Palocci, Henrique Meirelles e José Dirceu cuidavam da “coisa pública”. 

Palocci aumentou a meta de superávit primário e Dirceu garantiu, pagando em cash, a maioria do governo nas casas do Congresso. Meirelles cuidou com grande brilho da política monetária. 

No início de 2006, Palocci perdeu o cargo por ter quebrado, sem autorização judicial, o sigilo bancário de Francenildo Costa, caseiro da “casa de folguedos” que o ministro frequentava. 

Alguns meses antes, quem saiu foi Dirceu, por causa da revelação, pelo deputado fluminense Roberto Jefferson, das mesadas que o Planalto pagava pelos votos que recebia no Legislativo. 

Da trinca, Meirelles foi o único que sobrou no governo. Sua atuação foi bastante favorecida pelo exuberante crescimento do PIB da China, que alcançou taxas de dois dígitos. 

Com os chineses comprando commodities brasileiras, nossa balança comercial passou a ter superávits após superávits, tendo como consequência um aumento substancial de nossas reservas internacionais. 

Lula tinha 80% de aprovação popular quando, em 1º de janeiro de 2011, passou a faixa presidencial para Dilma Rousseff, que antes assumira a Casa Civil substituindo José Dirceu. 

Veio então a operação Lava-Jato que, entre outras coisas, apurou escândalos os mais diversos, escândalos esses que levaram Lula para a cadeia em Curitiba, onde permaneceu 580 dias. 

Foi um Lula amargo que assumiu o Planalto em 1º de janeiro de 2023. Amargo, prepotente e convicto de que tudo que fazia dava certo. 

Lula já não manda quase nada e, se mandasse, as coisas estariam piores do que estão. 

Inconformado com a independência do Banco Central, se arvorou em monetarista. Quis que a meta de inflação subisse para 4,5% ao ano, sem ter a menor noção de que, quando a autoridade aumenta a meta, esta vai muito além do proposto. 

Quando o COPOM (Comitê de Política Monetária do Banco Central) afirmou que os dois próximos movimentos da taxa Selic seriam de 50 pontos para baixo, o mercado financeiro (mas não Lula) sabia que isso era apenas uma estimativa (forward guidance). 

O cenário fiscal se deteriorou (sem que o governo movesse uma palha para cortar gastos) e o COPOM baixou a taxa em apenas 25 pontos (0,25%), mandando às favas o forward guidance. O placar foi de 5 a 4, com o presidente do BC, Roberto Campos Neto, desempatando, em favor dos 25 pontos, os 4 a 4 que prevaleciam até seu voto de Minerva. 

Digno de nota é que os quatro votos em favor da redução de 0,50% foram dados por componentes do colegiado indicados por Lula, enquanto os cinco da vitória vieram das hostes que já existiam quando o presidente da República tomou posse. 

Veio então a reunião de 18 e 19 de junho de 2024. 

Havia um consenso quase unânime de que o COPOM manteria a Selic inalterada. A grande dúvida era o placar, que poderia variar de nove a zero até cinco a quatro. 

Fechados os mercados, o COPOM informou que, por unanimidade de votos, a taxa Selic se manteria inalterada. 

Se até aquele momento Lula achava que estava formando uma bancada governista no COPOM, se decepcionou profundamente. 

Antes ele atacava especialmente o presidente Campos Neto, a quem chama de “aquele rapaz” ou “esse moço”. Agora, após os nove a zero, em vez de ficar calado, se fingindo de morto após uma decisão tão acachapante, disse que a “decisão do Copom foi sem explicação e sem nenhum critério’.” 

No Congresso Nacional, Lula ainda consegue algumas vitórias esparsas, que custam cargos, promoções, aumentos etc. 

Já no Copom não dá. Eles fazem parte de uma instituição independente. 

Quem diminui um pouco esse conflito é o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Mas pode surgir uma ocasião na qual Haddad perca a paciência e peça seu boné.

Nos Estados Unidos, é raro um presidente da República criticar o FOMC (Federal Open Market Committee – Comitê Federal de Mercado Aberto), órgão do FED (Federal Reserve Bank). 

Tanto é assim que mesmo sendo um ano eleitoral, e o FOMC praticando uma política hawkish para trazer a inflação para dois por cento ao ano, Joe Biden não fala nada. 

Um forte abraço para os caros amigos assinantes leitores.

Ivan Sant’Anna

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