(texto escrito em 13/12/2023) 

Em fevereiro de 1971, fiz parte da delegação do Fluminense Football Club que passou uma semana em Caracas, na Venezuela, disputando duas partidas da fase inicial da Copa Libertadores das Américas daquele ano.

Na oportunidade, vencemos o Deportivo Galícia por 4 a 1 e o Deportivo Itália por 6 a 0.

Só que o teor desta crônica não é sobre futebol e sim sobre o entrevero entre Guiana e Venezuela, provocado por este segundo país.

Naquela ocasião em que estive em Caracas, o petróleo e seus derivados eram produtos de baixo valor.

Os preços só iniciariam um gigantesco bull market dois anos e meio mais tarde, em outubro de 1973, com a eclosão da guerra do Yom Kippur e consequente primeiro choque, provocado pelo embargo ao Ocidente.

Mesmo com gasolina barata (quase de graça para os venezuelanos), o país pouco se aproveitava da riqueza que jazia em seu subsolo.

Tudo lá era importado, desde escova de dente até eletrodomésticos. Havia Cadillacs por tudo quanto é canto, mesmo porque eles podiam importar carros usados dos Estados Unidos, coisa que o Brasil jamais permitiu.

Pois bem, os dois choques do petróleo enriqueceram diversos países do Oriente Médio, mas a Venezuela, mesmo sendo a detentora das maiores jazidas provadas do planeta, não aproveitou a oportunidade.

Pior: estatizou a indústria petrolífera, criando a PDVSA (Petróleos de Venezuela S/A), que prima pela ineficiência e por ser um cabide de emprego para os parentes e apadrinhados dos governantes.

Com o passar do tempo, e o advento do “chavismo”, isso só veio piorar. Tanto é assim que, com toda sua reserva petrolífera (300 bilhões de barris), o país é apenas o 22º produtor mundial, um quarto da extração brasileira.

Nos últimos anos, surgiu um fenômeno no mercado de hidrocarbonetos. Trata-se da Guiana (antiga Guiana Inglesa), o país que mais cresce no mundo e detém a maior reserva e a maior produção per capita (são apenas 800 mil habitantes) do planeta, produção essa extraída pela Exxon Mobil.

Agora, o ditador venezuelano Nicolás Maduro está querendo se apropriar do petróleo guianense, bombeado na região de Essequibo, que não só compreende dois terços do território da antiga colônia inglesa, como detém a totalidade das reservas petrolíferas, no subsolo continental e, principalmente, nas bacias offshore.

Maduro tomou diversas atitudes, algumas ridículas, outras irregulares, todas absurdas.

Convocou um plebiscito consultando os venezuelanos sobre a soberania sobre Essequibo.

Dos vinte milhões de eleitores, apenas metade apareceu para votar. Como não podia deixar de ser, a maioria assinalou o “sim”.

Feita a apuração dos votos, o ditador venezuelano nomeou um comandante militar e um governador civil para Essequibo, autorizou a PDVSA a explorar o petróleo do país vizinho, tudo isso na maior cara de pau.

É evidente que todo esse absurdo tem como único objetivo o fortalecimento político de Nicolás Maduro para as eleições presidenciais do ano que vem.

Não fosse tão bajulador do colega venezuelano, como ficou evidente quando o recebeu em Brasília em maio deste ano, exaltando suas virtudes democráticas, Lula poderia ter intervido rápida e severamente na situação, inclusive recebendo em Brasília o presidente Irfaan Ali, da Guiana.

Agora Maduro e Irfaan irão se encontrar em São Vicente e Granadinas, no Caribe. Diz o presidente guianense que a posse de Essequibo, e obviamente do petróleo ali existente, não estará em discussão.

Então, pergunto eu, o que eles estarão fazendo lá?

Para invadir Essequibo por terra, tropas venezuelanas teriam que passar por território brasileiro, hipótese totalmente impossível, já que o Brasil não autorizaria essa travessia.

Outra alternativa seria a de tropas venezuelanas cruzarem a impenetrável selva amazônica (situada entre a tríplice fronteira Brasil/Venezuela/Guiana e o Caribe) para a passagem de soldados, tanques e outros equipamentos militares.

Nem os fuzileiros navais americanos conseguem isso.

Por mar, a Venezuela poderia chegar ao litoral guianense, não fosse o fato de que sua pobre Marinha não resiste ao simples apito de um porta-aviões, ou mesmo de um destroier, americano, que poderia ir em socorro da Guiana.

O que não despertou o interesse de Lula (e parece que ele só se interessa por eleições) é que o crescimento descomunal do PIB da Guiana (40 % ao ano) poderia proporcionar ao Brasil uma excelente oportunidade de negócios, tais como a construção de estradas, portos, estaleiros, indústrias de base, etc. etc.

A Venezuela já não serve mais para nada, enquanto os bolivarianos (seja já o que significa isso) estiverem no poder e não sejam apeados pelo povo esfomeado.

Não fossem décadas e mais décadas de incompetência, mais tarde agravadas pelos chavistas, a Venezuela é outro país que poderia oferecer ótimos negócios para o Brasil.

Mas isso não acontecerá. Eles estão esperando a energia mundial se tornar limpa e renovável para dormir o sono eterno sobre aquele mar de combustíveis fósseis.

Um ótimo fim de semana!

Ivan Sant’Anna

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