(*) Renato Fernandes de Castro e Vivian Ribeiro Madsen Figueiredo

Na semana em que o escândalo envolvendo a má gestão contábil de uma das maiores empresas varejistas do Brasil e que resultou no seu pedido de recuperação judicial, a temática da governança assume posição de destaque no cenário corporativo. Isso porque a mencionada empresa tinha suas ações negociadas no Novo Mercado da Bolsa de Valores de São Paulo e um dos problemas ventilados foi a falta de governança corporativa e de que forma esse caso pode se tornar emblemático para que sejam realizados aprimoramentos na avaliação dos fundamentos das empresas.

A governança corporativa é um sistema que permite o bom relacionamento entre sócios, conselho administrativo, diretoria, órgãos fiscalizadores e demais partes de uma empresa. Por conseguinte, são as boas práticas de governança que permitem que uma organização empresarial seja dirigida e monitorada com princípios básicos, objetivo e alinhados para garantir a longevidade institucional, preservar seu valor de mercado, assegurar o acesso a investimentos e contribuir para o bem comum.

Assim, percebe-se que a governança corporativa e a adoção da sigla ESG – sigla em inglês para melhores práticas ambientais, sociais e de governança – não existem para serem manipuladas como acessório figurativo do qual uma empresa venha a se utilizar para transmitir a seus investidores e consumidores uma aparência ética e saúde financeira da companhia. Se a governança for adotada como um acessório que ela seja comparada a um par de óculos, através do qual a empresa deve enxergar toda sua composição, seu posicionamento no mercado, sua atuação social e, principalmente, pautar suas ações e decisões através das lentes desses óculos.

Portanto, é essencial que essas lentes sejam periodicamente ajustadas para acompanhar o desenvolvimento da instituição e a evolução do mercado. Os processos internos de governança e auditoria precisam de revisitação e monitoramento constantes, pois as boas práticas provenientes de uma governança corporativa bem estabelecida não se resumem ao cumprimento formal das normas e à observância das determinações estabelecidas pelas autoridades públicas para aquele segmento. É preciso ir além.

Agora, diante do cenário de desconfiança que o mercado apresenta é preciso ser confiável e não apenas se mostrar confiável. É preciso ser, e não apenas parecer ser. Como visto, não basta adotar um Conselho Fiscal e contratar uma empresa de auditoria de renome, mas acima de tudo é preciso publicar com transparência a real condição financeira das companhias.

Também não é suficiente adotar como “sobrenome” da empresa a sigla ESG, e apresentar resultados exclusivamente no setor ambiental e social, esquecendo que esses dois não perdurarão se a empresa se desestabilizar e tiver uma governança que não assegure seu cumprimento. Ou seja, se a governança coorporativa não tiver processos bem estabelecidos e direcionados para todos os responsáveis pelas tomadas de decisão, o ESG não está completamente estabelecido na empresa e as boas práticas ambientais e sociais tampouco serão suficientes para mantê-la.

Diante deste cenário, cabe questionar se o descaso na aplicação dos processos básicos de governança demonstra o desconhecimento generalizado a respeito da importância de tais práticas ou a intencionalidade fraudulenta e pontual de gestores que não atuaram em favor dos interesses de seus acionistas. Se a conclusão das recentes discussões indicar para a última hipótese, o momento agora é de revisar os procedimentos estabelecidos para acompanhamento e fiscalização dos demonstrativos contábeis das companhias.

(*) Renato Fernandes de Castro e Vivian Ribeiro Madsen Figueiredo são advogados na Almeida Prado & Hoffmann Advogados Associados.

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