Na agenda de 10 entre 10 CFO’s atualmente está a preocupação com a retenção de talentos. Os números de turnover tem escalado como nunca e na área financeira é ainda mais desafiador. Uma pesquisa feita pelo Linkedin revelou que 60% dos brasileiros consideram mudar de emprego em 2023. A motivação para troca de emprego começa em salários e benefícios mais altos, mas some-se a isso equilíbrio de trabalho e vida profissional, desejo de trabalho remoto e maiores oportunidades de crescimento entre outros.

Não há nada de novo. O turnover já é há alguns anos uma das cinco maiores preocupações dos executivos de finanças. Mas o crescimento acelerado dos índices e a alta rotatividade das equipes exigem dos líderes planos de ação agressivos e detalhados na guerra pela retenção das melhores cabeças.

Onde entra o aspecto geracional?

Os números são ainda maiores na geração Z, subindo para 64% que pretendem mudar de emprego em 2023. Se avaliarmos as principais características da geração, fica fácil estabelecer esta correlação. Essa geração, que inclui todos os profissionais nascidos a partir de 1998, é inteiramente digital pois nasceu na era da internet “no bolso”. São independentes e valorizam o crescimento profissional acima da estabilidade, não estão dispostos a abrir mão da vida pessoal para dedicar horas adicionais ao trabalho.

Se lembrarmos que as características de uma geração resultam das circunstâncias históricas únicas experimentadas por ela é imprescindível incluir nesse recorte a pandemia que vivemos recentemente. Um período de grandes desligamentos por crise econômica demonstrou a essa geração recém entrada no mercado de trabalho, a fragilidade das relações. A flexibilidade trouxe a fluidez das relações de trabalho que podem acontecer em lugares e horários diferentes do que habitualmente aconteciam. É natural que estas alterações tenham causado questionamentos adicionais para estes profissionais.

Estratégias para reduzir o turnover

O que as empresas tem feito para mitigar o problema de turnover e aumentar o tempo de permanência dos seus talentos?

Estrutura de cargos e salários mais robustas e agressivas estão no topo das iniciativas. Benefícios diferenciados também são ferramentas que costumam ajudar em decisões de retenção. Os líderes tem investido muitos recursos em programas de feedback avançados, e construção de plano de carreira em conjunto com os colaboradores buscando estimular a estadia prolongada nas empresas. Da mesma forma vem acelerando iniciativas de treinamento e desenvolvimento individual.

Sem dúvida quando estas prioridades estão na pauta da liderança o resultado se traduz em menor turnover. Mas será isso suficiente? Será essa a receita para o problema que não é novo e só vem ficando maior?

Uma outra perspectiva

Muitas vezes parecemos estar usar velhos remédios para novas doenças, velhas vacinas para vírus completamente novos. Gostaria de provocar um reflexão diferente. E se admitirmos que o turnover é esse, que veio para ficar e talvez só vá piorar? O que faríamos diferente? Será que nosso investimento deveria ser em planos de carreira ou deveríamos voltar este investimento para ciclos cada vez mais rápidos, intensos para ambas as partes.

A geração Z faminta de velocidade e conteúdo poderia dar mais de si, num ambiente mais veloz e dinâmico. Se o recrutamento das empresas levar essa realidade em conta nas contratações, poderemos ter foco cada vez mais na velocidade de aprendizagem, na capacidade de adaptação rápida, e menos no histórico profissional. Poderemos dar ênfase para conhecimento em módulos, pequenos blocos de conhecimento adequados para aquele momento profissional em lugar de pós graduação ou MBA por exemplo. O mundo está mudando e o fato é que precisamos mudar nossas técnicas de gestão para nos adaptar a ele.

Faça uma reflexão

Podemos pensar numa provocação adicional. Faça um paralelo com seu relacionamento. Se ao invés do “para sempre”, ou “até que a morte os separe, você ouvisse: “Vocês tem 3 anos para serem felizes ao máximo”. O que você mudaria na sua vida hoje? Quanto de si você daria nesses três anos intensos, felizes e únicos. Quão especial você faria estes 3 anos serem?

E se por um momento pensarmos nas carreiras dessa forma? Seremos felizes corporativamente por três anos. Nesse caso usaríamos nossas ferramentas de gestão para que estes três anos fossem de máximo aprendizado, performance elevada e evolução constante.

A resposta talvez não seja este extremo, a provocação foi forçadamente exagerada. Mas ela também não parece ser o que estamos fazendo atualmente. Precisamos repensar se devemos combater o turnover, ou se devemos mudar nossos hábitos para viver intensamente o turnover e tirar o que ele tem de melhor. Ciclos curtos podem ser bem sucedidos, se nos prepararmos para eles, podem trazer profissionais ávidos por desafios se estivermos preparados para desafiá-los e não submetê-los ao velho modelo.

Preparando-se para o futuro

Se a perspectiva do turnover ser uma oportunidade e não um problema parece ser uma abordagem importante então avaliar a influência das gerações sobre o turnover torna-se ainda mais necessário. A notícia não é boa. A geração Alpha, das crianças nascidas a partir do ano 2010 entrará para o mercado de trabalho em 5 anos. Essa geração traz como algumas das suas características o desapego de fronteiras geográficas, a valorização intensa de experiências em detrimento a objetos e bens materiais.

A geração alpha aprende fazendo, o conhecimento é adquirido através da experiência, utilizando o pensamento crítico e habilidade de solução de problemas. Para esta geração a separação entre o mundo físico e digital não faz sentido, é tudo ao mesmo tempo agora. Para esta geração trabalho híbrido já não será benefício e sim pré-requisito. Remuneração não será tão eficaz como ferramenta de retenção e a experiência de troca e crescimento numa empresa terá mais valor do que o cargo.

Se por um lado a notícia de que o cenário em breve se tornará ainda mais complexo não é boa, por outro, você acaba de descobrir que tem cerca de 5 anos para se preparar, repensar suas práticas e revolucionar a sua gestão.

O turnover é um tema que parece não ter solução e só vai piorar. É necessário direcionar esforços para sobreviver a ele e deixar de vê-lo como um problema mas sim como uma oportunidade de mudança. Estratégias de gestão do turnover podem ser determinantes para rentabilidade sustentável e sucesso estratégico das empresas. A nova geração já está batendo a porta, é urgente promover esta mudança antes que o problema fique ainda maior.

Evelyn Fleming – Diretora Financeira na Heineken Brasil, com sólida experiência em planejamento estratégico e financeiro em empresas multinacionais dos segmentos de Telecomunicação, Bens de Consumo e Serviços financeiros. Graduada em Administração Financeira, MBA em Administração Financeira pelo IBMEC e Mestrado em administração Estratégica pela PUC-PR. Membro do W-CFO é mentora de jovens executivas da área de finanças. Coautora do livro Mulheres em finanças e amante da gestão de pessoas. Mãe da Catarina e do Thomaz, ambos da geração Alpha que já prometem trazer desafios para seus futuros líderes.

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