O ato de tomar decisões é inerente ao ser humano e acontece de forma natural nas atividades mais cotidianas: a decisão do que comer, de qual canal de TV assistir, do que vestir. Neste mundo globalizado e em constante mudança, aliado à automatização de diversos processos, tudo acontece mais rápido e as pessoas, dentro deste contexto, buscam o imediatismo: trocar o banco pelo caixa eletrônico, posteriormente para fazer transações via internet banking, para então favorecer os aplicativos dos bancos e realizar transações em segundos. Neste cenário, a pressão para que as pessoas respondam cada vez mais rápido esbarra no tempo dispendido com o processo de tomada de decisão.
O processo decisório é complexo e envolve a avaliação de diversas alternativas à luz de critérios muitas vezes conflitantes entre si. Cada pessoa possui suas crenças, referências e conhecimentos, desenvolvidos ao longo de sua vida; assim, é provável que dois indivíduos decidam diferentemente quando confrontados com uma mesma situação.
A capacidade de julgamento e o uso da intuição são aspectos intrínsecos ao processo de decisão sob condições de incerteza. Julgamento engloba a avaliação, estimação e dedução de uma ou mais possibilidades a respeito de um conjunto específico de evidências e metas, ou seja, julgar significa fazer inferências a respeito de algo. Intuição é baseada em experiência acumulada e concerne à rápida compreensão de uma situação sem um pensamento analítico consciente. Portanto, de acordo com Souza & Guedes (2009), julgamentos intuitivos podem ser considerados processos de tomada de decisão sem raciocínio intencional.
A racionalidade esperada para um bom tomador de decisão é um dos aspectos que as finanças comportamentais investigam ao integrar conceitos comportamentais ao universo envolvente dos números e cálculos.
Toda essa discussão acerca dos aspectos envolvidos na tomada de decisão nos leva a refletir sobre em que momento o comportamento do ser humano passou a ser levado em consideração.
Em uma rápida retrospectiva, os pressupostos básicos das finanças tradicionais têm passado por questionamentos acerca de sua aplicabilidade. Oscilações entre correntes de pensamento são frequentes na evolução das ciências e particularmente verdadeiras nas discussões acadêmicas sobre finanças e economia.
Se por um lado os modelos teóricos tradicionais possibilitam o direcionamento e o entendimento das decisões empresariais, as discrepâncias entre as atitudes esperadas e os comportamentos efetivos instigaram a busca por novos pontos de vista.
Enquanto a teoria moderna de finanças admite a hipótese de mercados eficientes e de racionalidade, onde o tomador de decisão é primordialmente um agente racional, as teorias de finanças comportamentais surgem como uma crítica a esta visão, convidando a uma reflexão sobre o papel do tomador de decisão como um agente sujeito a falhas e influenciável por suas emoções.
Se FINANÇAS já foi definida como a arte e a ciência da gestão do dinheiro, como poderia a tomada de decisão em finanças envolver apenas racionalidade?
Devido a essa lacuna na teoria neoclássica que abordagens vindas da Psicologia e da Sociologia passaram a ser consideradas na análise de tomada de decisão. Neste interim, os estudos com abordagem de finanças comportamentais apresentam um grande desafio que é justamente introduzir o fator emocional e comportamental à realidade de finanças, um universo onde o raciocínio lógico e a razão deveriam ser traços dominantes.
O movimento de contestar as verdades da Teoria Neoclássica ganha destaque com o prêmio Nobel de economia Herbert Simon (1978) por sua contribuição para o entendimento do processo decisório nas organizações.
Em seguida temos a Teoria dos Prospectos, de Kahneman e Tversky (1979) que levou tempo para ser digerida pela comunidade científica, pois sua base defende que a dor da perda é maior do que a satisfação do ganho, portanto haveria fatores emocionais que influenciariam as decisões.
Os defensores do tema argumentam que a racionalidade limitada é intrínseca à natureza humana e isso deve ser incorporado à análise econômica como extensão natural dos atuais modelos, sendo que esta subjetividade pode causar importantes desvios com consequentes implicações econômicas.
Os modelos financeiros tradicionais têm como hipótese a racionalidade do agente econômico que, no processo de tomada de decisão, é capaz de analisar todas as informações disponíveis e considerar todos os fatores para a solução do problema. Essa pressuposição contradiz os resultados de diversos estudos realizados por psicólogos e psicanalistas de todo o mundo, que concluem que a racionalidade não é o centro ou a diretriz do pensamento humano.
O homem das Finanças Comportamentais não é totalmente racional; é um homem simplesmente normal. Ele sente, se equivoca, não acerta sempre, suas análises e decisões estão sujeitas a erros e vieses.
Isso soa bem mais próximo à vida real, não é mesmo? Traz um certo alívio concluir que não funcionamos com máquinas.
Racional versus emocional?
Em seu livro Inteligência Emocional (1996), Daniel Goleman divide a mente em duas partes: mente emocional e mente racional. A mente racional é o modo de compreensão de que, em geral, temos consciência. É mais atento e capaz de ponderar e refletir.
Já a mente emocional é muito mais rápida que a racional, saltando à ação sem parar um momento sequer para pensar no que está fazendo. Sua velocidade exclui a reflexão deliberada, analítica, que é a característica da mente pensante. Na evolução, essa rapidez girava em torno da mais básica decisão: em que prestar atenção e, uma vez vigilante tomar em frações de segundo decisões como: eu como isso ou isso me come? Os organismos que precisavam parar muito tempo para pensar nessas respostas não tinham grandes chances de sobreviver.
A mente emocional age de forma instantânea e impulsiva. É similar ao processo de aquisição de bens de consumo supérfluos adquiridos por mero impulso. Em contrapartida, a mente racional é aquela que analisa todo o panorama antes da efetiva tomada da decisão. De fato, a mente emocional é responsável por tirar o ser humano de situações de risco, em momentos que exigem ação rápida. Entretanto, para a tomada de decisões que exigem estratégia, é preciso recorrer à mente racional, sob pena de precipitação e resultado negativo diverso do pretendido.
Baseados no princípio da racionalidade limitada, é possível perceber que quem efetivamente decide em ambientes organizacionais muitas vezes perde determinadas informações importantes durante o processo de tomada de decisão. Dessa forma, a escolha final nem sempre recai sobre a melhor alternativa possível, mas, sim, sobre a primeira alternativa encontrada que satisfaça às expectativas do tomador de decisão.
Muitos veem o tomador de decisão como um indivíduo que possui todo o controle do problema. Consideram que ele consegue escolher entre várias alternativas, sabendo no que elas consistem e tendo consciência para determinar a alternativa mais adequada. A racionalidade autenticamente se ocupa em buscar a melhor decisão que se possa tomar, dentro da seleção de alternativas disponíveis, e não necessariamente atinge os objetivos em toda sua plenitude.
Como disse algumas vezes um gestor que tive há alguns anos: temos que tomar a decisão considerando a melhor informação disponível no momento e seguir em frente.
É um alento saber que existe base científica para justificar o fato do ser humano não decidir como um robô. Que erros e acertos fazem parte do processo. Que se todos pensassem e agissem da mesma forma não haveria evolução.
A escolha diferente, o ponto de vista distinto, a discussão saudável se origina justamente da complexidade e do universo único que é cada pessoa.
Como gestora, mulher, mãe, filha, atleta, mentora, aprendiz, leitora voraz, curiosa, sou a soma de todas as experiências vividas, vieses adquiridos, dificuldades superadas, obstáculos ultrapassados, aprendizados colhidos aqui e acolá. Tudo isso se transforma num caldo rico e único, que acompanha cada passo dado e cada decisão tomada. Talvez essa seja a origem do valor intrínseco e da riqueza da verdadeira diversidade.
Tatiane Mendonça
Tem 41 anos, casada com o Marco, mãe da Nati e da Manu. Mestre em Controladoria e Finanças pela FIPECAFI. Formada em Comex pelo Mackenzie, com MBA Internacional pela Embry Riddle e cursando Engenharia Financeira pela FIA. São mais de 20 anos de experiência em Finanças com maior expertise em Tesouraria. Membro fundadora do W-CFO, membro atuante do IBEF, mentora no projeto Impulsionadoras e Aceleradoras de Carreiras do grupo Mulheres do Brasil, coautora do livro Mulheres em Finanças e Coordenadora do livro Mulheres na Aviação.