Domingo, 16 de julho de 1950 – Aos 10 anos de idade, eu estava sentado numa fila do setor 1 das cadeiras cativas do Maracanã, junto com meus pais e irmãos. 

O jogo era Brasil x Uruguai e decidia a Quarta Copa do Mundo, evento interrompido havia 12 anos por causa da Segunda Guerra Mundial 

Favorita absoluta (bastava um empate para sermos campeões) a seleção brasileira perdeu por 2 a 1, naquele vexame que ficou conhecido como Maracanazo

Do lado de fora do estádio, um soldado do Exército, de 19 anos, participava do patrulhamento. Seu nome: Mario Jorge Lobo Zagallo, alagoano de nascimento, mas criado no Rio de Janeiro. 

Antes do final daquele ano, ele, que era ótimo de bola, já jogava no Flamengo. E foi pelo time da Gávea que se sagrou tricampeão (1953, 1954 e 1955). Eu inclusive assisti a melhor de três contra o América e me lembro até da escalação rubro-negra: Garcia, Tomires e Pavão, Jadir, Dequinha e Jordan, Joel, Rubens, Dida, Evaristo e Zagallo. 

Do Flamengo, Zagallo se transferiu para o Botafogo, onde jogaria com monstros sagrados como Nilton Santos, Didi e Garrincha. E eu sempre acompanhando as partidas das arquibancadas, torcendo contra pois sou “tricolor das Laranjeiras”. 

Zagallo sagrou-se campeão do mundo na Suécia (1958) e bicampeão no Chile (1962), que foi quando o conheci pessoalmente, em Viña del Mar. 

Naquela época, o futebol era low profile, com os jogadores das quatro equipes de nossa chave (Brasil, Espanha, Tchecoslováquia e México) se encontrando toda noite numa casa de fliperama que também funcionava como bar. 

Pois bem, Zagallo continuou no Botafogo, onde encerrou sua carreira de jogador, mais tarde iniciando uma outra vitoriosíssima de técnico, tendo inclusive sido escolhido para treinar a seleção canarinho na Copa do Mundo de 1970, no México, à qual fui também. 

Em Guadalajara, onde dividíamos uma chave com Inglaterra, Tchecoslováquia e Romênia, os jogadores brasileiros se concentravam num hotel chamado Suites del Caribe. 

E foi lá que me relacionei melhor com o Velho Lobo, que ainda era jovem: 38 anos. 

Mudando de assunto, mas mantendo o espírito da temática desta coluna, o maior trader de mercado que conheci foi Alfredo Grumser Filho, o Malba Tahan.   

Antes de assumir uma posição na Bolsa, Alfredo consultava diversas pessoas, inclusive a mim. Depois disso, e só depois disso, tomava uma decisão. 

Para minha enorme alegria, seis meses após ganhar o tri, Zagallo foi contratado para ser técnico do Fluminense. 

Em seu jogo de estreia, contra o Palmeiras no Pacaembu, eu fui para o estádio no ônibus da delegação. E me sentei juntamente ao lado do Zagallo. 

Ele, tal como o Alfredo Grumser, me fez várias consultas sobre a escalação do time, o que seria de se estranhar já que se tratava do técnico campeão do mundo. 

Acontece que ele assumira a equipe havia apenas três ou quatro dias e mal conhecia o nome de alguns jogadores, muito menos suas características. 

Nos dois jogos seguintes, ele voltou a me consultar. Depois que firmou o pé, passou a tomar suas próprias decisões. Prudência! Essa era uma das principais características de Zagallo.  

Como eu tinha uma corretora de valores, Fator, passei a administrar sua carteira de títulos mobiliários. Fazia também sua declaração anual de imposto de renda. 

Em 1976, Zagallo foi convidado para ser técnico da seleção do Kuwait. Aceitou imediatamente e levou consigo, como preparador físico, Carlos Alberto Parreira, sendo este meu amigo até hoje. 

No Kuwait, Zagallo entregou sua carteira de investimentos a um fundo sediado na Suíça e, com isso, saí fora da jogada. 

Mais tarde, quando ele retornou definitivamente ao Brasil, passei a encontrá-lo esporadicamente, geralmente em reuniões na casa do Parreira. Nessas ocasiões, ele sempre me perguntava sobre o andamento da Bolsa. 

Apesar de jamais ter ficado desempregado, seja como jogador, seja como técnico, Zagallo foi sempre um exemplo de investidor prudente, dando enorme importância à segurança e a liquidez dos papéis que adquiria. 

Inclusive com imóveis, ele sabia lidar. Quando o condomínio de luxo Atlântico Sul foi lançado, na avenida Sernambetiba, orla da Barra da Tijuca, em 1985, Zagallo foi o garoto-propaganda do lançamento. 

Não sei se, para isso, ele recebeu um apartamento de graça, ou comprou com enorme desconto. O certo é que viveu nele praticamente até morrer. 

Sempre que conheço uma pessoa que dá exemplo em poupança (e não estou falando em cadernetas), gosto de mencioná-la aqui em minha coluna, inclusive falando sobre suas características básicas de investidor. 

A gente nunca sabe quando irá morrer (Zagallo se foi aos 92) ou ficar incapacitado para o trabalho. Por isso, temos de tomar essas pessoas como modelo. 

Como se tudo isso não bastasse, meu amigo Mario Jorge foi escolhido, pela revista inglesa “FourFourTwo”, como um dos maiores treinadores de todos os tempos. 

E tive o prazer e a honra de assistir inúmeras preleções dele aos jogadores, antes e no intervalo das partidas. 

Um forte abraço, 

Ivan Sant’Anna 

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