No primeiro dia deste ano, Luiz Inácio Lula da Silva assumiu a presidência da República em condições precárias.

Sua vitória sobre Jair Bolsonaro se dera por apenas 1,6% de vantagem e muita gente das hostes adversárias contestava a lisura do processo eleitoral. Como se não bastasse, em boa parte do território brasileiro, bolsonaristas acampavam em frente a quartéis do Exército e outras unidades militares.

A ideia desses manifestantes era iniciar um golpe de Estado, ao qual aderiria o Alto Comando das Forças Armadas. Tratava-se de uma ingenuidade coletiva pois não dá para assumir o poder com os países importantes, não reconhecendo a legitimidade do putsch e, com certeza, adotando sanções comerciais contra o Brasil.

Pois bem, Lula subiu a rampa acompanhado de representantes da diversidade brasileira, num grupo colorido no qual não faltou nem um cachorro. Foi uma posse curiosa mas, para um observador mais atento aos fatos, não dava para sentir firmeza no novo governo.

Veio então o domingo 8 de janeiro. O presidente derrotado se encontrava em Miami e Lula, em Araraquara, SP, onde uma tromba d’água destruíra boa parte da cidade.

A turba que se mantinha reunida em frente ao Quartel General do Exército, na capital federal, se deslocou para a Praça dos Três Poderes e invadiu os prédios do Congresso Nacional, do Supremo Tribunal Federal e do Palácio do Planalto.

Um grupo de militares de baixa patente, composto principalmente por soldados, cabos e sargentos da Polícia Militar do Distrito Federal, ajudou os invasores, mais por omissão do que por participação nos atos de vandalismo que se seguiram.

Com uma ou duas exceções, os oficiais superiores das Três Armas não participaram da tentativa de golpe, por sinal condenada, imediata e contundentemente, pelos estadistas estrangeiros mais importantes, com destaque para os presidentes Joe Biden, dos EUA, e Emmanuel Macron, da França, fora outros.

Numa atitude destemida, na qual o ministro do Supremo Tribunal Federal e presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes, se sobressaiu, as autoridades constituídas reagiram e o golpe (se é que tinha alguma chance) fracassou. Os rebeldes foram cercados por forças legalistas.

Mais de mil foram presos e, transcorrido quase um ano, aproximadamente 150 continuando detidos, sendo que alguns já foram julgados e condenados a penas que superaram 15 anos de detenção.

Pois bem, foi o fracasso do motim de 8 de janeiro que deu poder ao governo Lula, ressaltando que o presidente teve de dividi-lo com as Casas do Congresso Nacional e com o Supremo Tribunal Federal.

O certo é que deu certo (com minhas desculpas pelo pleonasmo). O país está fechando o ano em situação muito melhor do que se esperava no início.

A inflação baixou, as taxas de juros estão caindo e o Ibovespa fez uma nova máxima histórica.

Reforma tributária, upgrade nas agências de classificação de risco, orçamento com previsão de déficit zero, tudo isso veio para alegrar o réveillon.

Na Argentina, um anarcocapitalista (seja lá o que isso significa), Javier Milei, foi eleito presidente e tomou posse no dia 10 de dezembro.

Para tentar reverter décadas e mais décadas de retrocesso social e econômico, Milei está tomando medidas radicais, tais como extinguir subsídios, demitir funcionários públicos, proibir manifestações político-partidárias que interditem as vias públicas e implementar a realidade tarifária.

Com minoria no Congresso, Milei só conseguirá viabilizar suas reformas se conseguir amplo apoio popular, hipótese altamente improvável já que seu programa de governo imporá sacrifícios para quase todos os argentinos.

Nos Estados Unidos, em 2023, os mercados se comportaram de acordo com os dados de inflação e com a política de taxas de juros ditada pelo FED, que parece ter funcionado.

Resta agora saber se, em 2024, a economia fará uma soft landing (hipótese mais provável) ou se o país entrará em recessão.

Na Europa, todos os olhos se voltaram para a guerra russo-ucraniana. Após um início avassalador, o conflito entrou em um estágio estacionário, que não afeta os mercados internacionais.

O acontecimento mais importante do ano foi o ataque do Hamas ao sul de Israel, no dia 7 de outubro, ataque esse que deixou aproximadamente mil e quinhentos mortos, além da captura de uns 250 reféns.

A retaliação israelense não se fez esperar. A península de Gaza está sendo destroçada, em proporções tão colossais que boa parte do mundo se voltou contra as decisões de Benjamin Netanyahu.

Os países árabes não se envolveram na guerra. A exceção fica por conta do grupo Houthis, do Iêmen, que, patrocinado pelo governo do Irã, está pirateando navios mercantes no mar Vermelho.

Para evitar isso, muitos armadores estão enviando seus cargueiros pelo sul da África, não só aumentando consideravelmente o custo do transporte como também diminuindo o movimento do Canal de Suez, com sérios prejuízos para o Egito.

É nesse cenário que o ano de 2023 se transforma em 2024.

Ivan Sant’Anna

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