Fábio Rocha, Colunista de Plurale (*)
Muito se questiona dos conceitos e práticas de liderança no campo organizacional. Saímos da era do comando-controle realmente? Temos de fato líderes que entenderam que os maiores ativos são as pessoas?
E vale uma reflexão inicial. Que efeito teve e tem a pandemia nestes questionamentos tão intensos sobre a maneira mais efetiva de exercer a liderança?
De uma coisa não tenho dúvida, como se diz aqui na Bahia, quando a “maré baixa as pedras aparecem”.
As fragilidades de um modelo de liderança baseado no controle, na hierarquia tradicional, no poder da função, na ideia do super líder, na separação entre pessoa e profissional, no carisma vazio e na imposição das vontades do líder ficaram ainda mais expostas com todo o cenário da pandemia e particularmente com o trabalho remoto.
Outros elementos como a ideia também muita ultrapassada da competência para liderar apenas baseado em características comportamentais e/ou de que me torno líder apenas através de um “novo crachá” ou de um programa de desenvolvimento de lideranças excessivamente generalista também foram por terra.
E números de pesquisas recentes, como por exemplo, de acordo com a Center for Creative Leadership – CCL traduzem este cenário, afirmando que 50% dos líderes são ineficazes em suas organizações.
Com tantos anos ensinando a disciplina liderança em cursos de pós-graduação de renomadas universidades, de mais de 20 anos idealizando, coordenando e atuando como facilitador de programas de desenvolvimento de lideranças pela Damicos Consultoria e ainda com uma experiência rica em trabalhos de assessoramento direto/individual de líderes de organizações públicas, privadas e não-governamentais me pergunto o que realmente as empresas esperam dos seus líderes no pós-pandemia?
O começo desta resposta se inicia com o entendimento do cenário atual e futuro das organizações, pensando tanto neste momento de transição quanto no pós-pandemia.
Correndo o risco de uma generalização excessiva, percebemos que temos organizações que já tinham ambientes deteriorados, tóxicos e com relações muito negativas entre líderes e liderados. Com a angústia, incerteza, suspensões de contratos de trabalho, demissões e o distanciamento físico temos um clima quase que irreversível.
Também existem organizações que já tinham iniciado um bom trabalho de disseminação do seu propósito, de prática efetiva dos valores organizacionais, de muita transparência na comunicação e de líderes que construíram bons vínculos com seus times.
Dito isto, fica ainda mais claro que o exercício da liderança, tanto em níveis estratégicos quanto táticos e/ou operacionais, dão o tom no campo dos intangíveis organizacionais.
O clima organizacional, o nível de engajamento, visão sistêmica, ética e espirito de dono não serão possíveis com ante exemplos cotidianos dos líderes de uma organização.
E não existirá nenhuma chance de produtividade, conexão com o negócio e resultados sem este exercício de liderança que reforce na prática os elementos positivos de uma cultura organizacional voltada para pessoas.
Todo este cenário e variáveis já existiam antes da pandemia, afinal de contas instabilidade, incerteza, pressão e mudanças emergentes já faziam parte do nosso cotidiano antes da COVID-19.
Só que estes elementos se intensificaram e ainda serão permanentes no pós-pandemia, no qual teremos grandes e graves impactos econômicos, sociais e políticos a serem enfrentados.
Uma pesquisa feita pela Helthtech de Saúde Mental Ginger descobriu que para 69% dos colaboradores o coronavírus foi o período mais estressante de sua carreira. Além disso, 88% disseram que experimentaram estresse moderado a extremo nas primeiras semanas de pandemia.
Sem nenhuma pretensão de esgotar o tema, vamos apresentar aqui que tipo de líderes ou aspectos da liderança as empresas esperam ou precisam agora e no pós-pandemia.
Primeiro, o chamado líder de “verdade”, aquele que tenha coerência entre discurso e prática, fazendo no seu exemplo cotidiano um elemento de reforço continuo dos valores e comportamentos que devem ser praticados naquela organização.
Segundo, um líder que realmente acredite nas pessoas e particularmente em seus times, que invista na construção de relações saudáveis, de confiança, criando vínculos efetivos seus com seus liderados. Que invista tempo no desenvolvimento dos membros da sua equipe, não só no campo das competências técnicas, mas, principalmente nas competências comportamentais.
Terceiro, um líder disposto a desenvolver um pensamento digital, entendendo que a tecnologia é um grande aliado neste desafio, mas, que o verdadeiro pensamento digital tem a ver com a capacidade de rever o seu mindset, de rever as suas crenças, de rever as suas percepções de mundo e de rever a própria forma de exercer a liderança.
Quarto, um líder capaz de se livrar de preconceitos, estereótipos, sabendo gerenciar este mundo da diversidade, inclusive da diversidade geracional. Sendo capaz de não julgar o seu colaborador por serem ou fazerem opções diametralmente opostas das suas ou de tradições de outrora.
Quinto, um líder que entenda que pessoas, resultados, lucro e sustentabilidade andam juntos, sendo capaz de criar ou recriar estratégias, produtos e/ou serviços que dialoguem simultaneamente com estes elementos.
E por fim, um líder que deseje diariamente evoluir no exercício da liderança, acreditando que o autoconhecimento é uma excelente ferramenta para dar suporte a esta evolução, que entenda que as individualidades e a empatia serão a base para uma liderança mais efetiva e humana.
(*) Fábio Rocha ([email protected]) é Colunista Plurale. Especialista em Carreira, Consultor nas áreas de Liderança e Cultura Organizacional, Professor, Coach e Diretor-Executivo da Damicos Consultoria em Liderança e Sustentabilidade.