No início de junho, o Poder Executivo enviou Projeto de Lei ao Congresso Nacional (autuado como PL nº 2.925/2023), que “[a]ltera a Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976, e a Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, para dispor sobre a transparência em processos arbitrais e o sistema de tutela privada de direitos de investidores do mercado de valores mobiliários”. Atualmente, o PL encontra-se aguardando os encaminhamentos necessários pela Câmara dos Deputados, iniciando de maneira efetiva o processo legislativo.

A intenção do projeto, constante na Exposição de Motivos EM nº 00045/2023 – MF, assinada pelo Ministro da Fazenda Fernando Haddad, é “aperfeiçoar os mecanismos de tutela privada de direitos de acionistas minoritários contra prejuízos causados por atos ilícitos de acionistas controladores e administradores de companhias abertas, visando a conferir maior segurança jurídica para investidores do mercado de capitais”.

Dentre os diversos pontos tratados, neste espaço apresentaremos as propostas de alteração da Lei das Sociedades Anônimas.

Novas regras sobre arbitragem

Regulamentada no Brasil desde 1996 (Lei Federal nº 9.307/1996), a arbitragem é um método extrajudicial e privado de resolução de disputas, em que as partes atribuem a um árbitro o poder de decidir o conflito.

Por meio da arbitragem (que, no caso de uma arbitragem societária, podem ser os sócios litigando entre si, contra os controladores, ou contra a própria sociedade), é possível às partes escolher um árbitro de comum acordo, em geral especialista na matéria colocada em discussão.

Além disso, todo o procedimento é “personalizável”, inclusive o prazo para que o árbitro entregue sua sentença. Assim, o processo arbitral tem a vantagem de ser mais célere, em geral, do que o procedimento judicial: dados da pesquisa Arbitragem em Números, elaborada pela Professora Selma Ferreira Lemes (uma das autoras da Lei de Arbitragem no Brasil), indicam que a duração média de uma arbitragem no Brasil é de apenas 18,41 meses.

É certo, porém, que o instituto da arbitragem não é imune às críticas; todavia, o PL nº 2.925/2023 busca enfrentar as principais dificuldades enfrentadas pela arbitragem societária, propondo as seguintes mudanças:

(i) Há inclusão da possibilidade de as disputas com os administradores serem resolvidas por arbitragem (alteração do art. 109, § 3º, da Lei nº 6.404/76);

(ii) A publicidade do procedimento arbitral envolvendo companhias abertas passaria a ser a regra, contribuindo com a transparência do mercado;

(iii) Passa a ser obrigatória a divulgação dos precedentes das câmaras arbitrais envolvendo companhias abertas, o que permitirá a criação de uma “jurisprudência arbitral” no Brasil. Essa medida aumentaria a segurança jurídica, além de garantir a coerência e integridade das decisões entre si (como exigido pelo Código de Processo Civil).

Proteção dos acionistas minoritários e responsabilização dos administradores

Com relação a essa temática, o PL avança consideravelmente na proteção dos acionistas minoritários, uma vez que prevê a possibilidade de propositura de Ação de Responsabilidade pelos acionistas titulares de 2,5% do capital social em companhias cujo capital seja de até R$ 50 milhões (e cuja participação acionária será aquela do momento da propositura da ação, não prejudicando o acionista que venha a alienar suas ações após o ingresso da demanda judicial). Além disso, o Projeto exige que a Companhia aberta dê divulgação à propositura da Ação de Responsabilidade, como fato relevante, o que reforça os deveres de transparência e tende a aumentar a confiança dos investidores no mercado de capitais.

O PL também traz interessante mecanismo de incentivo para a atuação diligente dos acionistas minoritários na fiscalização da Companhia, ampliando o prêmio a ser pago ao minoritário que obtiver sucesso na ação de responsabilização contra os acionistas controladores (art. 246), dos atuais 5% para 20% sobre o valor da indenização; como também pretende estender a hipótese às ações de responsabilidade contra os administradores (art. 159).

Por fim, uma modificação muito importante é a que prevê que a simples aprovação das contas não mais exonera os administradores e fiscais da responsabilidade (art. 134, § 3º), passando a ser necessário que haja item específico na ordem do dia quanto a isso. É, sem dúvida, uma radical mudança que reforçará o accountability de diretores, conselheiros de administração e conselheiros fiscais, demandando uma guinada cultural no sentido de maior responsabilidade dos gestores e de maior participação dos acionistas minoritários.

Imagem: pixabay.com

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