Estamos no período pré-assembleias gerais ordinárias, aquelas que devem acontecer até o final do quarto mês de cada ano, comumente chamadas simplesmente como AGOs. É nelas que os acionistas votarão vários temas, dentre eles a eleição de membros para o Conselho de Administração e para o Conselho Fiscal, este apenas para as empresas nas quais o órgão existe.
Nesse momento, as empresas mais estruturadas em governança já deveriam, em tese, saber o perfil dos candidatos que completariam as competências necessárias ao colegiado, levando também em consideração o prazo do mandato de cada um dos conselheiros, assim como a conveniência ou não da sugestão de reconduções dos conselheiros atuais.
Headhunters, conselheiros e empresas estão, portanto, em uma fase de identificação de nomes de profissionais para que estes sejam convidados a aceitar eventuais indicações, não sem antes os candidatos avaliarem se têm as competências e o tempo necessários para o exercício da função, assim como outras verificações acerca das empresas e as suas governanças.
Nos últimos anos, os acionistas passaram a buscar candidatos que representassem mais a vida real, em decorrência de mudanças culturais da sociedade, que passou a exigir a presença de pessoas mais diversas nos conselhos. A mudança começou atacando a falta de diversidade de gênero, o que fez com que houvesse um impulso na procura por mulheres conselheiras, de forma a representar também nos conselhos o que acontece na sociedade. Há mais mulheres no Brasil do que homens.
Na sequência, a sociedade passou a também exigir diversidade de raça, diversidade de cor, pois o Brasil também tem mais não brancos do que brancos, e essa diversidade tampouco estava presente nos conselhos e na alta gestão das companhias.
E as mudanças na pararam por aí. Apesar de ainda ser uma iniciativa tímida e muito lenta, algumas poucas companhias têm avançado no tema diversidade e buscado conselheiros que também sejam diversos na sua orientação sexual. O motivo para essa busca decorre do princípio que conselhos mais diversos apresentam uma maior assertividade no processo de tomada de decisões, justamente porque uma determinada situação, por exemplo, é examinada por mais ângulos, pois há mais pessoas diferentes no colegiado e que, portanto, pensam diferente também.
Penso que vocês, leitores, interessados no tema diversidade e inclusão, sabem do que estou falando. Mas proponho a vocês uma reflexão em outra dimensão. Como é poder ser como se é, sem mentiras, sem informações sonegadas, sem filtro? Digo a vocês, como advogado, conselheiro e membro da comunidade LGBTQIAPN+, que é algo muito libertador, muito gratificante, saber que estou sendo escolhido por determinada companhia sabendo que, além dos assuntos que já domino, tenho a possibilidade de contribuir com mais um ângulo na análise das matérias trazidas para a discussão e posterior decisão do conselho.
Em 2023, para as AGOs vindouras, aos 57 anos de idade, é a primeira vez que inseri em meu currículo a orientação sexual. Mais do que fazer propaganda de mim mesmo – o que alguns, ou vários, talvez possam pensar – o objetivo de tal ação é muito mais abrangente do que isso. O objetivo é demonstrar àqueles que ainda não saíram do armário, ou mesmo aqueles que já saíram, mas que não acreditam ser possível alcançar um assento em um conselho de administração ou fiscal, no âmbito da alta gestão, de que, sim, é possível. Assim como mulheres e pessoas não brancas. E que, finalmente, ainda que lentamente, os membros de grupos de diversidade não só passaram a ter de ser respeitados, como passaram a ser também valorizados.
Lendo-se os parágrafos anteriores, é fácil chegar à conclusão de que ganham as pessoas, a sociedade, as empresas, os acionistas. Por que, então, há ainda uma parcela – lamentavelmente ainda relevante – da sociedade que faz questão de seguir ignorando o que as pessoas são? O fato de ignorarem não fará com que as pessoas mudem, e nem que seus filhos, por exemplo, deixarão de ser quem são. Se são LGBTQIAPN+, assim seguirão sendo. E, de novo, não é o fato de o seu filho ou filha terem amigos LGBTQIAPN+ que eles “serão influenciados” nesse sentido, alterando a sua orientação sexual, como muitos gostam ainda de toscamente pensar.
O fato é, leitores, que estou muito contente e orgulhoso de ser quem sou, como sou e que também meu perfil é apreciado empresarialmente. Aliás, em uma das posições que ocupo, na descrição do perfil, consta que faço parte da comunidade LGBTQIAPN+. Parabéns a essa e a outras empresas que vêem na inclusão um caminho para o crescimento da sociedade e dos negócios.