O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC atualizou seu Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa, lançando a 6ª edição do documento no início do mês de agosto.

A nova versão traz mudanças significativas em relação ao documento anterior (de 2015), incorporando alguns preceitos inspirados nas atuais discussões sobre ESG e sustentabilidade. Além disso, o novo código adotou uma estrutura “menos prescritiva e mais orientada a trazer princípios que sejam abrangentes para diferentes organizações, bem como situá-las em um contexto de maior relevância dos aspectos ambiental e social em seus processos decisórios” (p. 12), a fim de que possa ser utilizado não apenas por companhias abertas, mas por organizações de diversas naturezas (como empresas familiares, PMEs, startups, sociedades cooperativas ou entidades do terceiro setor).

De início, merece destaque o fato de que o próprio conceito de governança corporativa foi atualizado – com clara influência da teoria dos stakeholders, sustentabilidade e responsabilidade social corporativa. Segundo o novo código, “Governança corporativa é um sistema formado por princípios, regras, estruturas e processos pelo qual as organizações são dirigidas e monitoradas, com vistas à geração de valor sustentável para a organização, para seus sócios e para a sociedade em geral. Esse sistema baliza a atuação dos agentes de governança e demais indivíduos de uma organização na busca pelo equilíbrio entre os interesses de todas as partes, contribuindo positivamente para a sociedade e para o meio ambiente”.

Outra alteração importante foi com relação aos princípios, que aumentaram de 4 para 5: agora, o IBGC considera como princípios da governança corporativa a integridade (não previsto anteriormente, e que conversa com o pressuposto fundamental trazido no novo código que é a ética), transparência, equidade, responsabilização (accountability) e a sustentabilidade (que substituiu o anterior princípio da “responsabilidade corporativa”).

Nesse momento, vale uma nota: a modificação da expressão “accountability” para “responsabilização” é bastante salutar. Há, na literatura especializada, artigos muito interessantes que trazem a provocação sobre “quando poderemos traduzir a expressão accountability para o português”[1], dificuldade que decorre da abrangência do termo e de uma falta de cultura de responsabilização do Brasil (conforme Pinho e Sacramento). Porém, a busca por uma expressão substituta (ainda que imperfeita) é muito importante para que o princípio por trás da palavra seja de fato valorizado, e não se torne um simples jargão corporativo.

O restante do Código mantém estrutura análoga à da 5ª edição, traçando diretrizes sobre sócios (reforçando a preferência pelo princípio “uma ação, um voto” – o que obviamente não se aplica para entidades do terceiro setor), Conselho de Administração (o principal capítulo do Código, a fim de demonstrar a importância estratégica deste órgão), Diretoria, Órgãos de Fiscalização e Controle (como Conselho Fiscal e Comitê de Auditoria) e Conduta.

A mais relevante diferença, porém, é o conteúdo mais simplificado e principiológico, como mencionado, uma alteração de rumo que impõe novos desafios para o profissional de governança – ao mesmo tempo em que abre uma janela de oportunidades, tendo também o potencial de fortalecer a governança corporativa em nosso país.

Considerando que o Código evita o excesso de prescrições, a adoção de boas práticas de governança se afasta ainda mais da ideia de ser um passo a passo a ser seguido ou um checklist a ser preenchido, e passa a exigir que o profissional de governança tenha a capacidade de explicar as razões pelas quais determinada prática deve ser adotada, e que demonstre os custos e benefícios daquela escolha (e das demais alternativas). Assim, será necessário cada vez mais articular conhecimentos jurídicos, econômicos, contábeis e de gestão com os fundamentos e diretrizes do Código do IBGC, abandonando a ideia de que a governança corporativa é uma instância extra de burocracia nas organizações.

Há, inclusive, uma grande contribuição do Código ao reforçar, logo de início, a importância do “propósito” para a organização. Assim, ao falarmos de governança vale lembrar o que propõe Simon Sinek e, antes de falarmos em “o quê implementar” (Conselho, acordos de sócios, áreas de compliance…) ou em “como fazê-lo” (consultorias, assessorias, treinamentos), comecemos falando em “por que pensar em governança”.

Imagem: pixabay.com


[1] CAMPOS, Anna Maria. Accountability: quando podemos traduzi-la para o português? Revista de Administração Pública. 24(2)30-50. Fev/Abr. 1990. Rio de Janeiro; PINHO, José Antônio. SACRAMENTO, Ana Rita Silva. Accountability: já podemos traduzi-la para o português? Revista de Administração Pública. 43(6): 1346-1369. Nov/Dez. 2009. Rio de Janeiro.

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