RESUMO DA SEMANA
Mais uma semana completamente dominada pelas preocupações com a pandemia do Covid-19 se espalhando pelo mundo, com a Itália depois de erros do governo assumindo o epicentro do contágio e mortes, mas sendo ameaçada nessa posição nefasta pelos EUA. O clima também foi dominado pelas ações de governos de praticamente todos os países e novas ações de muitos bancos centrais. Aqui, como temos alertados, exceto pela atuação do ministério da Saúde se desdobrando, ainda estamos bem atrasados em relação a outros países, principalmente na tentativa de minorar os impactos do vírus sobre a economia. Além disso, existem brigas políticas para todos os lados, quando deveríamos estar todos unidos em prol do bem comum. Tudo isso só atrapalhada nas decisões que devem ser tomadas.
No cenário externo, diferentes países seguem tomando e ampliando medidas de combate aos malefícios do coronavírus, ao mesmo tempo, em que fazem o possível e o impossível para preservar o emprego e a saúde das empresas, que em última análise devem ser os responsáveis pela retomada das economias assim que a curva de contágio e morte de pessoas começarem a declinar.
Os EUA saíram na frente desde o início e seguem na dianteira de entregar soluções rápidas. Durante a semana, o Senado americano aprovou um pacote de medidas que atinge US$ 2 trilhões (deve ser aprovado sem problemas pela Câmara em 27/3, mas o secretário do Tesouro Mnuchin lembrou que se somada a atuação do FED, o pacote chega perto de US$ 6 trilhões. Ainda assim o governo e o FED seguem acenando com novas medidas de empréstimos para a próxima semana. Vão dar dinheiro de empréstimos para empresas, adiaram a cobrança de impostos, vão capitalizar empresas e setores da atividade (as aéreas estão nessa lista), vão comprar comercial papers para dar solvência de curto prazo, e os cheques para os cidadãos devem começar a ser recebidos em três semanas.
Tudo isso para evitar maior mal para uma economia que já deve estar em recessão, e onde a taxa de desemprego que estava pouca acima de 3% pode chegar em 7% ou 8%, no final do ano. Aliás, durante a semana, o presidente do FED Jerome Powell em entrevista declarou que vai apoiar o fluxo de crédito para a economia com os empréstimos que forem necessários e que não faltará munição ao FED. Estimou que a recuperação pós-pandemia também será vigorosa. Já Donald Trump começa a falar sobre aliviar o isolamento e sobre datas para isso, mesmo considerando que os EUA devem se tornar o novo epicentro do coronavírus.
Também lembramos que o grupo do G-20 (vinte mais importantes economias) também esteve reunido e se dispôs a fazer o necessário para superar essa crise na saúde e economias. Lembraram que juntos já disponibilizaram cerca de US$ 5 trilhões para isso, e que mais medidas devem ser adotadas. Já o FMI, disponibilizou US$ 1 trilhão e o Banco Mundial alguns bilhões, mas Georgieva (diretora-geral do FMI) declarou que os países emergentes vão precisar de algo como US$ 2,5 trilhões para a crise que nos últimos dias, aumentou os pedidos de crédito emergencial.
Os países desenvolvidos seguiram a mesma linha do governo americano e do FED concedendo recursos para empresas de todos os portes, abrindo linha de ajuda para a população e provendo liquidez ao sistema financeiro, seja na recompra de títulos ou em operações de swap cambial, inclusive com acordos com o próprio FED. O Brasil, por exemplo, fechou acordo com o FED de swap de até US$ 60 bilhões.
Citamos ainda a Alemanha, com um pacote de 750 bilhões de euros, o Japão com pacote de 56 trilhões de ienes (algo como 10% do PIB) e o BOE (BC inglês) mantendo juros em 10%, mas recomprando títulos no montante de 650 bilhões de libras, situação que começou a ocorrer ainda nessa semana, e provocou queda de juros do Bunds e Gilts. A União Europeia autorizou os bancos da região a serem mais flexíveis com as moratórias dos afetados que acontecerá.
Apesar de tudo, todas as projeções levam para recessões ainda piores que do que em 2009. A América Latina pode mostrar recessão de cerca de 3,8% (em 2009 a recessão foi de 2,1%) e o México deve ser muito prejudicado pelo tratamento que está dando para a crise e encolhimento do mercado americano. Enquanto isso, na visão de muitos a Turquia, a África do Sul e o Brasileiro seguem sendo os mais vulneráveis. O Brasil que interrompeu os ajustes que estava tentando emplacar na economia (tudo postergado nesse momento) e o déficit primário que deve aumentar muito.
Já para a economia global, a previsão é de contração do PIB superior a 1%, com a China perdendo 2% pelo coronavírus, mas ainda crescendo. A Índia também vai sofrer bastante e montou isolamento total por 21 dias.
O IIF (Institute of International Finance) indica que os estrangeiros já sacaram US$ 91 bilhões de países emergentes desde o início da crise, valor maior que o ingresso em todo o ano de 2019. Como se vê a situação segue piorando em todo o mundo, mesmo considerando que já se fez mais do que na crise global de 2008, com os EUA voltando a ter “cheque em branco” para minorar os efeitos na economia.
Falando de indicadores de conjuntura os divulgados durante a semana já não retratam a situação atual de desaceleração das economias do momento presente. De qualquer forma, nos EUA, tivemos o índice de atividade de Kansas caindo para -18 pontos em março (anterior em 8 pontos), outra leitura do PIB do quarto trimestre em 2,1%, a inflação pelo PCE em 1,4% e déficit da balança comercial em fevereiro caindo 9,15 para US$ 59,9 bilhões. A confiança do consumidor de Michigan também encolheu para 89,1 pontos em março, vindo de 101 pontos.
Na China, o lucro industrial caiu no primeiro bimestre de 2020, na Alemanha a confiança do consumidor de maio caiu para 27 pontos, no menor patamar desde maio de 2009 e o sentimento empresarial em queda para 86,1 pontos. As vendas no varejo de fevereiro no Reino Unido com queda de 0,3%. Lá, a inflação medida pelo CPI anualizado de fevereiro ficou em 1,7%. Destacamos ainda a queda do preço do petróleo no mercado internacional, principalmente após a AIE (agência Internacional de Energia) declarar que a demanda por óleo está em queda livre.
Em termos de Brasil, a situação fiscal não permite grandes voos, e boa parte das medidas até então anunciadas se referem a antecipação de recursos (13% salário, FGTS, etc.) ou postergação de impostos, juros e multas. Mas o presidente da Câmara declarou que o Brasil precisaria de algo como R$ 400 bilhões para enfrentar a crise. Estamos, portanto, atrasados nas medidas que custam a sair do papel, além de serem insuficientes e demorarem para serem votadas no Congresso Nacional.
Aliás, falando nisso, perdemos muito tempo ao longo da semana discutindo se seria melhor isolamento horizontal ou vertical (quando no mundo ninguém tem a resposta certa) e brigas entre o presidente e governadores sobre isso, ou pela crítica de inação do Executivo.
Todos pregam a União e esforços conjuntos, mas por trás de tudo ficam as críticas e beligerância entre governadores e o presidente. Nem mesmo o presidente e seu vice se entendem quanto ao isolamento voluntário da população, e isso só retarda decisões que são urgentes e desautoriza pessoas. Precisamos urgente de um coordenador de crise, como tivemos no processo de apagão do governo de FHC, quando tínhamos Pedro Parente dando as cartas.
Mais para o final da semana, o Banco Central e demais bancos públicos começaram a mostrar novas medidas de apoio as empresas de pequeno e médio porte tentando fornecer capital de giro e estabilidade dos empregados, com linhas diretas de crédito oferecidas com juros baixos (inclusive no cheque especial e rotativo do cartão de crédito). O Bacen também poderá adquirir crédito privado, assim como foi anunciado pelo FED. O CMN (Conselho Monetário Nacional) estendeu para cooperativas e Fintechs a repactuação de créditos. O pacote de medidas para folha de pagamentos é bom e pode abarcar 10 milhões de pessoas.
Em termos de indicadores domésticos os dados também seguem defasados da realidade. No entanto, o RTI (Relatório Trimestral de Inflação) já trouxe mudanças significativas nas previsões (para pior), com o PIB encolhendo para zero em 2020 (anterior em 2,2%), inflação na visão de mercado em 2,6% e consumo das famílias encolhendo 0,8%. Para a formação bruta de capital fixo a previsão é de queda de 1,1%, de anterior em +4,1%. O déficit em conta-corrente de 2020 (até fevereiro) acumula US$ 15,8 bilhões com investimentos diretos no país de US$ 11,1 bilhões.
Investimento em ações mostrou saída de US$ 4,4 bilhões, a maior saída desde outubro de 2008. Já as vendas no varejo de janeiro encolheram 1,0% e em 12 meses sobem 1,8%. A concessão de crédito livre caiu 4,6% em fevereiro e o crédito total está em R$ 3,5 trilhões, algo como 47,6% do PIB.
O ministro Paulo Guedes em quarentena apareceu em vídeo dizendo que a determinação é de que não faltarão recursos para defender vidas, saúde e emprego e que os recursos para reduzir o impacto do vírus já estão em R$ 700 bilhões. De qualquer forma, é preciso sair do discurso e do papel. O Senado, por exemplo, só vai votar auxílio para informais na segunda-feira. Como explicar isso se é por votação eletrônica?
A Câmara também aprovou o auxílio para trabalhadores informais no montante de R$ 600 por mês e enquanto durar a crise. Já a MP do 13º salário para o Bolsa Família caducou. No mercado acionário, na sessão de 24/3, os investidores alocaram recursos na Bovespa, mas o saldo de março está negativo em R$ 20,4 bilhões e no ano com saídas líquidas de R$ 60,5 bilhões, bem mais que os R$ 44,5 bilhões que saíram em todo ano de 2019. As empresas também estão paralisando investimentos (Petrobras é um dos exemplos), retardando a divulgação de resultados e assembleias e postergando pagamento de dividendos.
Indicadores da semana
IBOVESPA 9,5% (73.428)
DOW JONES 12,8%
NASDAQ 9%
DÓLAR R$ 5,102 (+1,5%)
Perspectivas
Continuamos na dependência do comportamento da expansão ou não do coronavírus pelo mundo, das medidas de saúde pública que estão e serão tomadas pelos governos e, principalmente das consequências em termos econômicos nos diferentes países.
Repetimos que os esforços que estão sendo feitos por governos e bancos centrais já são maiores que os da crise global de 2008, mas os mercados não estão reagindo na mesma intensidade daquela época.
As ajudas já estão saindo do “papel“ para a prática e isso pode ser positivo para os mercados. A isso podemos agregar os discursos de que se mais for preciso, será feito.
Aqui, por razões que já comentamos, estamos um pouco atrasados em relação a outros países e as disputas entre o presidente, governadores e Congresso em nada ajuda e acaba prejudicando por falta de coordenação. Durante a semana chegou-se mesmo a comentar a saída de Paulo Guedes e do ministro Mandetta; ambas danosas, notadamente na fase presente.
Do ponto de vista da análise técnica, seria bom não voltar a perder o fundo próximo de 62 mil pontos (fazer fundos menores) e ganhar maior consistência caso consiga ultrapassar a faixa de 83 mil pontos (topos maiores).
Alvaro Bandeira Sócio e economista-chefe do banco digital Modalmais Fonte: www.modalmais.com.br/blog/falando-de-mercado