A semana pode ser interpretada como de mercados buscando equilíbrio de preços nos ativos de risco, e alterações constantes de humor dos investidores em função de duas situações principais que têm alguma ligação: de um lado a impacto nas economias do planeta, detonada pela crise sanitária do Covid-19, e de outro o forte desequilíbrio de preço na commodity petróleo, mesmo depois da decisão de corte da OPEP+. Aqui, fomos afetados por tudo isso e ainda tivemos que conviver com a crise na saúde devido a saída do ministro Mandetta e disputa entre o Executivo e o Legislativo e também o vencimento de derivativos na B3, que sempre agrega volatilidade.

No cenário externo, bancos centrais e governos de todo o mundo seguiram anunciando medidas de ajustes, destinando verbas para conter a contaminação e óbitos, ajudar vulneráveis e empresas de pequeno e médio porte, mas também grandes empresas e setores como o aéreo. Bancos centrais também estiveram na linha de frente visando conter consequências sobre o setor bancário, assumindo dívidas, concedendo linhas de crédito e exigindo contrapartidas; além de retardarem ajustes no sistema financeiro.

Também foi possível notar preocupação com emissões de dívidas soberanas de diferentes países para fazer face aos gastos extraordinários com o Covid-19, mas também promovendo certo “engarrafamento” de emissões, com consequências sobre os níveis de juros praticados. Citamos ainda a preocupação de organismos multilaterais, como FMI, Banco Mundial e do grupo do G-7 (sete maiores economias), com a dívida de países pobres, com sugestão de adiarem pagamentos, e concessão de novos créditos. Até no Brasil chegamos a ter esse tipo de alerta de que a emissão de títulos não é ilimitada. Também tivemos os líderes do G-7 criticando a OMS-Organização Mundial da Saúde pela ineficiência, e o governo americano cancelando doações para o organismo.

Ainda sobre isso, vários países já começam a preparar a abertura progressiva de suas economias e afrouxando regras de isolamento social. Na semana, Trump anunciou a flexibilização de restrições em três etapas a serem administradas pelos Estados, mas tendo como salvaguarda a queda durante 14 dias seguidos da contaminação, apesar de Trump anunciar o achatamento da curva de contágio no país. Isso veio se contrapor a postura do Japão decretando emergência nacional, apesar de tudo até aqui feito e gasto, a Suécia estendendo restrições e a Índia mantendo o isolamento até meados de maio.

Muito embora governos tentem acelerar a volta de certa normalidade o mais rápido possível e os mercados reajam positivamente a isso (alguns índices já superam patamar de um ano), formadores de opinião importantes, como presidentes regionais de FED de ST Louis (Bullard) e NY (Williams), não compartilham da mesma opinião. Bullard disse que o segundo trimestre será tão ruim que é melhor ignorá-lo. Já Williams não está otimista com a possibilidade de recuperação em “V” (rápida) ainda em 2020. Eles vão na mesma direção de outros tantos como FMI, Banco Mundial, OMC, OPEP, BIS, etc.

Portanto, é fato que as projeções de contração do PIB global já giram ao redor de -4%, com países emergentes ainda piores. Mas todos indicam que pode começar a ser detectadas melhores já a partir de meados do terceiro trimestre, com ênfase mais para o último trimestre de 2020. A China que está conseguindo sair da pandemia na frente de todos os países (lembrando que foi lá que tudo começou) mostrou essa semana, dados de conjuntura do primeiro trimestre de 2020 ruins, mas melhores do que o previsto. O PIB do primeiro trimestre encolheu anualizado 6,8%, quando a projeção era de -8,3% (contra igual período de 2019 -9,8%).

A produção industrial de março encolheu 1,1%, quando o previsto era -7,5% e as vendas no varejo caíram 15,8% anualizadas para março. Os investimentos em ativos fixos urbanos observou contração de 16,1% e as vendas de imóveis com queda no primeiro trimestre de 22,8%. A contração do PIB não ocorria desde o ano de 1992.

Nos EUA, a situação não difere em nada. Todos os indicadores mais atuais divulgados mostram sensíveis reduções. Os preços dos importados encolheu 2,3% em março, as vendas no varejo com queda de 8,7% (previsto era -8,0%), a produção industrial em queda de 5,4% e os estoques nas empresas em fevereiro com -0,4%. O importante índice de atividade industrial de NY de abril despencou para -78,2 pontos, quando a previsão era que ficasse em -30 pontos. A confiança dos construtores também cedeu em abril para 30 pontos, de projetado em 55 pontos.

Os dados do Livro Bege, uma síntese da situação da economia, também vieram horrorosos. Queda abrupta da atividade em todas as regiões, emprego em queda em todos os distritos, com lazer e varejo os mais afetados pelo isolamento, perspectiva de cortes de mais empregos, inflação desacelerando mais, alta demanda por empréstimos, famílias refinanciando hipotecas e perspectivas incertas quanto ao futuro.

Esse quadro ruim nas duas principais economias do planeta pode ser replicado sem erro para a maioria dos países, notadamente os emergentes que são exportadores de commodities e não possuem folga fiscal para fazerem extensos programas de ajuda. Daí o esforço de organismos como FMI e Banco Mundial em tentar ajudar os emergentes com um alinha de crédito que supera mais de US$ 1 trilhão. Cálculos realizados por organismos internacionais indicam que o esforço somado dos países já supera US$ 8 trilhões, e ainda assim a crise deflagrada pelo Covid-19 será mais profunda que a Grande Depressão de 1929.

Sobre o petróleo a situação também pode ser rotulada como terrível. A AIE-Agência Internacional de Energia e a OPEP traçaram projeções sobre oferta e demanda de óleo com reduções drásticas da demanda, com a OPEP divulgando contração de 6,8 milhões de barris de petróleo por dia (BPD), de projeção anterior de +6,9 milhões BPD. Isso mesmo após o corte acertado na OPEP+ de cerca de 10 milhões BPD na oferta e de a Aramco (gigante saudita de petróleo) ter anunciado que a partir de maio ofertaria somente 8,5 milhões BPD. Citamos a direção da Petrobras dizendo que nem a Arábia Saudita cumpre os acordos. Resultado disso, o preço do barril WTI negociado em NY chegou a ser cotado na casa de US$ 18, forçando declarações de dirigentes do FED que algumas petroleiras poderiam quebrar.

Podemos extrapolar essa situação planetária para o Brasil, onde as projeções do PIB de 2020 só fazem piorar. Até membros do governo já aceitam a tese de contração no ano da ordem de 5%, quando o próprio FMI (sempre conservador e atrasado em suas projeções) indica contração de 5,3%.

Projeções também de que o déficit primário pode passar de R$ 500 bilhões e a relação dívida/PIB pode se aproximar de 100%. Mansueto de Almeida estima entre 85% e 90%. Durante a semana, o governo e a área econômica seguiram anunciando medidas para mitigar a situação de vulneráveis e empresas de menor porte, mas continuam os problemas de demora em chegar em quem precisa.

Do lado político, a Câmara e Senado aprovaram o texto-base de socorro emergencial aos Estados, fizeram restrições à atuação do Bacen na aquisição de títulos e o governo anunciou a “obra de ficção” do PLDO com o orçamento de 2021. O Senado também aprovou em segundo turno o orçamento de guerra com modificações e agora volta para avaliação da Câmara. Mas o que mais dominou o noticiário foram as posturas do presidente Bolsonaro e de seu ministro da Saúde em franco desacordo sobre o isolamento social, culminando com a demissão de Mandetta e convite aceito por Nelson Teich. A partir daí nova batalha do presidente contra Rodrigo Maia, Doria e Witzel tomou o noticiário, com severas críticas, o que de nada adianta.

Na economia, o índice IBC-Br de fevereiro mostrou alta de 0,35%, acumulando no ano, expansão de 0,33%, indicando que mesmo antes do Covid-19 a economia já vinha perdendo tração. O saldo da balança comercial até a segunda semana de abril mostrava superávit acumulado em 2020 de US$ 8,07 bilhões. O fluxo cambial acumulado do ano até 9/4 estava negativo em US$ 13,3 bilhões e os dados da nova pesquisa Focus vieram também negativos.

Durante a semana, o Bacen fez intervenções pontuais no câmbio ofertando operações novas de swap cambial e rolagens de posições antigas, mas ainda assim o dólar se manteve pressionado em quase todas as sessões, voltando par o patamar ao redor de R$ 5,27. Na Bovespa, o período embutiu o vencimento de derivativos de índice que sempre agrega volatilidade após preços das ações líderes, principalmente Petrobras por conta do petróleo. Os investidores estrangeiros é que fizeram alguns aportes de recursos durante o período, mas ainda assim, o saldo de abril (até 15/4) estava negativo em R$ 6,4 milhões (quase zerado), e no ano muito negativo em R$ 65,5 bilhões.

Indicadores da semana  

BOVESPA +1,68% (78.990)

DOW JONES +2,2%

NASDAQ +6,8%

DÓLAR +2,8% (R$ 5,237)

Perspectivas     

Seguimos com a percepção que os mercados de risco ainda vão trabalhar com grande volatilidade nos próximos períodos, notadamente Bolsas e câmbio, por conta do Covid-19, oscilações em commodities (especialmente o petróleo), mas ainda com viés um pouco mais positivo. Que em períodos precedentes.

Agora, a preocupação com contaminação e óbitos tende a declinar pelo achatamento da curva em países, mas surge outra preocupação de como será a flexibilização do isolamento, se isso vai ensejar nova onda de contágio e como será a reabertura das economias, diante de empresas comprometidas e forte desemprego. Isso vale ainda mais para país emergentes que vão precisar de muito maior ajuda e de refinanciamento de dívidas e novas contratações de empréstimos e ajudas de organismos multilaterais.

É nesse ambiente ainda complexo que o Brasil e nossos mercados se inserem, tendo ainda que conviver com disputas políticas e “agressões”, que só tornam o ambiente mais instável e sujeito a riscos. Temos que seguir pregão a união e esforço conjunto das diferentes áreas de governo e também dos três poderes.

Neste momento, precisamos acelerar ajudas e fazer chegar os recursos para quem efetivamente precisa e com rapidez para não destruir o que já tínhamos.

No mercado, seria bom não perdermos mais a faixa pouco acima de 68 mil pontos e seria oportuno ganharmos patamar acima de 83 mil pontos do Ibovespa. Porém, na nossa avaliação não deveremos ter mais fortes oscilações negativas e/ou incidência de Circuit Breaker.

Alvaro Bandeira
Sócio e economista-chefe do banco digital Modalmais
Fonte: www.modalmais.com.br/blog/falando-de-mercado


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