Mulher negra, da pele preta, carioca, suldestina – do sudeste do Brasil, que tem um olhar absolutamente curioso sobre tudo, sempre querendo muito do diálogo, e partindo do ponto de que nada é óbvio…é assim que Luana Génot se autodeclara.

É com sua entrevista que nos despedimos de nosso primeiro ano de Mulheres em Ação e damos boas-vindas à nossa segunda primavera. Este foi cheio de histórias únicas, como a de Luana. Vidas, entregas e conquistas tão diversas, como as dela. Todas com algo em comum: a união e o exemplo de outras tantas mulheres: muitas delas que, como Luana e como as nossas tantas articulistas, fizeram a nossa caminhada existir. Obrigada à Luana por dividir conosco a sua, e a todas as “nossas” mulheres.

Aproveitem esta história e inspirem-se!

Publicitária, com especialização em raça, etnia e mídia pela Universidade de Wisconsin-Madison, é ativista, escritora e apresentadora do canal GNT com o Sexta Black, que está na segunda temporada. Luana Génot é uma das fundadoras do ID_BR – Instituto Identidades do Brasil, autora de “Sim à igualdade racial: raça e mercado de trabalho”, pela Editora Pallas, e está prestes a lançar o segundo livro, pela Companhia das Letras, e começou a escrever um livro infantil. Ela também assina uma coluna em O Globo.

Luana tem 31 anos, é carioca, mãe de Alice, de 3 anos, casada. Neste período pandêmico, tem vivido a intensidade de equiparar à maternagem suas múltiplas atuações profissionais. É workaholic assumida, mas tem tentado fazer alguns períodos “compulsórios” e mais frequentes de férias, além de apelar para o exercício físico, através da corrida e da natação. “Quero, cada vez mais, calibrar meu tempo neste sentido”. É filha da Ana e do Luiz, neta da Dona Ana. “Fui criada por duas mulheres, que são os meus pilares, que me ensinaram a nunca baixar a cabeça e sempre persistir e resistir”.

Nesta conversa, conhecemos mais sobre a Luana e os melhores caminhos que ela está ajudando a construir para a sociedade através de seus formas de ativismo.

Como você resume sua trajetória até aqui?

Com uma palavra: propósito. Foi uma virada de chave para mim quando percebi que o propósito que me movia e me motivava beneficiaria o coletivo. Na minha adolescência era um problema ser mulher negra, mas percebi que eu era uma mola propulsora para mudar isso, dentro do que eu pudesse fazer. Neste sentido se encaixam a fundação do ID_BR, o programa no GNT, as colunas. Eu escrevo para tentar propor caminhos e soluções e ter corresponsabilidade com os problemas e estruturas, como o racismo e o machismo.

Como você vê o caminho que tomaram esses assuntos desde que começou?

A pauta antirracista, com uma direção mais específica, já conquistou algum espaço. É algo de que já estamos falando, sem tanto tabu, de que precisamos nos engajar com a luta antirracista e as pessoas não vão olhar torno. Vejo que ainda falta é de fato sair de uma teoria e virar uma prática, sobretudo no ambiente corporativo. Virar de fato ações com metas, prazos. Sair do orgânico e ir para algo estruturado, com investimentos, orçamentos direcionado para ações saírem do papel.

Qual é o papel das empresas neste processo?

As organizações têm um papel fundamental que é fazer ações importantes para mudar estruturas e investir tal qual eles investiram em questões como, por exemplo, o e-commerce nos últimos 5, 10 anos. As empresas fazem um investimento considerável e são os principais atores nas pautas que elas acreditam.

Como acontece a virada de chave na sua visão?

Ainda estamos em um nível orgânico. Por mais que exista uma mudança acontecendo – como tentativas de fazer um programa direcionado de recrutamento – ainda não estamos olhando para a retenção destas pessoas ou do ponto de vista da comunicação e do marketing. Não temos o acesso aos números das empresas neste sentido: qual é o seu investimento na pauta? Quantas pessoas indígenas ou negras existem nos quadros de liderança?

E qual é o papel da sociedade. O que lhe falta no engajamento deste processo?

O consumidor já está com uma postura mais ativa, mas a gente pode ser mais permanentemente ativos, não só diante de um episódio midiático, como os recentes casos do João Alberto (morto por seguranças em um supermercado em Porto Alegre/RS) ou o Jorge Floyde (nos Estados Unidos) para cobrar das marcas uma postura antirracista. Não precisamos ver ou saber de mais uma mulher violentada para produzir ações e campanhas educativas quanto ao feminicídio. Temos que conduzir a pauta para ir além de novembro (Consciência Negra) e março (Dia Internacional da Mulher), para que nossos consumidores sejam mais ativos. Quase como botar na sua agenda que você vai mandar um e-mail ou uma mensagem direta em uma rede social perguntando para uma empresa o que ela está fazendo sobre isso.

Neste sentido, como é a atuação do Instituto Identidade do Brasil, o ID_BR?

O ID_BR foi (@id_br) fundado em 2016 com lema “não ao racismo, mas sim à igualdade racial”, propositivo à promoção de ações afirmativas de direcionamento da população negra e indígena ao mercado de trabalho. Diante da filosofia e mentalidade, tem estado ao lado das empresas em programas de trainees e Conselhos, no sentido de construir e treinar, para que as organizações possam atrair, reter e consigam mudar as caras das suas lideranças, para colaborar com uma mudança de cultura corporativa.

É um trabalho realizado a partir de três pilares – ecossistemas de ativação de empregabilidade, educação e engajamento.

Temos o selo Sim à Igualdade Racial, que incentiva que as empresas tenham sua própria jornada na mudança de cultura a partir de um diagnostico. Hoje 40 empresas de diversas portes detêm o selo. No setor varejista, temos 33% dos clientes. Também atuamos com empresas de TI. Além disso, temos uma parceria com o grupo Mover – Movimento pela Equidade Racial, que reúne 40 empresas do varejo que se auto-organizam para fazer ações relativas à pauta antirracista e de treinamento.

No pilar da educação, atuamos através de bolsa de estudos – temos 200 bolsista – de inglês, programas de desenvolvimento de liderança e MBAs. E, no de engajamento, por meio de eventos e campanhas. Realizamos o prêmio Sim à Igualdade Racial, que temos parceria com o canal Multishow, e o Fórum Sim à Igualdade Racial, que realizamos mais uma edição no dia 23 de outubro.

E qual é a história do Sexta Back?

O programa partiu de uma concepção minha com os diretores. A ideia parte do princípio de que não queremos apenas falar da pauta antirracista, mas colocar atrás e nas frentes das câmeras pessoas negras: como a apresentadora e os convidados. Ou seja, ter representatividade 360. Partindo disso e da ideia de autodeclaração, questão que trabalho no meu primeiro livro. Temos muitas dificuldades, como sociedade, em se autodeclarar. Se dizer uma pessoa preta era negativo aos olhos da sociedade. E o programa abre um diálogo sobre isso dentro das cinco autodeclarações – amarelo, branco, indígena, negro e pardo. A questão perpassa de maneiras diferentes cada uma destas cores e raças. As pessoas brancas, por exemplo, têm pouco contato com a temática. As questões mais graves relacionados a elas levam às pessoas à morte, independente da classe social. Dialogar sobre isso provoca uma conexão entre todas elas e abrem espaço para novas formas de abordar o tema, chegando a diferentes grupos sociais.

Este episódio da segunda temporada do Sexta Back é um exemplo do que falou Luana. O tema é Whitewhashing e o convidado é Mauro de Sousa, filho do cartunista Maurício de Sousa. Eles falam sobre estereótipos relacionados aos homens japoneses, homofobia e conta mais sobre o personagem Nimbus, da “Turma da Mônica”, inspirado nele.

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