Que histórias nos contam os números? Foi com esta pergunta que Eva Rosa Santos, uma das principais lideranças femininas de Angola iniciou sua palestra na tarde da última sexta-feira, 17 de setembro, em um congresso referência na área de Gestão de Pessoas. O CONGRAGRH é organizado pela Associação Brasileira de Recursos Humanos do Rio Grande do Sul (ABRH-RS) há 13 anos. Convidada a falar sobre o papel da mulher na vida executiva, concentrou sua fala na importância da jornada de cada um neste processo, mas apontou posturas organizacionais que podem fazer a diferença.

Eva Rosa Santos é diretora de pessoas e cultura do Standard Bank Angola. Através de sua atuação como empreendedora social, que passa pela fundação da Liderança Feminina em Angola, projeto criado em 2019, pretende trazer um novo olhar sobre a valorização da mulher e seu papel de liderança. Eva é especialista com formações internacionais, licenciada em psicologia social e das organizações pelo Instituto Universitário de Lisboa, tem especialização em gestão de empresas pela Universidade Politécnica de Madrid e especialização em Recursos Humanos pela Universidade Católica de Lisboa.

“Gosto sempre de olhar para os números, eles contam histórias. Ele nos permitem compreender onde nós, mulheres, estamos, e qual é a dimensão de falar do papel da mulher nas organizações e de falar em liderança inclusiva”.

Os números ao que ela se refere nos mostram o quanto esse caminho ainda é longo. São marcos históricos da luta feminista, como o ano de 1955, quando o Dia Internacional da Mulher foi datado, em oito de março. Ou em 1976, no Dia Internacional da Igualdade Feminina, em 26 de agosto. E em 2015, um desafio nos foi lançado enquanto sociedade mundial: atingir a Equidade de Gênero até 2030 virou um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Mas neste ano, em 2021, a ONU Mulher constatou que a igualdade de gênero nas mais altas posições de poder não será alcançada antes de 130 anos.

Contextualizando globalmente a situação hoje, 8,8% das mulheres são chefes de Estado (nove) ou de governo (13) e em 119 nações nunca ocuparam esses cargos. Para nos aproximarmos da realidade, entre a Comunidade de Países de Língua Portuguesa, da qual participam Angola e Brasil, de nove Estados-membros, apenas em Moçambique e Portugal mais de 40% dos parlamentares são mulheres. No Brasil o percentual é de 15%. E por aqui a disparidade salarial também assusta: 79,5% é a diferença salarial entre homens e mulheres ocupando o mesmo cargo.

É um fato que nós, mulheres, temos uma longa caminhada até nos aproximarmos nos homens. Mas, então, o que devemos fazer para dar o próximo passo e mudar isso? Para Eva, a educação é o primeiro passo para conquistarmos a equidade de gênero, e esse processo começa em casa, na educação dos filhos. E o atual cenário vem sustentado pela cultura e pela descriminação, pela falta de crença de que as mulheres têm nelas e pelos estereótipos que nos dominam.

Mãe de um menino e uma menina, ela observa que historicamente punimos as mulheres não dando as mesmas oportunidades a elas, seja por meio do acesso propriamente dito a cursos superiores ou selecionando os espaços profissionais a serem ocupados. Isso fica evidente na falta de mulheres em profissionais relacionadas a tecnologias e engenharias, por exemplo.

“Desde bebês, reforçamos essas raízes nos nossos filhos. Por que as meninas precisam usar rosa e os meninos, azul? Por que nossa filha não pode ser a próxima presidente do país ou da empresa? A nós, pais, basta estarmos presentes para apoiá-la. E isso vai fazer diferença na sustentação da crença de nossas competências para chegar onde quisermos”.

Focado no papel que a crença pode fazer nesta trajetória de mudanças social e cultural, nasceu o projeto Liderança Feminina de Angola. Ele é estruturado em ações que promovam o compartilhamento de conhecimentos e boas práticas. Isso acontece através de diferentes formas, entre elas a publicação de artigos em veículos de comunicação e por meio de programas gratuitos de mentoria e capacitação buscando o desenvolvimento de mulheres nas áreas de ciências e tecnologia.

Eva acredita que esse esforço colabora com a elevação da confiança da mulher e seu empoderamento. Que isso gera relações de confiança social. E que é a partir da capacidade de nos apoiamos uns aos outros que podemos fazer a diferença.

O caminho nas organizações

“Como diretoria de pessoas de um banco, dou oportunidade para interagir com esta diversidade de culturas com outras mulheres, o que também é uma prioridade para nossa organização. Temos 50% de mulheres e homens nos nossos conselhos, lugar de representação da nossa organização. É claro que, dentro destes princípios, há um longo caminho para percorrer em outras áreas das empresas.”

Ela acredita que, a partir do momento em que as organizações de fato colocaram a equidade de gênero nas suas agendas, vai fazer toda a diferença. Porque colocar na agenda significa ter uma visão estratégia para o tema e uma defesa a partir de posições de liderança. A partir do foco na questão da inclusão, o caminho passa pela criação de quotas com transparência, por investimentos em capacitação, pela promoção de lideranças femininas e pela existência e identificação de pessoas que de fato queriam se “sentar à mesa”, como referente Eva, querem falar e fazer mais em relação a isso. O que não tem relação somente com mulheres, mas em trazer os homens para a conversa.

“Eu costumo dizer que liderança não tem gênero”.

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