(*)Tatiana Cymbalista

A partir de 2024, companhias abertas, fundos de investimento e companhias
securitizadoras reguladas pela CVM podem, em caráter voluntário, elaborar e
divulgar relatório de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade,
com base no padrão internacional recentemente emitido pelo ISSB (International
Sustainability Standards Board). Ainda segundo a CVM, a partir de 2027
(exercício social de 2026) a elaboração e divulgação dessas informações passará
a ser obrigatória, sempre pelo mesmo padrão ISSB. É o que prevê a Resolução CVM
n. 193, de 20/10/2023, que estabeleceu as novas regras sobre a elaboração e
divulgação do relatório de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade
para as entidades sujeitas à sua regulação.

O Brasil foi o primeiro país do mundo a entronizar a obrigação de obedecer a esse
recém-criado padrão. O próprio ISSB é bastante recente: foi criado na COP 26,
de Glasgow (2021), para estabelecer um padrão global para mensuração e
informação de ações sustentáveis, notadamente com relação ao carbono, e assim
facilitar a acessibilidade e interoperabilidade dessas informações.

Em junho, o ISSB emitiu as suas primeiras normas de reporte financeiro (S1 e S2):
a primeira diz respeito a informações de sustentabilidade em geral, a segunda
exclusivamente à mudança climática. As normas são largamente inspiradas nas
recomendações da força tarefa da FSB norte-americana para Divulgações
Financeiras Relacionadas ao Clima (TCFD).

Esse “transplante” das regras do TCFD tem sido alvo de críticas, exatamente porque outros temas de sustentabilidade, como os temas sociais e de governança, nem sempre seguem a mesma lógica da métrica de informação do carbono.

Uma outra crítica direciona-se à adoção da chamada “materialidade financeira” em detrimento da dupla materialidade. A opção do ISSB (e do TCFD) é direcionada ao mercado de capitais, ou seja, não é toda informação que deve constar nos documentos, mas somente aquelas que têm impacto financeiro. A dupla materialidade, adotada por outros padrões de sustentabilidade como o GRI,
corresponderia a descrever não apenas como o ESG impacta financeiramente o negócio, mas também como o negócio impacta pessoas e o meio ambiente.

Há grandes desafios na aplicação das novas regras. Em breve, a apresentação do S1 e S2 por pequenas e médias empresas (PME) também pode se tornar uma realidade. Mesmo agora, aquelas empresas que fazem parte da cadeia de valor das companhias abertas ou de multinacionais já submetidas ao S1 e S2 precisarão produzir suas informações para continuar contratando. As PME terão dificuldades para reunir conhecimentos e custos necessários para a elaboração desses relatórios. É necessário pensar em alternativas simples, mas que possibilitem o engajamento das PME nesse esforço de sustentabilidade.

De qualquer forma, o desenvolvimento de “uma linguagem comum” quanto aos riscos e oportunidades relacionados à sustentabilidade e a adoção desse padrão internacional deve ser comemorado. A própria resolução da CVM menciona a recomendação da Organização Internacional das Comissões de Valores Mobiliários – IOSCO, para que adotem o padrão ISSB. E aponta o óbvio: a conveniência de que as práticas brasileiras estejam harmonizadas com as práticas internacionais, para “possibilitar o acesso das empresas nacionais às fontes de financiamento internacionais e a construção de um ambiente internacional de interoperabilidade”.

(*)Tatiana Cymbalista é advogada, sócia do Manesco Advogados

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