Cada vez mais, temos visto estudos e debates sobre os três temas (cultura, estratégia e governança), como eles se relacionam entre si e como um olhar abrangente sobre tal relação pode trazer benefícios e sustentabilidade para as organizações. Mas antes de mergulharmos nessa análise, vale revermos alguns conceitos e entendimentos.

Afinal, o que pode ser entendido como cultura?  

Pesquisando várias definições, podemos encontrar que cultura é a forma automática ou invisível que direciona nossa forma de agir e pensar. Ou ainda, corresponde ao jeito como as pessoas se comportam e fazem as coisas acontecerem.

Em uma empresa inclui também a estrutura física (por exemplo, espaços abertos ou salas fechadas), código de vestimenta, formato de reuniões, além do perfil do time, da maneira como as pessoas se relacionam, como lidam com as conquistas e fracassos, dentre outros. Enfim, cultura é o que as pessoas fazem quando a liderança não está na sala, pois representa o comportamento que está enraizado na organização.

Todos já ouvimos a célebre frase atribuída à Peter Drucker de que “a cultura come a estratégia no café da manhã”. E o que isso quer dizer?

Quer dizer que a essência da empresa prevalece sobre qualquer tipo de planejamento ou tática. Por mais brilhante que seja uma estratégia no papel, se não for suportada pela cultura, ela pode se tornar apenas uma teoria, comprometendo o futuro da organização.

E qual é o papel da liderança em relação à cultura e estratégia?

A liderança tem um papel fundamental na construção e disseminação da cultura, pois uma empresa será o reflexo do nível de consciência dos seus líderes. A liderança também é responsável pela elaboração da estratégia para o negócio. Nesse sentido, os exemplos praticados pela liderança ganham uma enorme relevância, pois é através deles que os líderes demonstram a prática da cultura no dia a dia. Somente assim, conseguem de fato influenciar e engajar as pessoas, garantindo que cultura e estratégia estejam em sintonia.

E como a liderança deve atuar para promover o engajamento do time?

Falando no time, é interessante comentar a teoria criada por Richard Barrett sobre a entropia cultural e seu impacto no engajamento das pessoas. Barrett utiliza o termo “entropia” para descrever a tendência natural das organizações de se tornarem desordenadas, ineficientes e, eventualmente, ineficazes com o passar do tempo. Tal cenário é resultado de um descompasso entre liderança e time e quanto maior a entropia, menor o engajamento das pessoas. A liderança deve estar atenta para evitar os comportamentos abaixo, principais fatores de geração de entropia:

  • Desalinhamento de Valores: Quando os valores e crenças dos membros da organização não estão alinhados com os valores e a visão da empresa, isso pode levar a conflitos, desmotivação e falta de engajamento.
  • Falta de Comunicação Efetiva: A comunicação ineficiente ou a ausência de um canal de comunicação claro pode levar a mal-entendidos, falta de clareza nas expectativas e diminuição da coesão cultural.
  • Desconexão entre Liderança e Equipe: Quando a liderança não está alinhada com a cultura desejada ou não pratica os valores que promove, isso pode minar a coesão cultural.
  • Falta de Foco na Sustentabilidade Cultural: Ignorar a importância de manter e fortalecer a cultura ao longo do tempo pode levar a uma gradual perda de coesão e identidade cultural.
  • Foco excessivo no curto prazo: Excesso de demandas urgentes, cortes de custos mirando apenas o horizonte de curto prazo podem gerar estresse e comprometer a qualidade dos serviços.
  • Falta de autonomia para o time: estruturas organizacionais com hierarquias rígidas e micro-gerenciamento limitam ou eliminam a autonomia do time, gerando perda no engajamento

O engajamento dos colaboradores é uma medida do compromisso intelectual e emocional que eles têm com a organização. Isso está diretamente ligado a fatores como autonomia e propósito, conexão com o que se acredita, bem como senso de pertencimento e um ambiente em que se possa expressar opiniões com segurança (desde que, naturalmente, as recompensas materiais sejam suficientes para atender as necessidades básicas).

A liderança tem um papel crucial na gestão da cultura, intervindo de maneira pró-ativa para mitigar a entropia cultural, promover o engajamento das pessoas, suportar a estratégia e impulsionar os negócios.

E onde entra a governança nesse cenário?

De uma maneira bastante simplificada, a governança fornece a estrutura para a tomada de decisões dentro da organização, envolvendo a definição de papéis e responsabilidades dos principais agentes da organização. Ela é um reflexo da cultura e estabelece as bases para a execução da estratégia e sustentabilidade do negócio.

Recentemente foi lançada a 6ª Edição do Código de Melhores Práticas do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), que trouxe uma visão mais contemporânea e reforçou que as organizações devem contribuir para a sociedade com um todo e não apenas proporcionar retorno para os seus acionistas. Isso fica explícito na nova definição de governança corporativa:

“A governança corporativa é um sistema formado por princípios, regras, estruturas e processos pelos quais uma organização é dirigida e monitorada, com vistas à geração de valor sustentável para a organização, para seus sócios e para a sociedade em geral.  Esse sistema baliza a atuação dos agentes de governança e demais indivíduos de uma organização na busca pelo equilíbrio entre os interesses de todas as partes, contribuindo positivamente para a sociedade e para o meio ambiente.”

A jornada de uma organização deve começar com a definição de seu propósito, ou seja, de sua razão de existir.  O propósito é o principal farol, que direciona a estratégia e fundamenta a cultura da organização. Uma cultura forte, com a liderança e time alinhados, promove o engajamento, gera uma governança robusta, que potencializa a estratégia e a construção de riqueza para a organização, para seus sócios e para a sociedade em geral.

Por Christiane Bechara, executiva com mais de 25 anos de experiência em finanças e governança corporativa, sócia da KPTL Investimentos, uma gestora de Venture Capital que investe em startups de base tecnológica, promovendo o empreendedorismo e a inovação. Atua também como conselheira de administração e em conselho consultivo, apoiando companhias na revisão de sua estratégia de negócios, melhoria de desempenho operacional e financeiro, bem como do fortalecimento da governança interna. Mentora de jovens executivas em desenvolvimento de carreira.

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