A epidemia do Corona Vírus vem trazendo muitos desconfortos e preocupações para todos em função da falta de clareza do que virá pela frente.
Mas para sabermos qual o melhor caminho a seguir, primeiro temos que entender o que está acontecendo e mais importante, porque está afetando diretamente o seu bolso.
O mercado financeiro não é regulado diretamente pelo governo, que define as politicas públicas e busca melhorar a economia do país, mas apenas intervém em alguns pontos de forma a buscar garantir um maior equilíbrio. A variação da taxa de cambio do dólar é um exemplo, onde o governo intervém injetando ou tirando a moeda do mercado quando entende que o valor da mesma está em patamares que podem impactar negativamente nas exportações ou importações.
A determinação da meta para a taxa de juros básica do mercado, a conhecida Taxa SELIC é definida pelo Comitê de Politica Monetária (COPOM) em uma reunião que ocorre a cada 45 dias. Em função da taxa definida o mercado se ajusta, na busca de obter os maiores ganhos possíveis, através de estratégias que consideram o histórico das taxas, o comportamento futuro de ativos, os fundamentos das empresas, a expectativa das taxas futuras entre outras variáveis.
Mas quem é o mercado? O mercado são todos os investidores, sejam eles grandes ou pequenos, empresas ou pessoas físicas, estrangeiros ou brasileiros, além de toda a estrutura de empresas e profissionais responsáveis pela definição de regras, fiscalização e operação das atividades. O conjunto de todos estes “players” é o que define o mercado.
A questão é que em um mundo atual onde a tecnologia e o mundo digital são cada vez mais presentes, a verdade é que as decisões que movimentam esse mercado são baseadas nos comportamentos de pessoas, seres humanos. Mesmo com a existência atualmente de robôs de investimento, são as pessoas que programam e muitas vezes não seguem a programação realizada dos robôs devido a vieses comportamentais.
Precisamos entender de forma bem básica, então, como nós, seres humanos, funcionamos para então avançarmos no assunto.
Diversos trabalhos científicos já demonstraram um efeito bastante comum nas pessoas chamado de “Efeito Manada”. Para você entender melhor isso, se eu te desse a opção de entrar em dois restaurantes vizinhos, que você ainda não conhece, e um deles está cheio e outro vazio. Em qual você entraria?
Se você não respondeu no que está cheio você é uma rara exceção. Está aí o Efeito Manada. Costumamos adotar a opção que a maioria adota, para nos sentirmos pertencentes a comunidade, não gostamos de nos sentirmos excluídos, e isso faz parte do nosso DNA.
Basicamente isso significa que uma pessoa, normalmente, não costuma tomar suas decisões baseada em questões racionais e dados concretos, mas sim apoiada em questões que seu cérebro inconsciente determina, que neste caso, é seguir a maioria, mesmo que esta maioria esteja fazendo isso sem o menor embasamento racional.
Se alguém grita “Fogo” dentro de um local fechado todas as pessoas tendem a correr para o mesmo local, mas por vezes, devido a um erro dos primeiros que correram, essa pode não ser a direção correta da saída, causando resultados desastrosos.
Tudo isso para dizer que o mercado é um exemplo claro e típico do Efeito Manada e em épocas de crise como a atual esse efeito é ainda mais claro. Quando o caos se instala no mercado, é como se alguém tivesse gritado “Fogo” e todo mundo tende a correr para o mesmo lado, e repito, nem sempre esse é o melhor caminho, mas é assim que funciona.
A bolsa de valores cai ou sobe muito dentro de um único dia, fazendo com que algumas vezes os pregoes sejam suspensos com os “Circuit Breakers”. Tudo isso devido a onda de movimentos coletivos para um lado ou para o outro.
Falando mais especificamente sobre como o Corona vírus tem haver com tudo isso, as informações que saem a todo momento nas redes sociais e na mídia, trazem insegurança e muitas vezes pânico fazendo com que as decisões irracionais estejam ainda mais presentes.
Com isso o mercado fica muito “volátil” com uma variação enorme em relação a valores médios de compra e venda de ativos fazendo com que toda esta preocupação e desconforto mencionados fiquem presentes até que as águas turbulentas passem.
É importante entenderemos esta dinâmica do mercado para que possamos entender que são os comportamentos das pessoas que levam aos fatos por si só.
Mas então, como proceder quando enfrentamos crises e problemas onde o emocional de toda uma comunidade, país ou até mesmo global, como é o caso atual da pandemia, fica abalado, em pânico, ou reagindo automaticamente à avalanche de noticias que todo dia aparecem nos diversos canais?
Aí vem a necessidade das métricas, dos números, das estatísticas e das análises históricas. Qualquer profissional que trabalha diretamente com tomadas de decisão sabe que quanto mais informações de qualidade e confiáveis existir, mais fácil será essa tomada de decisão.
E aí percebemos o primeiro grande aprendizado desta crise. Nós medimos pouco!
Como disse W. Edwards Deming e posteriormente eternizou Peter Drucker ambos renomados gurus da administração, “O que não se mede, não se gerencia”. Uma frase simples que sintetiza o conceito principal da tomada de decisão racional.
Claro que você deve estar pensando: “Mas ninguém tinha histórico ou dados sobre este Corona vírus!” e a resposta é “Sim. Isso é verdade”. Mas o que essa pandemia trouxe de lição é que em tempos de crise o que mais se buscam são dados confiáveis, mas eles são difíceis de se obter em prazos escassos e com poucos recursos disponíveis.
Mas em contra partida temos diversos outros dados similares ou equivalentes que poderiam ou deveriam ser utilizados mas que muitas vezes também não estão disponíveis ou não existem de fato, por que ainda achamos que coletar dados é trabalhoso, chato ou até mesmo, muito caro.
E isto é apenas um alerta. Não estou fazendo uma crítica ao fato de não termos os dados em si, mas um apelo para que entendamos que possuir históricos de dados ajudam e muito em situações difíceis onde se faz necessário escolher caminhos, muitas vezes pouco conhecidos.
Vamos colocar isso dentro do dia a dia da nossa vida financeira, onde podemos obter dados por nossa própria vontade, mas que poucas pessoas o fazem.
Você sabe exatamente quais foram seus gastos nos últimos 6 meses? E a sua renda nestes meses? Quais são as suas 3 despesas, que em caso de necessidade você pode reduzir ou cortar? Qual foi a diferença de valores nas suas despesas anuais comparando 2018 e 2019? Estes valores aumentaram ou diminuíram de um ano para outro? Se você tem dinheiro investido, qual está sendo a sua rentabilidade e o seu crescimento patrimonial? Qual a parcela do seu orçamento, em valores, é dedicada a saúde ou a alimentação?
Se você foi capaz de responder a todas estas perguntas, é muito provável que você esteja tendo muito menos dificuldades de encarar esta crise do que a maioria. E por um motivo bem simples: Você tem condições de tomar melhores decisões sobre, onde e como gastar.
No caso do COVID-19, imagino que enfrentaremos 3 fases distintas:
A primeira delas é a fase atual de isolamento, para ajudar a reduzir a velocidade de infecção e consequentemente evitar ou minimizar a possibilidade do colapso do sistema de saúde.
A segunda serão os problemas resultantes do impacto econômico da pandemia, que serão tão maiores quanto mais tempo durar o isolamento. Isso é um fato, independente do isolamento ser necessário para a questão de saúde.
A terceira será a adaptação a nova realidade desta mudança na economia. E isso, neste momento, é um total ponto de interrogação.
Mas, do ponto de vista financeiro, o que nós podemos fazer em relação a essa nova realidade? O que mudou?
O que mudou é a clareza que existe agora, para todos, da necessidade de termos formas de prevenção de imprevistos. Até hoje eu e muitos outros educadores e planejadores financeiros falávamos constantemente da necessidade de se ter uma Reserva Estratégica, ou como alguns chamam de Reserva de Emergência ou Reserva Financeira.
Foi necessário sentir na pele o impacto de não ter renda, ou ter ela diminuída, de forma forçada para perceber que o discurso do “Eu não preciso guardar dinheiro porque não sei se eu vou morrer amanhã” não funciona.
Por isso, a partir de agora, creio que muita gente vai se conscientizar e começar a construir sua reserva para momentos inesperados. Sejam eles bons ou ruins. Afinal momentos bons também aparecem de forma inesperada e é importante temos recursos guardados que podem nos ajudar a aproveitá-los.
O momento ajudou também a percebermos a necessidade de termos clareza sobre nossas despesas e de possuirmos dados (histórico) que nos permitam flexibilizar as contas quando necessário.
Também mudou a forma de encararmos os parcelamentos e compras em milhares de vezes, a perder de vista, pois indiretamente permitiu que ao não gastarmos, o alivio que haverá dentro de alguns meses por não termos novas parcelas a pagar será obvio.
Olhando agora do ponto de vista de soluções para o momento, o que pode ser feito para minimizar estes impactos de não se ter renda ou tê-la de forma reduzida?
A partir de agora o controle dos recursos passa a ter uma “Tática de guerra” onde a escassez será o ponto determinante.
Seguem então os pontos que acredito contribuir para um melhor ajuste financeiro neste momento:
- Acompanhar TODAS as despesas com frequência (a cada 2 ou 3 dias), atentando para qualquer desvio que ocorra e ajustando o máximo quanto possível.
- Questionar antes de qualquer despesa: Qual é o objetivo deste gasto?e Realmente ela precisa ser feita neste momento?
- Entender qual será o dinheiro que você terá disponível (Renda) nos próximos 3 meses para poder tomar as decisões do que fazer (formas de procurar aumentar estes recursos ou contenções, em caso de não ser possível o aumento)
- Com a clareza do que você vai ter e do que você está gastando, realizar um orçamento realista do que pode continuar e do que deve ser ajustado ou cortado. Avaliar as prioridades da família, mas tomar cuidado para não cortar aquilo que traz mais valor e bem-estar neste momento.
- Buscar soluções para o controle de despesas atuais, tais quais:
- Cancelamento de contratos que não irá utilizar e que tenham mensalidades atreladas (ex. academia, serviços de estética e outros). Avaliar posteriormente o retorno a estes quando a situação se normalizar
- Corte de desperdícios. (Ex. evitar deixar luzes acesas, torneiras abertas, banhos demorados, jogar comida fora, entre outros)
- Enxugar tudo que for supérfluo (Ex. bolachas e guloseimas no supermercado, manter 2 ou mais planos de celulares se não for estritamente necessário, serviços de aplicativos de internet não essenciais, como jogos online ou de receitas, entre outros)
- Negociar contas a pagar. Entrar em contato com operadoras, bancos e prestadores de serviço para avaliar se existe a possibilidade de prorrogação de prazos de pagamentos de contas.
- Venda de produtos ou equipamentos parados em casa. Aproveite para se desapegar de tranqueiras que estejam sem uso ou roupas, calçados em excesso que podem gerar um dinheiro extra para você. Lembrando que a entrega deverá ser feita por correio/serviço de courier devido a necessidade de não haver contato físico)
- Se você tinha uma rotina de poupar dinheiro para objetivos ou sonhos, direcionar, neste momento, todo excedente que você receber para a construção ou reforço da sua Reserva Estratégica. Pare temporariamente os aportes para os objetivos até a situação voltar ao normal.
- Para quem tiver dívidas já negociadas, procure entrar em contato com o credor e renegociar os pagamentos. Se não tiver sucesso na negociação, pare de pagar e priorize suas contas básicas como alimentação, água e energia elétrica, caso a dívida não tenha bens em garantia que possam ser tomados. É aconselhável antes de adotar essa postura, consultar um advogado ou um serviço como o PROCON ou o SERASA para confirmar se deve ou não fazê-lo.
- 8. Os investidores ou pessoas que estão preocupados com seus investimentos, devem manter a cautela e não tomar decisões precipitadas. Ninguém se sente bem vendo seu dinheiro diminuir constantemente, mas se você escolheu fundos ou ativos confiáveis, eles devem voltar a render a médio e longo prazo.
- Se seus investimentos são em renda fixa atrelados ao CDI mantenha como está, principalmente porque eles devem ter boa liquidez e baixa volatilidade
- Para os demais produtos de renda fixa, é provável que eles estejam oscilando mais. Neste caso se você não precisa do dinheiro de forma urgente, também deixe onde está. Somente se você realmente precisar do recurso, saque.
- Para quem tem investimentos em renda variável o momento é de não mexer, somente se for caso de real necessidade ou urgência, porque caso contrário você terá que amargar um prejuízo que pode ser grande.
- Pare de olhar seu saldo diariamente ou até mesmo semanalmente. Isso só vai te trazer ansiedade e angustia neste período. Espere a tempestade passar.
Essas recomendações são genéricas, pois não é possível saber a condição de cada pessoa exclusivamente, e por isso procure utilizar aquilo que faz sentido para você e descarte o que não faz.
Lembre-se que é sempre você o responsável por suas atitudes e o objetivo deste artigo é ajuda-lo através de orientações e não tomar as decisões por você.
Em breve, tudo começará a voltar a normalidade e ficarão somente os aprendizados e as histórias a contar.
Mas não se esqueça de medir. Quanto mais dados você tiver, mais fácil será sua gestão financeira.
Sucesso!!!!
Luis Eduardo Botelho
Com mais de 13 anos dedicados a programas de educação e palestras, formado em Engenharia Civil e Mestrado em Engenharia Hidráulica e Sanitária é um apaixonado por relacionamentos interpessoais. Foi Gerente de Treinamento Técnico Comgás por 3 anos e também possui formação em Personal & Professional Coaching pela SBC (Sociedade Brasileira de Coaching), formação como Educador Financeiro pela DSOP Educação Financeira, Curso de Inteligência Financeira de Gustavo Cerbasi, Certificação CPA-20 e é membro da ABEFIN (Associação Brasileira de Educadores Financeiros).
É proprietário da Inspiratori Educação Financeira e atualmente atua como Planejador Financeiro Pessoal, Educador Financeiro e Palestrante, onde ministrou palestras em empresas como SBT, Honda, FMU, Instituto do Legislativo Paulista, Cervejaria Petrópolis, Comgás, Lello Condomínios e eventos como a Expo Itaquá 2018.