A chegada de celebridades aos conselhos de administração no Brasil não é recente, não se trata de algo inusitado no mundo empresarial, conforme observa Pedro Melo, diretor geral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), no artigo O conselho é pop – reflexões sobre a composição dos boards, publicado pela Revista RI – Relações com Investidores. Conforme o executivo observa, em 1968 o ator Gary Grant se tornou conselheiro da Fabergé e este é um entre vários outros casos internacionais similares.

No Brasil, o assunto se tornou frisson após a Nubank anunciar que a cantora Anitta integraria o seu conselho de administração. O anúncio foi feito após o aporte de R$ 3,7 bilhões em investimentos da Berkshire Hathaway e outros investidores. Segundo David Vélez, CEO e criador da empresa, Anitta tem conhecimento profundo do comportamento dos consumidores e ampla experiência em estratégias de marketing vencedoras, o que a qualificaria para o conselho. Reforçando o dito, a cofundadora da Fintech Cristina Junqueira afirmou que Anitta tem elevado o funk nacional a outro patamar, criando uma grande marca global.

Ao lado do caso da participação de Anitta no conselho da Nubank, podem ser citados, em nosso País, outros casos midiáticos, como as participações de Luciano Huck no conselho do Banco Pan e de Marina Ruy Barbosa na diretoria de moda de um dos negócios do grupo Arezzo. Nem sempre as celebridades são integradas ao conselho de administração ou à diretoria executiva, mas elas podem ocupar posições de destaque nas organizações contratantes, sob o entendimento de que contribuem para estratégias empresariais. Estes são os casos das embaixadoras Taís Araújo, atuando com produtos e serviços no Banco BV, e da Monja Cohen, como embaixadora da moderação na Ambev.

Retornando aos conselhos de administração propriamente ditos, o diretor geral do IBGC, no mesmo artigo acima citado, lembra que a qualificação de conselheiros administrativos é muito importante, sendo preconizada no Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa do Instituto. Ao mesmo tempo, qualificação não basta, segundo o executivo, pois o desempenho do conselho depende dos conselheiros e de suas interações. Melo observa que a diversidade de perfis é vantagem competitiva, ensejando visões plurais e contraditórias e tornando o processo decisório mais robusto.

Contratar celebridades pode ser bom para os conselhos de administração?  Neste breve artigo, procuramos entender a importância da qualificação e da diversidade nos conselhos administrativos, colhendo da ciência econômica três visões relevantes sobre o que seja uma firma, palavra frequentemente usada por economistas para se referir ao empreendimento produtivo privado.

Conforme observam Mônica Mansur Brandão e Patrícia Bernardes, no artigo Governança corporativa: algumas reflexões teóricas sob a perspectiva da economia (Anpad), três são as principais teorias que explicam as firmas: teoria administrativa, teoria dos recursos e do conhecimento e teoria dos custos de transação. Elas devem ser entendidas conjuntamente, pois firmas são conceitos que, para serem bem compreendidos, requerem várias visões, de modo que se veja o todo, não apenas, uma parte.

Na teoria administrativa, que se confunde com a ciência administrativa, a firma é uma coletividade organizada que requer coordenação (governança e gestão), a fim de entregar bens e serviços à sociedade, auferindo retornos econômicos pela venda bem-sucedida de suas entregas. Tal visão decorre do pensamento de Frederick W. Taylor, Henri Fayol, Max Weber, Herbert Simon, Chester Barnard e muitos outros autores, que têm contribuído para fortalecer a seara da administração organizacional.

Na teoria dos recursos e do conhecimento, a firma é uma coleção de recursos tangíveis e intangíveis, que podem ser mobilizados em benefício de seu desenvolvimento. Tais recursos, resumidos na palavra conhecimento, serão fundamentais para a construção do futuro, especialmente por meio da estratégia, construída de dentro para fora, observando as potencialidades internas e o ambiente externo. A teoria dos recursos e do conhecimento existe em função de autores talentosos como Frederich von Hayek, Joseph A. Schumpeter, Edith Penrose, R. R. Nelson e S. G. Winter, aqui destacados entre outros.

Já na teoria dos custos de transação, a firma existe para reduzir custos contratuais, ou seja, de transação, tornando-se um centro de contratos de prazo indefinido, firmados especialmente com empregados, de modo a evitar contratações e descontratações em quantidades absurdamente elevadas, o que seria insuportavelmente oneroso. Adicionalmente, as firmas (centros de contratos) coexistem com outras estruturas do sistema econômico e sob regras formais e informais, às quais elas reagem e, quando possível, também influenciam. A teoria dos custos de transação se baseia no pensamento de Ronalde Coase, Oliver E. Williamson, Douglass North, J. Rogers Hollingsworth e Robert Boyer, aqui destacados.

Após estas breves considerações, cumpre relacionar as três teorias da firma descritas com a qualificação e a diversidade dos conselhos de administração. Na teoria administrativa, esses atributos favorecem os debates realizados e as decisões tomadas, conforme reconhece Pedro Melo. Naturalmente, isso ocorrerá se os conselheiros de administração forem bem qualificados e contribuírem de forma assertiva para o sucesso dos negócios, o que vale tanto para as celebridades quanto para pessoas midiaticamente desconhecidas. Desde que todos possam contribuir para o desempenho organizacional, suas participações serão preciosas.

No que tange à teoria dos recursos e do conhecimento, a correlação com a qualificação e a diversidade do conselho de administração também parece forte. Afinal, faz sentido pensar que uma estratégia construída pela diretoria executiva e discutida a fundo por um conselho de administração bem qualificado e com variadas formas de entender a realidade será melhor do que uma estratégia baseada em reduzido nível de qualificação e na uniformidade de pensamento. Uma estratégia mais embasada tende a ser melhor.

Por fim, no que respeita à teoria dos custos de transação, qualificação e diversidade também são relevantes. Serão muito importantes tanto na coordenação das múltiplas relações contratuais da firma (e abrangendo não apenas os contratos com os empregados, mas com clientes, fornecedores, financiadores e outros públicos stakeholders), quanto na discussão e deliberação sobre boas respostas ao ambiente institucional, cada vez mais complexo e mutante.   

Em suma, a nosso ver, sob o prisma das três teorias da firma brevemente apresentadas neste artigo, qualificação e diversidade nos conselhos de administração são quesitos muito relevantes e devem ser objeto de grande atenção na construção dessas – e por que não? – de outras instâncias corporativas. Ao mesmo tempo, esses quesitos devem se aplicar indistintamente às celebridades e às não-celebridades: todas estas pessoas podem ser bem qualificadas e contribuir em grande medida para boas decisões.

Por fim, respondendo à pergunta celebridades no conselho das empresas ajudam a criar bom desempenho? acreditamos que sim, que isto pode ocorrer, dependendo da qualificação da pessoa e do seu nível de engajamento nas discussões do conselho. Não ignoramos que o anúncio da participação de uma celebridade no conselho de administração cria maior visibilidade para as organizações que assim o fazem, mas para o conselho, importam qualificação e engajamento, que podem ser sintetizados em capacidade de agregar valor aos negócios. Pessoas com tal capacidade devem ser sempre muito benvindas à cúpula das empresas, aos conselhos administrativos e à sua operacionalização. Celebridades ou não.

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