A procura por carros elétricos e híbridos vem crescendo no Brasil há tempos. Isso é perceptível ao observar os dados de emplacamentos das locadoras, em 2022 esse número chegou a 3,3 mil veículos, segundo a Associação Brasileira das Locadoras de Automóveis (Abla). Para termos de comparação, em 2018 foram apenas 43 em todo o país, de acordo com o Anuário Brasileiro do Setor de Locação de Veículos. Mas esse crescimento é desigual, acontecendo principalmente na região sudeste, a mais rica do país.

Além disso, apesar da aparência “verde”, simplesmente substituir a frota atual por uma versão que sem um cano de descarga emitindo CO2 não necessariamente é uma opção sustentável. Há alguns entraves quando o assunto entra na seara ESG.

Essa tendência de aumento da frota elétrica é global. Uma mostra disso é que, de acordo com levantamento da Brand Finance, a empresa do setor automobilístico com maior valor de mercado em 2023 é a Tesla, montadora que produz apenas carros elétricos.

No entanto, a empresa de Elon Musk tem concorrência forte na China, segundo o Estadão, veículos híbridos (utilizam gasolina e eletricidade) ou totalmente movidos a bateria, chegaram a 6,9 milhões de vendas somente no país asiático. Essa quantidade representa metade do total mundial.

Tal ascensão não é por acaso, o governo chinês impulsionou o setor com subsídios de bilhões de dólares. A intenção é tornar o país um criador de energias limpas, afirma reportagem do Estadão. Spiros Fotinos, o CEO da Zeekr, uma das automotivas chinesas, afirma que “a meta é nos tornarmos atores-chave da mobilidade eletrificada na Europa ainda nesta década”.

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O processo já está ocorrendo, a BYD Auto, empresa chinesa de automóveis híbridos e elétricos, que já opera no Brasil, superou a Tesla nas vendas totais de 2022. De acordo com David Leah, analista da empresa de dados GlobalData, as montadoras chinesas representam “concorrência séria” por conta da tecnologia que proporciona baterias com maior economia de escala.

Vantagens para os índices de ESG das empresas

O abandono de veículos que utilizam combustíveis fósseis pelos elétricos deve parte do seu impulso ao ESG. Na procura por atingir as metas positivas de governança, meio ambiente e sociais, muitas empresas adotam os carros elétricos como forma de diminuir a emissão de CO2, por sua vez seu impacto ambiental.

Além de terem custos mais baixos, por causa da ausência de fumaça, os veículos a bateria retiram a poluição direta do ar da responsabilidade das empresas que os utilizam. Isso não significa, porém, que não existam impactos ambientais. A maior demanda pelo armazenamento de energia elétrica aumenta a necessidade por metais condutores, como o cobre.

Os custos do cobre

A maior demanda por carros elétricos, a movimentação da China e a busca por melhores índices em ESG, acontecem como parte do processo de mudança da matriz energética dos países. O objetivo é abandonar os combustíveis fósseis e adotar formas menos poluentes de energia. Chamada de transição energética, a reorganização dos setores produtivos afeta toda a economia mundial.

Mas surge um problema, a divisão mundial do trabalho não opera de forma igualitária. Países desenvolvidos e fortemente industrializados produzem tecnologia de ponta e bens com valor agregado, enquanto aqueles na periferia extraem recursos naturais e commodities.

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Logo, a transição energética como é feita hoje, não resolve essa divisão, então, para que alguns países, ou algumas pessoas e empresas, possam ter carros elétricos, regiões inteiras do mundo continuam submetidas à exploração de seus recursos, e os danos dela. Na América Latina, um dos efeitos gerados é o aumento na demanda para a mineração de cobre.

Segundo a Bloomberg Línea, o metal está sendo procurado por ser um bom condutor elétrico, gerando uma demanda muito maior que a existente até então. A expectativa é que entre 2023 e 2029 os investimentos cheguem a US$ 95,4 bilhões na região. Dos países mais afetados, os principais são Chile, Peru e Argentina, o Brasil está mais atrás, junto com México e Equador. Entre as empresas que têm projetos de exploração do minério estão a Vale (VALE3), a britânica Anglo American, a australiana BHP, a pública chilena Codelco, entre outras.

A mineração por sua vez sempre oferece riscos ao meio ambiente

De acordo com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) a extração de cobre além de despejar CO2 na atmosfera, contamina o solo e lençóis freáticos por conta dos rejeitos provenientes da atividade. No caso brasileiro a exploração de metais gerou desastres como de Brumadinho e de Mariana, sem contar o horror do garimpo ilegal em terras Yanomamis, no Pará.

Esses efeitos podem ser entraves para a exploração de minérios, em janeiro deste ano o governo de Gabriel Boric no Chile rejeitou o projeto de exploração de uma jazida de ferro e cobre por conta dos impactos e riscos ambientais. A ministra do Meio Ambiente, Maisa Rojas, afirmou: “temos certeza de que aqui foi tomada uma definição robusta, rastreável, baseada em evidências técnicas”.

A transição energética está longe de ser um processo simples e sem contradições. Se em uma ponta temos carros modernos e aparentemente não poluentes nas regiões ricas (como o Sudeste) e nos países desenvolvidos. Na outra ponta, o sul global e as periferias, os efeitos são mais desmatamento, destruição do meio ambiente e risco para a vida das pessoas que vivem e trabalham ao redor das minas.