(*) Rafael Tello

Todo início de ano fico ansioso por um evento que marca o segmento de sustentabilidade corporativa, pelo menos desde 2018: aguardar e estudar a carta anual de Larry Fink para seus CEOs.

Quem atua com sustentabilidade/ESG e ainda não adotou esse hábito, recomendo que o faça. Por quê? Porque nela estão alguns dos principais elementos que serão trabalhados pelas principais empresas do mercado ao longo do ano.

Isso devido ao fato que a carta do sr. Fink é designada aos CEOs das empresas destinatárias dos dez trilhões de dólares, que sua empresa, a BlackRock, investe em nome de seus clientes. No Brasil, constam na carteira da gestora as principais empresas do país. E os CEOs dessas organizações levam em consideração o conteúdo da carta anual, o que faz dela um farol, guiando como as empresas devem navegar no mercado ESG, ainda há ser desbravado.

A novidade esse ano da Carta de Larry Fink foi a menção à emergência do Capitalismo de Stakeholders. Esse tema já vem sendo fortemente abordado pelo Fórum Econômico Mundial, sendo foco dos últimos encontros de Davos e, continuamente, disseminado por seu fundador Klaus Schwab.

Nessa nova visão do capitalismo, as empresas devem expandir seu objetivo de geração de valor para os acionistas – base do Capitalismo de Stockholders – para todos as suas partes interessadas, inclusive, colaboradores, comunidades locais, fornecedores, entre outras. Uma vez que vemos empresários e gestores de fundos defendendo a tese, podemos inferir que existe uma copreeensão de que essa mudança é relevante para promover a perenidade das empresas no mercado e de sua capacidade de geração de valor.

O objetivo de expandir o compromisso de geração de valor das empresas é louvável e faz sentido em um mundo com crescentes desigualdades e desgaste ambiental. Todavia, isso aumenta a complexidade da gestão dos negócios, inclui em seu bojo a necessidade de ponderar demandas diferentes e, muitas vezes, conflitantes. Assim, a integração das empresas ao Capitalismo de Stakeholders cria desafios, que envolvem a transformação da gestão das empresas. Mas, como dizemos em Minas, o carro veio antes dos bois e ainda não criamos os instrumentos para apoiar essa transformação.

Para apoiar nossos clientes nessa transição, temos utilizado duas referências que há anos nos dão pistas de como envolver os stakeholders nos processos empresariais. O primeiro é o Modelo de Excelência em Gestão (MEG), da Fundação Nacional da Qualidade (FNQ). O MEG tem como suas bases a Sustentabilidade e os Compromissos com as Partes Interessadas. É recomendado pelo Modelo que as empresas escutem seus stakeholders e incluam suas necessidades e expectativas em seus processos, produtos e serviços. Assim, constatamos que a excelência em gestão é fruto de um relacionamento contínuo e profundo das empresas com suas partes interessadas. Porém, ainda é preciso incluir esses insumos na estratégia empresarial.

É aí que surge nossa segunda referência: a Global Reporting Initiative (GRI), onde  difunde o conceito da Materialidade entre as empresas que elaboram relatórios de sustentabilidade. Segundo a GRI, as prioridades empresariais e as estratégias para alcançá-las devem ser definidas por suas lideranças, porém, com a inclusão das principais expectativas e necessidades de seus stakeholders. Assim, como análises de mercado e de perspectivas econômicas são instrumentos para a construção de estratégias corporativas, também o devem ser os resultados das escutas feitas com stakeholders.

Os especialistas que apresentei aqui defendem que as empresas de destaque no século XXI serão aquelas que mais rapidamente se integrarem ao Capitalismo de Stakeholders, isso é: que tenham propósitos relevantes e inspiradores e consigam persegui-los com suporte da inteligência, experiência e visão de suas partes interessadas. Essa visão é reforçada fora do movimento da sustentabilidade. E quem nos mostra isso com mais clareza são os fundadores da Singularity University, que destacam esses pontos como centrais das empresas exponenciais e crescem 10X mais que suas concorrentes. Espero que essa seja motivação suficiente para quem ainda não se engajou nesse processo.

(*) Rafael Tello é diretor de Sustentabilidade da Ambipar.

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