Antes de mais nada, vamos definir o que é um Bear Trap. Depois que o mercado rompe certos suportes num movimento de baixa, o sinal enviado pelos preços atrai certos investidores a abrirem posições vendidas em níveis mais baixos apenas para verem um movimento de alta logo depois no curto prazo. Isso, muitas vezes, causa chamadas de margem fortes e até podendo liquidar a posição. E para salientar, isso é um movimento essencialmente técnico e de curta duração, que não necessariamente vai em linha com o movimento de mais longo prazo e a direção dos fundamentos.

No entanto, acredito que esse tipo de lógica serve para explicar porque os resultados mais fracos ou com guidances piores de algumas empresas (no caso, podemos usar as gigantes Microsoft e Google) têm causado altas nos preços ao invés de quedas. Acho que podemos atribuir isso, principalmente, a 3 fatores que ajudaram a criar essa “armadilha de urso”.

O primeiro é que as temporadas de resultados passadas tiveram grandes efeitos nos preços das ações. Acho que todos lembram, apenas como exemplo, do que ocorreu com Netflix e Facebook, que tiveram quase metade de seu valor de mercado destruído depois de seus balanços em trimestres anteriores. Isso fez com que o evento da divulgação de resultado se tornasse quase que um ponto de descontinuidade na trajetória de preços dos ativos, o que se traduz diretamente numa alta forte da volatilidade implícita para o evento.

De repente, comprar uma put um dia antes de uma divulgação, 30% abaixo do preço de mercado, poderia se transformar num verdadeiro bilhete da loteria caso a ação despencasse. A procura por esse tipo de operação tem o efeito altista na volatilidade, levando à queda do valor papel, dado que quanto maior a volatilidade, maior é o risco percebido do ativo. Logo, se o resultado apenas vier em linha só pelo fato de que todo esse prêmio de risco pode ter virado pó e, consequentemente, por uma queda grande da volatilidade no dia seguinte da divulgação, o papel deveria subir pelo fato de que seu risco percebido de uma hora para outra passou a ser bem menor.

Em segundo lugar, existe uma espécie de consenso de que a bolsa americana só cai mesmo quando os números das empresas vêm piores que o esperado e que estávamos numa época especialmente propícia para vermos isso: não só o bear market está consolidado, bem como vimos indicadores antecedentes tendo quedas recordes e até evidências anedóticas vindas das próprias empresas com relação às contratações que davam a entender que talvez esse seria o trimestre que essas surpresas apareceriam.

No entanto, não foi o que ocorreu, os resultados tendo vindo em linha: alguns melhores na margem, outros um pouco piores, mas nada de um movimento coletivo e macroeconômico de erro nas expectativas de lucros. Logo, tem gente que vendeu para algo que não aconteceu.

E por último, algo mais subjetivo, mas que sempre faz parte do racional das pessoas quando um movimento parece ficar claro: a sensação de segurança falsa que temos quando algo vira consenso. Um ano atrás, era quase um sacrilégio abrir uma posição vendida em S&P 500. Hoje, dá a impressão que ter esse tipo de posição é seguro e tranquilo quando, na verdade, não é.

Não estou dizendo que o S&P já fez low, nem que não pode cair amanhã, mas simplesmente, que o sentimento de segurança vem dos consensos e esses só aparecem nos extremos de otimismo ou pessimismo. Por mais que essas sensações não mudem os destinos dos mercados no longo prazo, elas têm sim o potencial de causarem reversões brutais de curtíssimo prazo e que podem ser mais do que suficientes para danificar de forma relevante um portfólio que busca horizontes maiores.

Se pudesse resumir tudo com uma dica: toda vez que sentir que todos concordam com algo, reduza taticamente suas posições. Na maioria das vezes, funciona.

Rodrigo Natali, estrategista-chefe na Inv Publicações.

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