No mês de agosto, a balança comercial atingiu um novo valor recorde na sua série histórica (US$ 7,6 bilhões) desde 1997, o que levou a um saldo acumulado dos oito primeiros meses do ano de US$ 52,1 bilhões — um aumento de US$ 16,4 bilhões em relação ao saldo no mesmo período, em 2020, segundo dados da Fundação Getulio Vargas (FGV). O saldo com a China no valor de US$ 35 bilhões explicou cerca de 67% do superávit global da balança comercial. Sem a China, o superávit global seria de US$ 17,1 bilhões. Em adição, com o segundo maior parceiro comercial do Brasil, os Estados Unidos, o país é deficitário.
Três produtos — soja, minério de ferro e petróleo — explicaram 45% das exportações brasileiras no acumulado do ano até agosto. Nesse mesmo período, a China comprou 63% das vendas externas brasileiras de minério de ferro, 69% da soja em grão e 49% do petróleo. O país também registrou elevada participação nas compras de carne bovina (57%) e celulose (42%), colocados em quinto e nono lugar na lista dos principais produtos exportados pelo Brasil.
Os ventos favoráveis da balança comercial estão estritamente associados ao desempenho no mercado chinês. Supondo que este continue favorável, os possíveis riscos seriam: aumento das importações com a retomada de um crescimento sustentado do país, num ambiente de valorização cambial, e/ou uma queda acentuada nos preços das commodities. Para 2022, o aumento das importações com crescimento sustentado é um cenário distante, logo a questão se resume, em grande medida, ao desempenho da China para assegurar o crescimento das exportações do país. Com o fim dos estímulos associados às políticas para enfrentar os efeitos recessivos do COVID, é esperada uma menor demanda para minério de ferro. Questões climáticas podem continuar afetando o preço dos grãos e, ao mesmo tempo, a reorganização da criação de suínos na China pode diminuir a demanda por ração animal (soja). A demanda chinesa poderá se traduzir em taxas menores de crescimento, mas não esperamos um recuo na suas importações.
O superávit comercial para 2022 está assegurado, o que é um fator importante, num momento em que há incertezas quanto à entrada de capital via investimentos diretos ou em portfólio no país. Como o país é historicamente deficitário em serviços e rendas, um menor déficit em transações correntes fica dependente da balança comercial.
Em uma perspectiva de médio/longo prazo, porém, permanece a questão. A China explicou 34% das exportações brasileiras no acumulado do ano até agosto de 2021. Num exercício no marco temporal proposto, o país deveria estar procurando garantias, via acordos com a China, das suas vendas de commodities e, ao mesmo tempo, procurando diversificar sua pauta exportadora em termos de produtos e países.
O ICOMEX é um boletim de conjuntura do comércio exterior, mas a crescente concentração da pauta exportadora em termos de produtos e de país é um questão presente de forma persistente na conjuntura que o transforma em estrutural. Não é aconselhável depender das compras de commodities da China para assegurar o dinamismo das exportações brasileiras numa perspectiva de longo prazo.
Os índices de comércio exterior
Na comparação interanual do mês de agosto, as exportações aumentaram, em valor, 56,2% e as importações, 68,7%. O aumento dos preços em 44,3% lidera o crescimento do valor exportado, pois o volume aumentou 8,6%. Nas importações, preços e volume cresceram, mas a variação no volume importado em 39% superou a dos preços, 21,4%. Na comparação do acumulado do ano até agosto, a variação dos preços supera em mais de 20% a do volume, enquanto nas importações, ocorre o inverso.
Aumento de preços é o principal fator para explicar o crescimento, em valor, das exportações e aumento de volume é o principal fator para explicar o aumento das importações.
O aumento nos preços de exportações em relação ao das importações se traduz na melhora dos termos de troca. Na série da média móvel trimestral é observada um pequeno recuo em relação ao último dado disponível, o que reflete uma desaceleração no ritmo de crescimento dos termos de troca, desde junho de 2021. No entanto, nas comparações interanuais entre 2020 e 2021, seja em termos mensais ou na do acumulado do ano até agosto, os termos de troca cresceram 19% e 21%, respectivamente. Os preços das commodities deverão permancer altos até meados de 2022, mas não é esperado um novo choque positivo de preços.
As exportações de commodities representaram 70% das exportações brasileiras no ano de 2021 até agosto. Nesse mesmo período, em 2020, o percentual era de 68%. Logo, apenas se acentuou a concentração das exportações no grupo das commodities. No total das exportações desse grupo, 37% eram produtos da indústria de transformação em 2020 e, em 2021 caiu para 32%. Aumentou, portanto, o grau de primarização das commodities exportadas. Enquanto os preços cresceram 40,9%, o volume exportado recuou 0,3% entre o acumulado do ano até agosto de 2020/2021. No caso das não commodities, o desempenho do volume superou o dos preços.
O desempenho das exportações por tipo de indústria, em termos de valor, na comparação do acumulado do ano até agosto; registrou uma variação de 22% na agropecuária, 82% na extrativa e 26% na indústria de transformação. O crescimento elevado na indústria extrativa foi liderado pela variação de 74,2% nos preços. Em termos de volume, a indústria de transformação liderou a variação (8,8%), seguida da extrativa (3,1%) e a agropecuária registrou queda.
Nas importações, as variações nos volumes superaram as das exportações para todas as indústrias. Observa-se que cerca de 90% das importações brasileiras são de produtos da indústria de transformação e, logo, é esse setor que determina o aumento do volume importado na economia.
Em agosto, a indústria de transformação elevou suas compras de bens intermediários e máquinas. Chama a atenção, porém, a variação de 91,5% das compras de máquinas para o setor agropecuário, o que sinaliza expectativas favoráveis para o setor no próximo ano. Observa-se que a variação nas compras de bens intermediários na indústria supera a da agropecuária. Esse resultado, porém, pode estar refletindo retomada das compras após interrupções nas cadeias logísticas e não, necessariamente, expectativas de demandas crescentes para o setor.
O aumento no volume exportado pela indústria de transformação no ano foi liderado pelas vendas de bens duráveis de consumo associado ao setor automotivo, na comparação do acumulado do ano até agosto. Em agosto de 2021, porém, a variação nas vendas de bens de capital superou a de bens duráveis, o que pode estar associado a venda de aviões e máquinas. É, no entanto, uma ocorrência pontual, pois, no ano, são as vendas de bens duráveis que lideram as exportações da indústria de transformação.
Os bens de consumo duráveis e não duráveis registram as maiores variações, seguido pelos bens intermediários. Logo, mesmo com o câmbio desvalorizado, as compras externas recaem, principalmente, sobre bens de consumo. A variação nos bens de capital, como sinalizador da taxa de investimento na economia, é inferior a dos bens de consumo.
O volume exportado por mercado de destino aumentou para todos os principais parceiros, exceto a China. No entanto, o aumento de preços das exportações destinadas a esse mercado elevou a participação desse país de 32% para 34% entre janeiro-agosto de 2020 e janeiro-agosto de 2021. A participação do país supera a da União Europeia, que foi de 13% em jan-agosto de 2021. Chama a atenção o percentual da União Europeia que se aproxima do valor registrado para a América do Sul, de 11%. Observa-se que no acumulado do ano e na comparação mensal, o maior volume exportado foi para a América do Sul. As exportações do setor de veículos, inclusive peças, responderam por cerca de 25% das vendas para esse mercado. Destacam-se também as vendas de petróleo. Com participação de 7,2% e variação de 256% na comparação entre os acumulados do ano até agosto de 2020 e 2021.
No caso das importações, variações positivas foram registradas em todos os mercados, exceto na comparação do acumulado do ano para os Estados Unidos. Os maiores incrementos se concentram nos países asiáticos, onde as importações englobam produtos com elevado grau de diversificação da indústria de transformação. Na Argentina, as compras de trigo explicaram 14% das compras brasileiras e as de energia elétrica, 6,8%; mas o principal grupo de importações está no setor de veículos e componentes, que explica por volta de 40% do total importado. Em termos de valor, as vendas argentinas de automóveis para passageiros aumentaram 118%, na comparação do acumulado do ano até agosto. Os gargalos na oferta de automóveis no mercado doméstico brasileiro devem ter incrementado as suas compras, mesmo com um câmbio desvalorizado.
Todos os setores CNAE registraram aumento no volume importado na comparação mensal (Tabela 1, ver Anexo). Destaca-se a fabricação de coque e derivados de petróleo com aumento de 142%, seguida da fabricação de veículos automotores (79,4%) e produtos farmacêuticos (70,2%). Na mesma base de comparação, produtos de fumo, têxteis e fabricação de coque recuam o volume exportado com percentuais acima de 45%, enquanto crescem as exportações de produtos de metal e fabricação de veículos com percentuais acima de 60%. No total de 23 setores, 10 registraram queda nas exportações.
Na comparação do acumulado do ano até agosto (Tabela 2, ver Anexo), caem as exportações de 9 setores. Destacam-se o de metalurgia, com queda de 13,5% e participação na indústria de transformação de 16,6%, e o de alimentos, com recuo de 0,5% e participação de 30,3%. Lembramos, porém, que esses são setores onde a queda no volume foi compensada com aumento de preços. O setor de impressão e reprodução de gravações tem uma participação de 0,03% nas exportações e, logo; a contribuição do aumento de 430% no volume exportado é quase nula para o aumento no volume exportado.
Nas importações, apenas dois setores, fabricação de outros equipamentos e preparação de couros, registraram queda no volume. Os setores com maior participação nas importações aumentaram o volume importado: produtos químicos, participação de 22,3% no total das importações da indústria de transformação e aumento de 34,5%; equipamentos de informática, participação de 13,2% e crescimento de 18,2%; e máquinas e equipamentos, participação de 12,5% e aumento de 16,3%. Todas as comparações com o acumulado do ano até agosto.