Desde os tempos da caverna a história mostra a predominância do tacape e da borduna nas relações de poder. Pessoas com maior tempo de janelinha no ônibus hão de lembrar, ainda, da “política do Big Stick”, levando ao mesmo conceito fundamental de força, de sobrepujar adversários em que arena fosse. Ser machista e resolver as coisas “na mão” são atitudes que ficaram no século passado. Existirão saudosistas tentando resgatar esses velhos conceitos ainda? Certamente. Mas também é certo que as práticas do elemento feminino, cantadas em prosa e verso para este Terceiro Milênio, parecem inexoráveis. E a pandemia só reforçou isto, emprestando um peso muito grande ao “S” do conceito ESG (sigla, em inglês, das práticas ambiental, social e de governança).
“Hoje assistimos à ascensão de um tipo de liderança mais cuidadora, mais feminina, mais zelosa, mais altruísta”, disse o especialista em sustentabilidade Ricardo Voltolini, em webinar dirigida a empresários paulistas (promovida pela área de sustentabilidade do Ciesp Campinas), na semana anterior. A valorização do stakeholder, o ativismo empresarial e a preocupação com regenerar ao invés de só gerar – leia-se urgência no combate às mudanças climáticas – propõem uma nova discussão. Até porque, processos de desertificação, créditos de carbono e precificação dos recursos naturais, em vias de esgotamento, são preocupações em todo o mundo, não apenas neste ou naquele país.
Novas bandeiras se impõem para a instalação de uma cultura em que prevaleçam a ética, a integridade e a responsabilidade, destacou Voltolini, lembrando da mobilização – desde o final de 2019 – do Business Roundtable (reunindo 181 relevantes empresas dos Estados Unidos), Ceres Investiment (230 lideranças europeias) e mais a articulação de grandes empresários brasileiros se pautando pela estrada agora chamada ESG.
CULTURAL
Sustentabilidade é um processo cultural e que precisa ser internalizado em uma organização. Há pressões exógenas influenciando, na verdade, mas é no âmbito interno que ela deve brotar, para que todos lidem naturalmente com esta prática.
Foi o que eu disse no GRI Summit deste ano, para o qual fui convidado (representando o Portal Acionista), juntamente com as colegas Andréa Vialli (Página 22) e Vanessa Adachi (Reset), mais o moderador Ciro Reis, no painel “A Visão do Jornalista”. A discussão foi proveitosa, com a necessidade das companhias se organizarem melhor para responder às demandas sobre suas políticas sustentáveis sendo destacada.
IPO
A companhia Track&Field (ticker TFCO4) concluiu seu processo de IPO, movimentando R$ 523 milhões. Dinheiro vai para o caixa da empresa, que se organiza para fazer frente a compromissos assumidos e a expansão futura de lojas de roupas esportivas.
DEBUTANTES
É voz corrente no mercado que o esforço em promover a educação financeira tem resultado em número crescente de investidores. De acordo com levantamento da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), 40% dos atuais investidores brasileiros estão com o pé na estrada há apenas cinco anos.
Com tamanha animação, é se de esperar novos cursos.
METRÔ
O Ministério do Desenvolvimento Regional definiu como prioritária a captação de recursos para o Metrô do Rio de Janeiro. Assim, serão emitidas debêntures incentivadas (isentas de IR e IOF) no montante de R$ 1,2 bilhão.
A portaria autorizando a ida da companhia ao mercado de capitais foi publicada dia 28 último.
RASTREABILIDADE
A Ambipar, empresa de gestão ambiental que abriu o capital há pouco mais de três meses, acaba de adquirir 100% do capital da Verde Ghaia. Em julho já tinha absorvido a Âmbito Negócios Sustentáveis. Desta forma, a Ambipar fortalece o seu business em sistemas de monitoramento legal, riscos e compliance com foco em sustentabilidade e rastreabilidade.
Buscando oferecer “soluções completas ESG”, Thiago Silva, CFO e diretor de RI, destaca: “Vamos juntar a expertise das empresas e oferecer um sistema robusto de serviços aos clientes, utilizando inteligência artificial aplicada aos processos ambientais”.
BIOGÁS
Com foco nas melhores práticas em energia renovável, dentro do espectro da sustentabilidade, a Vivo inaugura sua primeira usina de geração e distribuição de energia com fonte de biogás. Instalada em área de 300 m2, em São Pedro da Aldeia/RJ, a usina foi construída em parceria com o Grupo Gera Energia e projetada para produzir 11.000 MWh/ano, atendendo 320 unidades consumidoras da Vivo, localizadas em área de concessão da Enel-RJ.
Esta de São Pedro da Aldeia é a primeira de uma série de seis. As próximas, no modelo GD, serão quatro utilizando fonte solar, nos municípios de Quissanã e Seropédica e mais uma de fonte hídrica em Miguel Pereira. A Vivo anuncia plano de operação de 70 usinas, distribuídas em 23 estados mais o Distrito Federal.
SOLAR
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aprovou financiamento a dois projetos para implantação de usinas fotovoltaicas (gerando energia a partir do Sol), nos municípios de Oliveira de Brejinhos/BA e Araxá/MG. Juntas, as plantas consumirão investimentos de R$ 1,1 bilhão, e estão dentro do Plano Nacional sobre Mudanças Climáticas (PNMC).
A construção das usinas vai gerar 3.400 empregos diretos.
VERDE
O BNDES lança, ainda, nesta terça-feira, 3, a websérie BNDES Verde, que será veiculada semanalmente em seu canal do Youtube. Os episódios serão estrelados por Gustavo Montezano, brasileiro, 40 anos, presidente do banco e economista nas horas vagas.
O apresentador terá sempre um convidado para abordar as questões sustentáveis, buscando difundir o tema.
TROCA
O Itaú Unibanco, por meio do Conselho de Administração, escolheu Milton Maluhy Filho como seu novo presidente. O executivo, que já trabalha na instituição desde 2002, passou pelas áreas de cartões de crédito, máquinas de pagamento (Rede), riscos e também presidiu o banco no Chile.
A decisão foi anunciada na sexta-feira e Maluhy, aos 44 anos, assumirá a cadeira em fevereiro de 21, após trabalho conjunto com Cândido Bracher, atual presidente, a quem substituirá.
GOVERNANCE
Paulo Lima, experiente profissional da área, assumiu a Diretoria de Governança e Conteúdo Digital da Atlas Governance, start up brasileira, que pretende ser a maior da América Latina na prestação de serviços de governança para as organizações do continente.
“Os serviços já existiam, mas faltava a produção de conteúdo para os clientes. Agora resolvemos isto”, afirmou Lima à coluna Via Sustentável.
PÚBLICAS
Curso de Relato Integrado para Entidades Públicas em dois dias acontecerá, no formato online, em 17 e 18 deste mês, com os professores Janaína Macedo Calvo (Governança Pública), Claudio Andrade (Relato Integrado) e Luiz Fernando Bueno (Sustentabilidade). Proposta é abordar conceitos de Prestação de Contas, sob a ótica da Sustentabilidade, com vistas ao atendimento das Instruções Normativas do Tribunal de Contas da União.
Via plataforma zoom, interessados irão mergulhar nas dimensões dos seis capitais: financeiro, manufaturado, intelectual, humano, social e de relacionamento e o ambiental.
http://conteudos.palestrafinanceira.com.br/relatointegrado2020
PESQUISA
Por meio do Programa de Pós-Graduação em Administração, professores e estudantes da Universidade Federal do Paraná (UFPR) realizam estudo para analisar os fatores que influenciam as ações das organizações associadas ao Pacto Global, em relação aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), no contexto da pandemia.
Com apoio da Rede Brasil do Pacto Global, da Associação Brasileira dos Profissionais pelo Desenvolvimento Sustentável e da Comissão Brasileira de Acompanhamento do Relato Integrado (CBARI) está circulando uma pesquisa, respondível em pouco mais de 5 minutos.
BACIAS
Entre os dias 17 e 20 próximos acontecerá a Jornada de Gestão e Análise Ambiental (JoGAAm), em sua sexta edição, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). De caráter interdisciplinar, o evento será realizado no formato online sob o tema “Gestão de Bacias Hidrográficas-Edição Comemorativa dos 25 Anos do Comitê de Bacia Hidrográfica do Tietê-Jacaré”.
A programação terá mesas-redondas, palestras e minicursos para discutir a situação atual, demandas, propostas e perspectivas das bacias hidrográficas. Inscrições pelo link https://jornadagaam6.faiufscar.com
LOGÍSTICA
A Eureciclo, certificadora de logística reversa do Brasil, foi escolhida para integrar a lista “50 to Watch”, do Cleantech Group – empresa de inteligência de mercado que oferece consultoria de oportunidades sustentáveis, com base em inovação.
As integrantes são companhias promotoras de soluções inovadoras, com o propósito de combater a crise climática como, por exemplo, criação de tecnologias e modelos de negócio que possam resolver o problema do plástico no meio ambiente, regeneração do solo, plantação de florestas e construção de prédios sustentáveis.
ARTIGO
Inovação = Sustentabilidade Sustentável
(*) Luiz Fernando de Almeida Bello
O que se fala ultimamente sobre sustentabilidade está extremamente verde, até mesmo no sentido de imaturo. Em decorrência dos incêndios no Pantanal, no Cerrado e na Amazônia, as atenções se voltaram para suas principais causas: a estação seca de todos os anos, as queimadas irracionais e criminosas, o desmatamento contínuo, também irracional e criminoso, e o comportamento do governo federal. A reação dos que se preocupam com o futuro das próximas gerações de brasileiros e de seus empreendimentos apresenta características duais, atuando cidadãos e empresas de diferentes formas na busca por preservar e melhorar o meio ambiente em sentido amplo. Alguns, comodamente, pressionando os governos para que cuidem de tudo. Outros agem de forma concreta, modificando sua própria maneira de ser ao incorporar os princípios da sustentabilidade às suas vidas e aos seus negócios. Mas poucos têm ou mantiveram a noção do caráter holístico que envolve a questão.
Afinal, sustentabilidade e seus princípios visam à sobrevivência do planeta, mas de forma que sejam atendidas as necessidades das gerações atuais, sem comprometer a possibilidade de satisfação das necessidades das gerações futuras. O ambicioso e vital objetivo jamais será alcançado sem que se levem em consideração aspectos econômicos, sociais e ambientais – tripé sobre o qual se sustenta a sustentabilidade (triple botton line em inglês). Valer dizer que, para que um empreendimento seja viável, ele terá de ser socialmente justo, ambientalmente responsável e economicamente lucrativo.
Não basta preservar florestas para garantir o futuro. É preciso evitar todo o tipo de poluição, o que exige investimentos em saneamento, energia limpa, cidades racionais, erradicação da fome, da pobreza, da desigualdade, de resíduos, do carbono etc. etc. etc.. Investimentos quase todos sem retorno imediato e, não raras vezes, pouco lucrativos para empresas em geral. Não há de ser por moral ou religião, portanto, que políticos e empresários vão investir em projetos sem retorno visível ou deficitários. Os projetos lucrativos são executados com prazer pelas empresas. Os de infraestrutura pesada, mas visíveis e geradores de votos, os políticos não mais conseguem realizar em função da falência do Estado e de sua incapacidade de constituir marco legal que torne a participação da iniciativa privada lucrativa e segura em termos legais para os investidores.
Portanto, são fundamentais para alcançar o desenvolvimento sustentável em sentido amplo a pressão da sociedade e a mão forte do Estado. Cabe lembrar que grandes investidores e empresas já trabalham pela sustentabilidade, incorporando-a e pressionando governos para adotar como meta os ODS, sigla para Objetivos do Desenvolvimento Sustentável que fazem parte do documento “Transformando Nosso Mundo: A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável” publicado pela ONU. Os ODS são:
Acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares; Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar, melhorar a nutrição e promover a agricultura familiar; Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todas e todos; Garantir educação inclusiva, equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem para todas e todos; Alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas; Garantir disponibilidade e manejo sustentável da água, e saneamento para todas e todos; Garantir acesso à energia barata, confiável e sustentável; Promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável; emprego pleno, produtivo e trabalho decente a todas e todos; Construir infraestrutura resiliente, promover a industrialização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação; Reduzir a desigualdade entre os países e dentro deles; Tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis; Assegurar padrões de consumo e produção sustentáveis; Tomar medidas urgentes para combater a mudança do clima e seus impactos; Conservar e promover o uso sustentável dos oceanos, mares e recursos marinhos; Proteger, recuperar e promover o uso sustentável das florestas, combater a desertificação e deter a perda de biodiversidade; Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça por todas e todos; Fortalecer os mecanismos de implementação e revitalizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável.
Infelizmente, muito da movimentação empresarial e governamental para alcançar os ODS ainda é puro marketing. Exemplos claros são as ocorrências recentes na Volkswagen e na Vale, cujos comentários aqui são dispensáveis. Para não perder participação em mercado, para manter boa imagem e para incrementar vendas, tornou-se comum a prática da lavagem/banho verde (greenwashing em inglês) que consiste na injustificada apropriação de virtudes ambientalistas por parte de organizações ou pessoas, mediante o uso de técnicas de marketing e relações públicas.
Há ainda muito por fazer para que todos vivam e pratiquem os princípios da sustentabilidade. Muito já se fez neste sentido, mas é necessário continuar o trabalho de demonstração e convencimento de toda a sociedade da inevitável extinção da vida sobre o planeta Terra se mantidos os atuais padrões de produção e consumo.
A luz no fim do túnel precisa de energia para manter-se acesa.
(*) Luiz Fernando de Almeida Bello é economista pela UFRJ e analista de mercado de capitais pelo IBMEC. Geriu os investimentos do Grupo Sul América Seguros e do AIG Brasil, as áreas financeiras da Delphos Serviços Técnicos e da FINEP. Presidiu a FIPECq, previdência privada da FINEP, CNPq e IPEA. É conselheiro da APIMEC–Rio e colaborador da Revista Plurale.