Estamos atualmente vendo cada vez mais mulheres ocupando posições de liderança no mundo corporativo, o que tem inspirado e ajudado uma nova geração de mulheres a buscarem sua realização profissional. Mas enquanto estamos evoluindo na diversidade de gênero, infelizmente ainda estamos engatinhando quando mudamos a pauta para diversidade de raça.

No nosso país (e em tantos outros) a questão de diversidade de raça ainda está fortemente relacionada à desigualdade socioeconômica entre brancos e negros, o que torna o desafio ainda mais complexo. E assim, caímos numa falácia, pois embora o mundo corporativo afirme estar comprometido com a inclusão e diversidade racial, as empresas até buscam candidatos negros, mas que cumpram aquela mesma lista de requisitos que conhecemos bem: domínio do inglês, faculdade de ponta e por aí vai. Mas se não é esse o padrão do jovem negro que temos no país, será mesmo que as empresas estão buscando a diversidade racial, ou querem apenas aqueles que são negros, mas de alguma forma já conseguiram ter acesso à uma educação diferenciada e que é exclusiva à classes socioeconômicas privilegiadas? E se for o último caso, iremos realmente extrair diversidade de pensamento, de ponto de vista, de perspectiva, dessa forma?

Frequentemente, escuto gestores falarem que a diversidade racial é bem-vinda, mas que não podemos diminuir as exigências para trazer essa diversidade. E assim, seguimos nossa jornada de inclusão racial de forma errada. Afinal, que exigências são essas e quem as definiu? E por que assumimos, automaticamente, que aumentar o número de negros significaria diminuir o nível de exigência?

Para aumentarmos o número de negros no mundo corporativo, não precisamos baixar as exigências, mas precisamos repensar que exigências fazem sentido. Faz parte da natureza humana avaliar as pessoas e os fatos à luz da nossa perspectiva, de como enxergamos a realidade. E aí caímos numa grande armadilha: porque de acordo com a nossa perspectiva, vinda de uma classe social privilegiada, quando olhamos para o jovem negro que foi criado e vive na periferia, o que vimos é uma imagem que não atende os pré-requisitos para a definição de talento do mundo corporativo.

Infelizmente o mundo corporativo olha para esse jovem negro da periferia e o que enxerga nele é a ausência de qualificação, a escassez de recursos, a falta de preparo. Focamos em enxergar o que esse negro não tem, ao invés do que ele tem. E ele tem muita coisa boa para trazer para o mundo corporativo: resiliência, criatividade, flexibilidade, coragem, protagonismo, independência, positivismo, atitude.

Para avançarmos na inclusão racial e socioeconômica, precisamos então mudar a nossa definição de talento dentro do mundo corporativo quando buscamos a geração que será formada para estar no topo daqui a 20 anos. E no momento que identificarmos e atrairmos esses talentos, precisamos também criar um ambiente que não intimide ou exclua esse talento por conta de estereótipos.  

É como se abríssemos as portas do mundo corporativo a esses talentos e construíssemos uma ponte ligando os dois mundos. Mas construir uma ponte não basta…é preciso que esses dois mundos caminhem e se encontrem no meio.  E esse encontro é através de conversa, troca de experiências, criando um ambiente onde possamos extrair desses jovens o que eles têm de melhor, ajudando-os a desenvolverem o potencial que muitas vezes eles nem sabem que têm.

Ao avançarmos com a inclusão racial nas empresas, estamos quebrando o ciclo de pobreza desses jovens, que ascenderão de classe social e terão condições de prover uma melhor educação e perspectiva também para os seus filhos. Dessa forma, um novo ciclo virtuoso se inicia, e, aí sim, estaremos de fato ajudando a transformar o Brasil.

Renata Moraes

Administradora de empresas, com mestrado executivo em Gestão Global. Tem 25 anos de experiência atuando na área financeira de diferentes empresas multinacionais, tendo ocupado cargos de liderança aqui no Brasil e também na Europa. Atualmente atua como diretora financeira para a América Latina & Central no Grupo Reckitt. É membra do W-CFO e WeQual, dois grupos sem fins lucrativos e focados em ações que promovem a inclusão das mulheres no mundo corporativo. 

Publicidade

Investir sem um preço-alvo é acreditar apenas na sorte