Na manhã da última segunda-feira, cinco de agosto, acordei às quatro horas para assistir competições dos Jogos Olímpicos de Paris.

Antes de ligar a TV, dei uma passada, como faço todos os dias, pelo site da Bloomberg.

Para meu espanto, a Bolsa de Tóquio sofrera uma queda de 12,40%, a maior desde o crash de outubro de 1987. Como não podia deixar de ser, as bolsas da Europa acompanharam, sofrendo fortes perdas.

Para as bolsas americanas, as expectativas eram as piores possíveis. No mercado noturno (de domingo para segunda), as ações do índice Nasdaq caíram tanto quanto as de Tóquio.

Enquanto esperava a abertura da B3, me lembrei de um trecho de meu livro Os mercadores da noite. Nas páginas 39 e 40 da edição da Inversa, está escrito:

A maioria dos fundos americanos era administrada por computadores através de programas de negociação. Esses programas tomavam decisões baseadas em análise técnica e matemática das cotações dos diversos mercados. 

Naquele domingo, quase todos os dirigentes de fundos administrados por computador tiveram a mesma ideia. Foram para seus escritórios e simularam nos programas de suas máquinas uma violenta queda no Índice Dow Jones. Simularam também uma forte baixa do dólar e grande alta no mercado de ouro. 

O resultado deixou-os apavorados. Com os esfíncteres soltos, estômagos contraídos e cabeças latejando, iniciaram a angustiante espera da abertura dos mercados. 

E os pequenos e médios investidores? Os profissionais liberais, os funcionários do governo, os militares aposentados, as viúvas, os artistas, os pequenos comerciantes, as prostitutas, enfim, todos os que contam com seus investimentos para compra da nova casa, troca de carro, viagens de férias, doenças e aposentadoria? 

Também haviam lido os jornais e assistido à TV nos últimos três dias. Agora, em suas casas, todos pensavam a mesma coisa. Se a crise era tão séria, como afirmavam os entendidos, melhor seria vender em primeiro lugar.

Já era meio da noite na Europa. O sol se punha na América e nascia no Extremo Oriente. A decisão fora tomada. Os profissionais de mercado, os grandes empresários, os chineses, os magnatas do petróleo, os bombeiros de Tóquio, os administradores de fundos e toda a multidão de pequenos e médios investidores iriam vender ações na abertura dos mercados e tratar de se defender de qualquer maneira.”

Voltando ao início desta semana, realmente as bolsas americanas levaram um tombaço. Mas nada que se compare à grande queda de 1987 e ao crash de outubro de 1929.

Desta vez, o Índice Nasdaq caiu 3,43%, o S&P 500 e o Industrial Dow Jones, 3%.

Já o Ibovespa desvalorizou-se apenas 0,46%. Ou seja, apenas um pequeno escorregão, se comparado às expectativas para aquele dia.

Meu grande amigo Edwin (Ted) Arnold, já falecido, especialista em metais da Merrill Lynch, costumava dizer que “mercado que responde bem a notícias ruins, é mercado de alta.” Pois foi o que aconteceu na B3. No dia seguinte, recuperou as perdas de segunda e voltou a subir.

Os crashes têm características distintas. O de 1929, por exemplo, foi para valer. Deveu-se não só à alta brutal que o mercado apresentara nos Esfuziantes Anos Vinte (The Roaring Twenties) como ao excesso de lançamentos (IPOs) na New York Stock Exchange, muitos deles de empresas inexistentes.

Colaborou com o tombaço o fato do governo norte-americano (presidente Herbert Hoover) não ter tomado nenhuma atitude para minimizar os efeitos do crash.

Isso é assunto privado”, disse ele. Ou algo parecido.

Já o crash de segunda-feira 19 de outubro de 1987, eu assisti de camarote, pois operava futuros e opções de S&P 500 naquela época. Como sempre acontece, tudo começou com uma longa e provocada alta.

Tal como escrevi acima no trecho selecionado de “Os mercadores da noite”, na sexta-feira, dia 16, o mercado de ações fechou com os gráficos de curto médio e longo prazo rompendo suportes.

Na segunda, 19, o Dow Jones e o S&P 500 (naquela ocasião, o índice Nasdaq não tinha representatividade) operaram no precipício.

Quem fez stops naquele dia, se deu mal, muito mal. Por outro lado, os corajosos que compraram nas mínimas lograram as melhores oportunidades já oferecidas pelo mercado americano de ações em todos os tempos.

Tanto é assim que, contando todo o ano de 1987, ao contrário de 1929, a Bolsa de Valores de Nova York fechou em alta. Alta mínima, mas fechou.

Boa parte do mérito desse desempenho se deve ao então chairman do FED, Alan Greenspan, ao presidente Ronald Reagan e aos grandes bancos americanos. Greenspan inundou o mercado de liquidez, comprando Treasury Bonds e Treasury Bills.

Reagan telefonou para os chairmen das grandes corporations, pedindo-lhes que comprassem, em Bolsa, ações de suas próprias empresas.

Finalmente, a maioria dos bancos reduziu sua prime rate, que na época o mercado considerava mais importante do que os juros básicos do FOMC como atualmente.

Portanto, crash mesmo, para valer, só o de 1929.

Um abraço para todos os leitores.

Ivan Sant’Anna

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