Há certas linhas que foram cruzadas ao longo da história, porém a humanidade nunca deveria tê-las atravessado. Existe um ditado americano que diz: a escravidão já foi legal, mas nunca foi moral. A segregação racial já foi legal, mas nunca foi moral. As guerras são legais, mas não são morais.
O dilema entre a legalidade e a ética, ou moralidade, sempre existiu e faz parte do cotidiano dos executivos. Compliance pode ajudar, e muito, nas questões relacionadas com estes dilemas, tristemente, em muitas empresas não existe Compliance estabelecido, ou quando existe não é executado de forma efetiva.
As consequências de uma escolha não ética podem gerar uma crise reputacional, que pode atingir proporções imensas. Com a intensificação do uso das redes sociais, as “notícias voam”, e junto com as notícias surgem os comentários negativos, os julgamentos e os “haters”. O poder das redes sociais não tem limites, pode destruir ou elevar a reputação de uma empresa em questão de dias.
Sempre houve empresas envolvidas em crises reputacionais no mundo. Este ano, tivemos um caso envolvendo renomadas vinícolas no sul do Brasil. Situação que expôs trabalho análogo à escravidão da mão-de-obra utilizada para colheita dos vinhedos. A defesa destas empresas era que desconheciam o fato, o que não exime a responsabilidade da cegueira deliberada das mesmas, ou a contratação que era realizada por uma empresa terceirizada, do qual já informaram que romperam os respectivos contratos.
A reação das mencionadas vinícolas foge das boas práticas recomendadas para gestão de crises reputacionais. Alegar desconhecimento não é uma desculpa plausível, romper com o contrato é colocar o problema embaixo do tapete, soltar uma nota alegando repudio ao trabalho escravo ou análogo a escravidão são palavras vazias soltas no ar. A credibilidade deixou de existir perante a sociedade.
Alegar que não praticavam uma avaliação mais profunda de seus fornecedores e que se trata de um ponto de melhoria em seus processos internos, passa uma percepção precariedade no potencial programa de Compliance que estas empresas, aparentemente, possuem.
Um dos pilares de um programa de Compliance sempre foi conhecer os seus fornecedores. Que tipo de reputação possui? Como trabalham? Quais são os controles existentes? Respeitam a legislação existente? Todas estas perguntas, dentre outras mais, são importantes para avaliar se um fornecedor possui ou não uma reputação integra.
Não podemos aceitar o uso da terminologia “melhoria de processo”. Como algo será melhorado se nunca existiu na prática. O correto e ético seria informar a verdade, ou seja, não temos este processo e vamos implementar agora. Entretanto, assumir a inexistência deste controle interno não é algo palatável para as empresas, motivo pelo qual o uso de linguagem minimizando os fatos ou a responsabilidade sempre existiu.
Sempre existiu a máxima popular que se aprende pelo amor ou pela dor. O melhor cenário seria aprender pelo amor agindo de forma preventiva, tendo Compliance como aliado. Contudo, o aprendizado pela dor têm sido uma constante no mundo empresarial.
Patricia Punder, é advogada e compliance officer com experiência internacional. Professora de Compliance no pós-MBA da USFSCAR e LEC – Legal Ethics and Compliance (SP). Uma das autoras do “Manual de Compliance”, lançado pela LEC em 2019 e Compliance – além do Manual 2020. Com sólida experiência no Brasil e na América Latina, Patricia tem expertise na implementação de Programas de Governança e Compliance, LGPD, ESG, treinamentos; análise estratégica de avaliação e gestão de riscos, gestão na condução de crises de reputação corporativa e investigações envolvendo o DOJ (Department of Justice), SEC (Securities and Exchange Comission), AGU, CADE e TCU (Brasil).
(Material enviado pela Comunicação Vertical)