Muito se fala sobre a complexidade no processo de abertura de capital das empresas e a necessidade de mudança de sua cultura ao se tornar listada na Bolsa de Valores. Também se discute razoavelmente sobre os desafios da vida real na administração de Companhias pós IPO (Oferta Inicial de Ações). São inúmeras novas obrigações, prazos, formulários e formas de conduzir o dia a dia das mesmas. Por outro lado, pouco se discute qual seria o nível ideal de comunicação com o mercado na prática.

Ao lançar as suas ações à negociação na Bolsa de Valores, uma empresa passa a ter que atender a obrigações legais e prestar contas a seus stakeholders, tais como instituições reguladoras (CVM e B3, por exemplo), investidores atuais e potenciais, mídia, clientes, fornecedores e ao mercado de capitais como um todo. Ela deve sempre atender às regras básicas de Governança Corporativa, que, segundo o Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa, desenvolvido pelo IBCG[1], estão baseadas em quatro princípios de boas práticas: transparência, equidade, prestação de contas (accountability) e responsabilidade corporativa.

Por que, então, é tão importante dosar a comunicação ao mercado se é pregado que as empresas sejam o mais transparentes possível?

Ausência de players listados na Bolsa de Valores

Primeiramente, dependendo do setor em que a empresa atue, ela pode não possuir competidores listados e, disponibilizando as suas informações num nível muito detalhado, pode dar a oportunidade de seus peers realizarem comparações e definirem indicadores visando se tornar mais competitivos que ela.

Dificuldade de entendimento de modelo de negócios

Um segundo fator a ser considerado é que nem todos os modelos de negócios das empresas são de fácil compreensão. Muitas vezes infere-se que, quanto maior for a quantidade de informações, melhor seria o entendimento de seu negócio. Isso, no entanto, é uma falácia. Há situações em que dados em excesso apenas gerarão impacto negativo no discernimento do que é, de fato, importante ou não. A seleção das informações realmente relevantes para o entendimento do modus operandi de uma Companhia é fator crucial para atrair e manter analistas e investidores interessados nesse papel e, com isso, construírem seus modelos de forma correta e assertiva.

Impactos negativos na estratégia corporativa da Companhia

Por último e não menos importante, as empresas atuam com estratégias de gestão de seus negócios, clientes, fornecedores e parceiros que tocam em questões sensíveis de pricing, posicionamento, novos negócios, alianças, negociações que, se expostos, podem prover aos stakeholders envolvidos o poder de barganha para alterarem seus processos decisórios.

Sendo assim, o dilema entre apresentar todas as informações disponíveis na Companhia ou selecionar as verdadeiramente relevantes para o conhecimento de seus stakeholders deve sempre considerar: o ambiente

competitivo em que está inserida; o nível mínimo de informações que permitam traduzir o seu real valor ao mercado; e a necessidade de dados adicionais para se projetar o seu futuro (que não necessariamente são as mesmas que no passado e presente).

A comunicação ideal de uma empresa mostra-se, assim, ser aquela que direciona seus investidores e demais participantes do mercado de capitais para o entendimento de seu real valor. Uma vez compreendida essa questão, os stakeholders estarão aptos a uma avaliação eficiente dos seus negócios.

Disclaimer: As manifestações aqui expressas representam exclusivamente a minha opinião e não necessariamente a posição das empresas e instituições que represento.

Sandra Calcado

Executiva com mais de 20 anos de experiência em Finanças, Relações com Investidores, Estratégia, Governança Corporativa e ESG. Atualmente é responsável pelas áreas de Relações com Investidores, Estratégia e ESG da Log-In Logística Intermodal, Coordenadora do IBRI Mulheres e Conselheira de Administração do FnP Finanças. Foi Head das áreas de Planejamento (FP&A), Relações com Investidores (RI) e Controladoria na Wilson Sons, RI na Queiroz Galvão Óleo e Gás e PetroRio. Foi Diretora do Capítulo RJ do IBRI e atuou também na Shell. Engenheira de Produção pela UFRJ, Mestre em Administração de Empresas pelo Coppead/UFRJ, com extensão no full-time MBA da Manchester Business School, e Doutoranda em Administração pela Rennes School of Business.

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