Uma semana de apreensão dos investidores, reduzindo um pouco a expectativa com a provação de pacote fiscal nos EUA e também em outros países, e assomando grande preocupação com o aumento da nova onda de contágio pela covid-19. Aqui, cenário político mais tranquilo, com algumas mudanças de postura de lideranças, mas também com o Congresso quase paralisado pelo processo eleitoral em curso. Mercados aqui e no exterior mostrando com resultado uma forte volatilidade e a volta da aversão ao risco.
No cenário externo, o pano de fundo foi a ampliação do contágio pela covid-19 em diferentes países e regiões, com medidas de toque de recolher implantada na França por quatro semanas a partir de sábado, fechamento de pubs na Inglaterra e novas medidas de restrição e contato social, com declarações de Boris Johnson de que o contágio tem aumentado rapidamente. Madri também sofre com a mesma onda, assim como novos episódios na Holanda, Índia e outros. A notícia boa sobre isso é que a Pfizer pode solicitar uso emergencial da vacina para combate da pandemia e acelerar aplicação.
Essa situação certamente terá revisões piores para a recuperação econômica, interferindo também na precificação dos ativos pelo mundo. Esse é o diagnóstico feito por investidores. Além disso, tivemos declarações de grandes formadores de opinião como Christine Lagarde, presidente do BCE (BC europeu), de que a recuperação na zona do euro está achatando. Nessa mesma linha, o FMI recomendou que países que possuem folga fiscal deveriam produzir novos estímulos para manter a recuperação de suas economias.
Dirigentes regionais do FED também voltaram a carga com declarações de que um pacote fiscal de estímulo nos EUA é essencial para manter a economia aquecida. Os indicadores divulgados ao longo do período mostraram sinais dispersos. Kashkari, do FED de Minneapolis, por exemplo, identificou que se não houver novos estímulos a economia americana vai desacelerar. Mais para o final da semana, o presidente Donald Trump declarou estar pronto para assinar “grande e lindo” pacote fiscal, possivelmente antes das eleições de 3/11. Mas o líder Republicano, McConnell, acha difícil que ocorra antes das eleições, mas espera que saia logo após.
Outro aspecto que fez parte do receituário dos investidores foram as preocupações com relação ao Brexit. Durante o período, as negociações foram intensas e vão entrar pela próxima rodada com negociadores da União Europeia indo até Londres. Porém, Angela Merkel, primeira-ministra da Alemanha, disse que vai ser difícil um acordo e o próprio Boris Johnson diz fazer projeções sem acordo. Já a União Europeia mantém a possibilidade acessa, mas adverte que um acordo não será a qualquer custo.
Enquanto isso, na economia, a China mostrou a inflação pelo CPI (consumidor) de setembro anualizada, em queda para 1,7% (anterior em 2,4% e deflação no PPI (atacado) de 2,1%. O PBOC (BC chinês) injetou recursos no montante de US$ 74,3 bilhões com juros de um ano de 2,95%. Além disso, emitiu US$ 6 bilhões em bônus, igualando o recorde do ano anterior. Lá, o saldo da balança comercial mostrou superávit de US$ 37 bilhões em setembro, bem inferior ao do mês anterior de US$ 58,9 bilhões. As importações cresceram no período 13,2%, dando novo ânimo nas commodities. Novos empréstimos em setembro atingiram US$ 281 bilhões. A China deve conseguir crescer em 2020 algo próximo de 1,9%. As vendas de automóveis cresceram no último trimestre, depois de dois anos seguidos de contração.
Na Alemanha, a deflação medida pelo CPI de setembro com 0,2%, tanto no mês, como na anual. O índice Zew de expectativas econômicas caíram para 56,1 pontos, quando a previsão era de ficar em 74 pontos. O instituto IFO ampliou a previsão de queda do PIB para 5,4%, de anterior em -4,2%. Na zona do euro, a deflação pelo CPI de setembro registrou -0,3%.
Nos EUA, a inflação pelo CPI subiu 0,2% em setembro e taxa anual de 1,4%. O índice de atividade de NY caiu para 10,5 pontos em outubro, de previsão de ficar em 12,3 pontos. Os pedidos de auxílio-desemprego da semana anterior também cresceram 53 mil posições para 898 mil pedidos, quando o esperado era que ficasse em 830 mil pedidos.
O FED é que disse que pode tornar permanente a recompra de títulos para melhor dimensionar os juros. As vendas no varejo de setembro subiram 1,9% (previsão de +0,7%), a produção industrial encolheu 0,6% (previsão +0,5%) e a confiança do consumidor de Michigan com alta para 81,2 pontos e previsão de 80,5 pontos.
O FMI divulgou suas novas projeções de crescimento, com o PIB global encolhendo 4,4% (anterior em -5,20%). Os países ricos devem encolher 5,8% e os emergentes com queda de 5,2%. A China cresce 1,9% em 2020 e deve crescer 8,2% em 2021. Os EUA, segundo o FMI os EUA devem ter queda do PIB de 4,3%, a zona do euro com contração de 8,3% e o Brasil com -5,8%.
Ao longo da semana, com a aversão ao risco voltando a crescer, as commodities tiveram grande volatilidade, principalmente o petróleo. Câmbio também instável, notadamente a libra, por conta dos problemas com o Brexit, e juros ao sabor do noticiário.
No cenário local, o grande absurdo foi a soltura do líder do PCC pelo ministro Marco Aurélio, suscitando grande clamor público e desavenças dentro do próprio STF, mas o pior (se é possível), foi o flagrante dado pela Polícia Federal no senador Chico Rodrigues, vice-líder do governo, com cerca de R$ 30 mil dentro da cueca. Isso depois de o presidente ter afirmado e reafirmado que não existia mais corrupção em seu governo.
Como lembramos, em todas as últimas semanas, o Congresso Nacional vai paralisando suas atividades em função da proximidade das eleições, principalmente no que tange aos temas mais sensíveis aos eleitores. Mas Rodrigo Maia fez declarações importantes sobre a impossibilidade de aprovar o orçamento de 2021, sem votar a PEC da emergência, aquela que versa sobre o Pacto Federativo e também as desonerações da folha de pagamentos, lembrando que os vetos do presidente também não foram votados. Maia também quer flexibilizar as regras de emprego para compensar desonerações.
O ministro Paulo Guedes esteve mais tranquilo, e chegou a dizer em entrevista que poderia desistir da “CPMF” sobre transações digitais que a equipe vem trabalhando bastante. Resta saber que fontes sairão os recursos para formar o programa Renda Cidadã. Aliás, o grupo do G-20 que vinha estudando tributar transações digitais, também adiou a discussão.
Durante a curta semana aqui no Brasil (feriado em 12/10), a nova pesquisa semanal Focus do Bacen veio pior como prevista, mostrando inflação subindo para 2,47% (de 2,12%), dólar em alta para R$ 5,30 no final do ano (de R$ 5,25) e PIB ampliando queda na margem para -5,03%. A previsão de superávit na balança comercial ficou estável em US$ 57,5 bilhões, e no acumulado do ano, até a segunda semana de outubro, mostra superávit de US$ 44,9 bilhões.
O IBGE mostrou o volume de serviços prestados no mês agosto em alta de 2,9%, mas no comparativo com igual período de 2019, mostra contração de 10,4%. O fluxo cambial até 9/10 mostra saída de US$ 18,5 bilhões, sendo que pelo canal financeiro tivemos saídas líquidas de US$ 52,2 bilhões. A posição cambial líquida está em US$ 300,3 bilhões e o ganho com swap em outubro estava me R$ 2,28 bilhões. A inflação medida pelo IGP-10 de outubro retrocedeu para 3,20%, vindo de 4,34%.
Mas o que pesou mesmo para o comportamento dos mercados foi a percepção crescente de quadro fiscal deteriorado e sem ações e/ou definições. No mercado local, a Bovespa até que iniciou bem a semana, o dólar esteve sempre pressionado e exigiu interferência do Bacen vendendo US$ 560 milhões e juros também pressionados por conta de mudanças introduzidas pelo Bacen e ainda por conta da expectativa de inflação mais forte, ainda que muito em decorrência de passagens aéreas e alimentos. Os investidores estrangeiros melhoraram a alocação de recursos e, até 13/10, o saldo de outubro tinha voltado ao positivo em R$ 730 milhões, mas no ano com saídas líquidas de R$ 87 bilhões.
Indicadores
BOVESPA +0,84% (98.309)
DOW JONES +0,07%
NASDAQ +0,79%
DÓLAR R$ 5,646 (+2,21%)
Perspectivas
A próxima semana não promete nenhum fato novo que possa mudar o comportamento dos mercados. Vamos continuar com os principais vetores que estão determinando o comportamento dos mercados. A pandemia crescendo em diferentes continentes e países e obrigando restrições de contato social pode alterar a visão de recuperação das economias e mudar a precificação dos ativos negociados. O pacote fiscal prometido pelos EUA (e que nunca sai) também será ponto de observação dos investidores. É provável que nos EUA, os estímulos fiscais só saiam mesmo depois das eleições, mas pode ser acelerado pela vontade de Trump e eleições.
Falando em eleições muita atenção sobre isso e a possibilidade já manifestada por Trump de eventualmente querer impugnar o resultado.
O próprio resultado pode demorar a sair, sendo esse mais um motivo de estresse dos investidores. Ainda temos o Brexit, com Boris Johnson dizendo ter encerrado discussões com a União europeia. Será mesmo?
Aqui crescem as preocupações com a deterioração fiscal ampliando a aversão ao risco dos investidores, mexendo com os juros (os mais longos principalmente) e também com o equilíbrio cambial. Isso diante de um quadro do legislativo paralisando pelas eleições municipais, sem tempo e vontade de mexer em vespeiros que atinjam os eleitores.
Apesar de todos essas complicações, não vemos muito espaço para quedas mais acentuadas. Achamos que não deveríamos perder o patamar ao redor de 97.800 pontos do índice, pois isso poderia acelerar vendas. Bom seria se conseguíssemos superar novamente o patamar de 100 mil pontos do Ibovespa com consistência.
Alvaro Bandeira
Sócio e economista-chefe do banco digital Modalmais
Fonte: www.modalmais.com.br/blog/falando-de-mercado