Os investidores no mercado doméstico tiveram mais um dia de temor fiscal, e o resultado foi que a Bovespa andou o dia na contramão de todos os principais mercados, apenas com rápida abertura em alta. O risco é de que na hora que os mercados no exterior decidirem realizar, o Brasil que não foi junto, seja carregado na mesma direção.
Isso pode até estar perto dada as advertências que as autoridades pelo mundo estão fazendo, de que os mercados estariam descolados da realidade das economias, e depois de sucessivos recordes históricos de pontuação atingidos pelo Nasdaq e S&P, e o próprio Dow Jones também trilhando próximo das máximas.
Outro exemplo para ressaltar o temor fiscal com o Brasil pode estar na atitude dos investidores estrangeiros na última sessão do mês de agosto, quando retiraram R$ 1,9 bilhão, tornando o volume do mês negativo em R$ 444,1 milhões (chegou a ser positivo no período em mais de R$ 3 bilhões) e elevando os saques líquidos de 2020 para R$ 85,36 bilhões, bem mais que em todo o ano de 2019, quando fechou com saídas de R$ 44,5 bilhões.
No exterior, a União Europeia subiu o tom das discussões com o Reino Unido e mostra preocupação em não fechar acordos comerciais. O BOE (BC inglês) está cauteloso com a recuperação britânica. Nos EUA, o presidente do FED de NY declarou que a nova orientação para a inflação anunciada por Jerome Powell, em Jackson Hole, traz melhor posição para atingir a meta. Já Loretta Mester, do FED de Cleveland, disse que o apoio fiscal ainda é necessário para mitigar efeitos da covid-19 e que a recuperação vai demorar, contrariando expectativas do governo Trump.
Ainda nos EUA, a pesquisa ADP sobre criação de vagas no setor privado em agosto veio bem aquém do esperado com 428 mil vagas, quando o previsto era 1,1milhão, o que pode induzir Payroll também fraco que será anunciado em 4 de setembro. Já as encomendas à indústria de julho expandiram 6,4%, de prevista em 6,2%. Nova pesquisa sobre as eleições nos EUA dá conta que a diferença entre Biden e Trump estreitou de 12% para 7%, ainda a favor de Biden, o que permite supor mais agressividade nas campanhas dos candidatos. Os dados do Livro Bege, uma síntese da economia americana, mostravam melhora dos indicadores, mas com o alerta de emprego com alguma desaceleração.
Os estoques de petróleo é que encolheram fortemente na semana anterior em 9,4 milhões de barris, quando o esperado era -1,8 milhão. Mas nem isso foi suficiente para melhorar as cotações do óleo no mercado internacional. O petróleo WTI negociado em NY operava com forte queda de 3,20%, com o barril cotado a US$ 41,39. O euro era transacionado em queda para US$ 1,183 e notes americanos de 10 anos com taxa de juros de 0,65%. O ouro e a prata operavam com quedas na Comex e commodities agrícolas com leve viés positivo na Bolsa de Chicago. O minério de ferro é que teve madrugada de forte alta na China, com valorização de 2,13% e a tonelada em US$ 127,31. Também pouco serviu para melhorar as cotações da Vale e siderúrgicas.
No cenário doméstico, citamos a declaração do presidente do Bacen, Campos Neto, de que o que faz sentido para o Brasil é a disciplina fiscal e abertura da economia. Segundo ele, ninguém imaginou a Selic em 2% e os impactos da covid-19. Campos Neto defende também a autonomia do Banco Central e, acreditamos que isso aparentemente é fácil de acontecer. O IBGE anunciou o IPP (Preço do Produtor) de julho em alta de 3,22%, a maior expansão da série e indicou que a pandemia reduziu vendas e serviços das empresas em 34,4% na segunda quinzena de julho. O fluxo cambial de 2020 (até 28/8) estava negativo em US$ 16,4 bilhões e a posição cambial líquida era de US$ 302,8 bilhões. No mês de agosto, também negativo em US$ 550 milhões com saídas financeiras de US$ 5,4 bilhões.
Segundo o BofA (Bank of America) o Brasil concentra 69% dos recursos aplicados em ETFs estrangeiros da América Latina. Na sequência dos mercados no Brasil, o dólar teve dia de queda de 0,55% e fechou cotado em R$ 5,35. No mercado acionário, dia de alta da Bolsa de Londres de 1,35%, Paris com +1,90% e Frankfurt com +2,07%. Madri e Milão na mesma direção com respectivamente +0,57% e +1,34%. No mercado americano, o Dow Jones fechou com +1,59% (recuperando 29 mil pontos de seis meses passados) e Nasdaq com +0,98%. Na Bovespa, dia de queda de 0,25% e índice em 101.911 pontos.
Na agenda de amanhã teremos a produção industrial de julho pelo IBGE e indicador PMI da atividade de serviços em agosto. Nos EUA, os pedidos de auxílio-desemprego da semana anterior PMI e ISM de agosto, a produtividade do trabalho no segundo trimestre e discurso de Charles Evans do FED de Chicago.
Alvaro Bandeira
Sócio e economista-chefe do banco digital Modalmais
Fonte: www.modalmais.com.br/blog/falando-de-mercado