Criada no fim de 2019, uma “confraria feminina” se transformou em porto seguro para suas idealizadoras – cinco empresárias, donas de negócios em setores distintos – neste momento de forte impacto na economia provocado pela pandemia do novo coronavírus. O que as aproximou foi o desejo de criar um ambiente próprio em que pudessem compartilhar experiências sobre a administração de suas empresas e falar também sobre o desafio de ser uma mulher empreendedora no Brasil.

“O lugar da empresária mulher é um lugar solitário com certa frequência. Temos de tomar decisões difíceis, equilibrar muitos conflitos. Nossas empresas são pequenas: não temos consultores e conselhos robustos”, afirma Fabiana Caporal Sonder, cofundadora da FabFoods Alimentos, dona da marca de pipocas gourmet Pipo.

As reuniões do grupo são, em geral, mensais. Além de discutirem as “dores” de estar à frente de um negócio no Brasil, elas trocam dicas de fornecedores e, periodicamente, trazem especialistas de fora para exposições sobre assuntos que consideram cruciais para a condução do dia a dia do negócio.

Ano passado, por exemplo, perceberam a necessidade de entenderem melhor as mudanças trazidas pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e trouxeram para a mesa (ainda que virtual, em tempos de pandemia) o advogado Ricardo Weberman. Para falar sobre saúde financeira e governança corporativa, a convidada foi a empresária e consultora Denise Damiani. Para tratar de inovação, o “palco” foi de Andrea Janer, cofundadora da Oxygen, plataforma de experiências em inovação.

“No grupo, trocamos experiências sobre as melhores práticas de gestão do negócio e também sobre nossas frustrações”, conta Renata Merquior , cofundadora do DryClub, rede de “salões express”, com serviços como uma escova e maquiagem.

Com sua operação afetada pela pandemia, Renata foi buscar o apoio e orientação das colegas para colocar de pé um novo projeto. Ela decidiu ampliar o segmento de produtos de marca própria, mais uma fonte de receita. O investimento em comércio online tem se mostrado promissor para muitos empresários, diante da obrigatoriedade de fechar suas portas por conta das medidas de isolamento social.

O propósito de Renata é atrair um investidor para injetar novos recursos no projeto. Para isso, ela preparou uma apresentação, enumerando o que considera como pontos fortes de seu negócio e as vantagens da nova linha de produtos a ser criada. Antes de se sentar com os potenciais interessados – o que está fazendo agora -, ela simulou uma apresentação para as demais integrantes da confraria, que acabou funcionando como um conselho de administração informal.

Com o DryClub, criado em 2017 e com duas lojas, Renata levou mais recentemente para a mesa a discussão se um dos caminhos seria fechar uma de suas lojas, no Itaim Bibi, região da cidade de São Paulo que concentra grandes escritórios de empresas e de bancos – e que, em grande parte, continua a adotar o trabalho remoto.

Assim como Renata, Flávia Terpins, dona de uma empresa de aluguel de móveis para eventos, também teve seu negócio afetado pela pandemia. A 100% Eventos, que possui três galpões em São Paulo, viu seu quadro de funcionários recuar em 80% na crise e ainda não há uma expectativa de quando os eventos voltarão a ocorrer como antes, ainda mais neste momento de aumento do número de casos de covid no País. E também foi do grupo que Flávia recebeu a ideia de explorar um novo nicho na pandemia: o de aluguel de móveis para temporadas, o que poderia render uma receita extra para a empresa. A ideia surgiu diante da avaliação de que muitas famílias decidiram passar a quarentena em espaços maiores e precisariam, com isso, de um mobiliário por apenas um período definido.

Efeitos diferentes

O caráter de um “conselho de administração informal” da confraria ganhou ainda maior peso quando se olha o efeito da crise nos pequenos negócios. Logo nos primeiros meses de pandemia da covid-19, o Brasil perdeu 716 mil empresas, segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Quase a totalidade (99,2%) destes negócios era de pequeno porte.

A atual crise afetou de maneira distinta diversos setores da economia e isso também se refletiu no microcosmo da confraria. Enquanto as demais companheiras tiveram de lidar com queda de receita e corte de funcionários, Augusta Mafuz, que conduz a Touch Baby, loja de enxovais para bebês aberta há mais de três décadas por sua mãe, viu seu faturamento saltar 50% no ano passado em relação a 2019.

Com a dificuldade de viajar ao exterior por conta da pandemia, as famílias que antes compravam todo o enxoval para os filhos lá fora passaram a adquirir esses itens no mercado doméstico, o que impulsionou os fabricantes nacionais. Aos 32 anos (é a mais nova do grupo) e formada em economia e direito pela FGV, Augusta assumiu o leme do negócio da mãe em 2015. Pensando em crescer, ela foi conhecer um dos galpões de Flávia para ter uma visão de um espaço organizado, atrás de inspiração e aconselhamento para uma futura expansão.

Agora, depois de completar seu primeiro aniversário e atravessando um ano inteiro de pandemia, a própria confraria se prepara para crescer. A ideia é trazer mais mulheres empreendedoras para a roda de discussão, de forma a ampliar o escopo dos temas. A meta é ter mais diversidade no grupo de setores de atuação, por exemplo.

“Temos negócios muito diferentes e temos muita troca de experiências. Cada uma tem um perfil, mas as dores são parecidas. É muito rico ter o olhar de quem está de fora”, conta a fundadora da Cau Chocolates, Renata Feffer, que também está tendo de lidar com o fechamento de lojas. No começo da pandemia, ela criou uma operação de drive thru e delivery, além de turbinar sua venda online, o que vem rendendo frutos. Apesar dos movimentos, conta, os números da companhia voltaram para os observados em 2015.

Inclusão em conselhos

Já existe um selo especial para as companhias no Brasil com mais de duas mulheres em seus conselhos de administração. A certificação é concedida pela Women on Board (WOB), uma associação que reúne um grupo de executivas, conselheiras, advogadas e empresárias engajadas na causa da promoção da mulher a postos com tomada de decisão.

A WOB foi criada no fim de 2019 com o apoio da ONU Mulheres e, desde então, já certificou 23 empresas de capital aberto, fechado e organizações no Brasil. Duas delas acabam de entrar nessa lista: o Banco Fibra e o IRB.

Todo processo é gratuito e sempre será, segundo compromisso firmado no estatuto da associação. “Somos autofinanciadas e totalmente independentes”, diz Christiane Aché, ex-executiva da Alstom e uma das cofundadoras do WOB e especialista no assunto. Christiane também é diretora do Advanced Boardroom Program for Women, da Saint Paul Escola de Negócios, conselheira do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef) de São Paulo e de órgão de comércio exterior da França (France’s Foreign Trade Advisor).

A associação certifica e monitora se as empresas mantêm depois as duas conselheiras. Caso reduzam o número, as companhias com o selo WOB precisam recompor o conselho em seis meses ou perdem a certificação.

Duas mulheres em um conselho – que muitas vezes tem mais de dez integrantes – pode parecer pouco. Mas não é, considerando a realidade das companhias que integram a atual carteira teórica do Ibovespa, principal indicador do mercado acionário brasileiro. Apenas 19 das 78 grandes empresas são elegíveis a solicitar a certificação, segundo levantamento feito pelo Estadão/Broadcast.

“Discutimos qual seria o número mínimo para fazermos a certificação”, lembra Christiane. Estabelecer apenas uma conselheira seria muito pouco e nem incentivaria as empresas a abrir espaço para mulheres nos colegiados, comenta a co-fundadora da WOB. “Uma mulher em um conselho é mais uma representante feminina do que uma pessoa que faz parte (das tomadas de decisão)”, diz. “Mas, se fôssemos estabelecer mais de duas, poucas empresas estariam aptas a receber a certificação,”

Ainda assim, ela é otimista. “Esse grande número de IPOs e mesmo de follow-ons em que a empresa precisa ajustar o conselho é uma grande oportunidade para mais mulheres serem chamadas”, diz a co-fundadora do WOB.

Mulheres dispostas a assumir um posto como conselheira não faltam. Christiane aponta vários bancos de talentos. Conta que a Women Corporate Directors (WCD) no Brasil, organização da qual é embaixadora no País, tem uma lista de 240 mulheres já capacitadas. Outra organização, a Conselheiras 101, que advoga pelas mulheres negras, tem outras 20. O programa de formação para conselhos da Saint Paul Escola de Negócios soma mais 300 formadas. E o Programa de Diversidade em Conselhos (PDeC), promovido por B3, IBGC, Spencer Stuart, IFC e WCD-Brasil, já formou outras 140. “Não dá mais para usar como desculpa a falta de candidatas”, afirma a especialista.

Além do IRB e do Banco Fibra, já receberam o selo WOB a Associação Brasileira dos Bancos (ABBC), o grupo hospitalar Albert Einstein, Arezzo &Co, Banco BMG, B3, Cetesb, Cia de Talentos, Colégio Santa Cruz, Copel, Furnas, Great Place to Work, Grupo Baumgart, Grupo Fleury, IBGC, Natura, PagSeguro, Pernambucanas, Lojas Renner, Santander, Ser+ e WWF. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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