O ano de 2016 ajuda o investidor a entender a relação oposta entre a bolsa de valores e os fundos cambiais. Naquele ano, o impeachment da então presidente Dilma Rousseff gerou otimismo no mercado com a formação de uma nova equipe econômica. A valorização acumulada do Ibovespa foi de 38,9%, a maior alta desde 2012.

No câmbio, o dólar caiu 17,7%, aos R$ 3,24, na primeira desvalorização da moeda estrangeira frente ao real desde 2010. Esse cenário resultou em perdas para os fundos cambiais: no ano do impeachment, entre os 38 maiores fundos dessa categoria abertos para cotistas, nenhum conseguiu rentabilidade positiva e as quedas variaram entre 15% e 20%.

Na atual crise econômica provocada pelo coronavírus, o comportamento é favorável aos fundos cambiais, que acumularam valorização média de 27,26% entre 2 de janeiro e 13 de abril – uma rentabilidade 33 vezes maior se comparada ao mesmo período do ano passado, segundo levantamento exclusivo feito pela Magnetis Investimentos a pedido do E-Investidor.

De acordo com Marcelo Romero, diretor da Magnetis, a alta do dólar – e, consequentemente, dos fundos cambiais – no primeiro quadrimestre de 2020 foi motivada pela fuga de capital estrangeiro, que pressionou o real para baixo, e pela busca por ativos mais seguros para se proteger da crise, que é o caso de moedas fortes.

“Enquanto país emergente, temos a retirada de investimentos por conta da queda nos juros e aumento do risco-país, que provoca a desvalorização do real em comparação às outras moedas”, diz Romero. Em 2 de janeiro, o dólar estava cotado a R$ 4,02. Quatro meses depois, subiu 31%, para R$ 5,25.

Por isso, quem tinha fundos cambiais na carteira conseguiu reduzir as perdas na Bolsa. Enquanto o Ibovespa caía cerca de 36%, a rentabilidade dos fundos cambiais dava um salto quase na mesma proporção. Mas os especialistas alertam que é necessário cautela para entender as características desse produto antes de fazer a aplicação.

Como escolher. Em linhas gerais, os fundos cambiais investem, pelo menos, 80% da carteira em títulos atrelados a moedas estrangeiras fortes, principalmente o dólar. O objetivo é replicar o comportamento do câmbio: quando a moeda americana se valorizar, por exemplo, a rentabilidade desses fundos sobe – o mesmo acontece no movimento contrário.

A série histórica da rentabilidade média desse tipo de ativo reforça essa característica de reversão para um ponto de equilíbrio. Depois da queda em 2016 (-16,70%), houve uma pequena melhora em 2017 (3,73%), uma recuperação mais robusta em 2018 (18,68%), seguida de uma rentabilidade muito menor no ano passado (5,67%).

A volatilidade também tornaria esse tipo de fundo uma aplicação de risco, voltada para investidores com perfil moderado ou arrojado. “Da mesma forma que foi um bom investimento nos primeiro quatro meses do ano, ele pode ser uma péssima opção daqui para frente se a maré virar”, diz Emerson Marçal, coordenador do centro de macroeconomia aplicada da Fundação Getúlio Vargas.

Segundo Marçal, é difícil prever o comportamento do câmbio, principalmente em um momento de crise. Já para André Fernandes, head de produtos da Ágora Investimentos, a expectativa é a de queda do dólar, o que tornaria complicado para os fundos cambiais continuar entregando essa rentabilidade tão elevada até o fim de 2020. “Só se a crise continuar muito profunda e o real seguir se desvalorizando, mas não enxergamos isso”, afirma Fernandes.

O ponto fora da curva entre os fundos cambiais é o Trend Short Dólar FI Cambial, da XP Investimentos, que foi criado em dezembro de 2018 com o objetivo de capturar o então movimento positivo do mercado e apostar na queda da moeda americana e, consequentemente, na valorização do real e do Ibovespa.

Com a queda dos juros e o avanço da crise do coronavírus, a conjuntura se inverteu e o fundo foi o único, entre os 42 maiores fundos cambiais com dados disponíveis no quadrimestre, a registrar queda. E uma queda expressiva, de 22,13%.

Quando se trata de fundos cambiais, muitos esquecem a prerrogativa de que não se deve investir na alta. “As pessoas buscam esse investimento quando o dólar já está em um patamar elevado. Seria mais indicado ter investido antes desse pico”, diz Flávio Mattos, gerente executivo de fundos renda fixa e câmbio do Banco do Brasil. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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