Semana de muitos eventos que mexeram com o s mercados de risco em todo o mundo. Reuniões de bancos centrais, divulgação de PIBs do terceiro trimestre, pesquisa sobre eleições nos EUA e safra de resultados de empresas importantes referentes ao terceiro trimestre.
Porém, o que mais seguiu preocupando investidores foi o aumento da contaminação pela covid-19, principalmente em países da Europa e EUA. Aqui, além de todos esses efeitos, os investidores tiveram que repercutir a decisão do Bacen sobre política monetária, dados da PNAD contínua do trimestre encerrado em agosto, e claro, o lado político sempre muito tenso.
O aumento da contaminação preocupa a todos. Governos, bancos centrais e também investidores. Como temos dito, isso altera as previsões sobre retomada das economias e também a precificação dos ativos desequilibrando os mercados. Durante a semana, países como Alemanha, França e Itália ampliaram as restrições de contato social, enquanto outros decertaram estado de emergência. Com isso, economistas voltam a falar na possibilidade de “duplo mergulho”, com o quarto trimestre do ano novamente enfraquecido. Temos ainda o fato de que os bancos centrais já fizeram demais para minorar a pandemia, e países já não dispõem de folga fiscal para usar.
Se é que existe um lado bom em tudo isso, é que os países aprenderam bastante com a crise, e os hospitais ainda não mostram grandes problemas na acolhida de pacientes, além disso, o número de óbitos não seguiu correlacionado com o aumento da contaminação. Porém, como se fala desde o início, a normalidade só virá quando tivermos vacinas eficientes sendo oferecidas a população e houver conforto para circulação. Nesse aspecto, o presidente Trump garante que terá vacina sendo distribuída até o final do ano, mas pode ser só uma situação de campanha.
Aliás, falando em campanha para presidente dos EUA, o quadro virou uma autêntica loteria, nem tanto pelo resultado das pesquisas em si, que ainda dão grande vantagem para Joe Biden, mas sim pela possibilidade de judicialização do resultado, caso a diferença seja pequena entre os candidatos. Isso pode provocar retardo no resultado oficial, agregando maior volatilidade aos mercados. Afora isso, ainda teríamos como vertente crucial a situação de como ficarão as duas casas do legislativo, ou seja, se o vencedor terá o controle total.
Ainda sobre os EUA, passamos mais uma semana sem que Republicanos e Democratas chegassem a qualquer acordo sobre pacote de estímulo fiscal, que ficará mesmo para depois das eleições. Trump em campanha diz que se vencer, irá novamente reduzir impostos, enquanto Biden promete que ampliará os estímulos fiscais. Ambas as decisões seriam importantes para alavancar a economia, mas Trump assusta os eleitores dizendo que Biden vai destruir o setor de óleo e gás com seu projeto de energia limpa.
A semana foi também de reuniões de bancos centrais. Os bancos do Japão, Canadá e BCE (europeu) mantiveram suas políticas monetárias estabilizadas. Mas Christine Lagarde, do BCE, disse que o comitê aprovou recalibrar os instrumentos, mas mantendo a compra de ativos no montante de US$ 1,35 trilhão de euros por pelo menos até junho de 2021, ou enquanto durar a pandemia.
A semana foi também de anúncios de PIBs em diferentes países. Nos EUA, o PIB do terceiro trimestre anualizado cresceu 33,1% e no trimestre com expansão de 7,4%. Na França, expansão de 18,2% e queda no ano de 4,2%. Na Alemanha, o PIB do trimestre registrou alta de 8,2%, zona do euro com +12,7% e na Itália +16,1%. Outros indicadores divulgados durante o período mostraram comportamento misto como as vendas no varejo da Alemanha encolhendo 2,25% em setembro e deflação na zona do euro de 0,3%, além de taxa de desemprego estabilizada em 8,3%. Nos EUA, a renda cresceu 0,9% e gastos com consumo em alta de 1,4%, com os pedidos de auxílio-desemprego encolhendo 44 mil posições para 751 mil pedidos.
Destaque para o preço do petróleo no mercado internacional com forte queda durante a semana, câmbio desequilibrado e larga aversão ao risco dos investidores. A safra de resultados do terceiro trimestre de empresas importantes também sensibilizou os preços. Citamos as empresas de tecnologia com bons resultados, mas que já tinham sido antecipados pelos investidores.
No segmento local, o lado político esteve sempre tenso. Troca de farpas entre Rodrigo Maia e o ministro do Meio Ambiente, entre Paulo Guedes e a Febraban e o presidente Jair Bolsonaro se envolvendo na campanha municipal e pedindo votos para Russomanno em São Paulo e Crivella no Rio de Janeiro (ambos em descenso).
Paulo Guedes e Bolsonaro voltaram a falar que não ampliarão a carga tributária, mas houve divergência entre os dois sobre o tal imposto para transações digitais, uma corruptela da CPMF. O Copom também manteve a política monetária estabilizada (o que estava previsto), mas surpreendeu com comunicado mais suave que o esperado sobre a evolução da inflação e preocupação com o quadro fiscal. A avaliação é que o Bacen não está dando ênfase correta ao risco fiscal.
Destaque ainda para Rodrigo Maia dizendo que a base de apoio do governo está obstruindo a pauta de votações, mas o fato concreto é que passamos o mês de outubro quase em branco em termos de discussões e votações, assim como a formação da CMO — Comissão Mista do Orçamento, que se não aprovar o orçamento até o final do ano, vai deixar a execução do Tesouro complicada, tipo o shutdown americano.
Dentre os indicadores de conjuntura anunciados no período podemos citar o volume de crédito que expandiu 1,9% em setembro para R$ 3,81 trilhões, com a inadimplência em queda para 3,1% (de 3,3%), endividamento das famílias em 47,5% (com crédito imobiliário) e juros do rotativo do cartão de crédito em leve queda para 309,9%. O Tesouro anunciou que o déficit do governo em setembro foi de R$ 76,15 bilhões, acumulando no ano, déficit de 677,4 bilhões. A receita real caiu 2% e as despesas cresceram 43,5%. As despesas sujeitas ao teto de gastos cresceram 5,5% até setembro, do limite de expansão de 6%.
Já o Bacen informou que o déficit primário ficou em R$ 635,9 bilhões, algo como 11,9% do PIB (em setembro queda para R$ 64,6 bilhões), com a previsão oficial para 2020 de R$ 895,8 bilhões, cerca de 12,5% do PIB. O déficit nominal (inclui juros pagos) do ano está em R$ 888,5 bilhões, correspondente a 16,7% do PIB, o que é extremamente elevado. A dívida bruta subiu para 90,6% do PIB, vindo de 88,8 % no mês anterior. O IBGE anunciou dados da PNAD contínua do trimestre encerrado em agosto com a taxa de desemprego evoluindo para 14,4%, contra taxa de 11,8% em igual período.
Faltou trabalho para 33,3 milhões de pessoas (recorde) e o número de desalentados cresceu no trimestre em 1,14 milhão, para 5,8 milhões. A qualidade do emprego piorou mais, muito embora o Caged tenha mostrado crescimento de vagas em setembro de 313,5 mil pessoas, com ênfase na contração pela indústria.
No mercado local, muita volatilidade nos preços em função da volatilidade global, divulgação de resultados do trimestre (muitos e dentre eles Bradesco, Vale e Petrobras — bons lucros e ajustes) e, ainda, muita aversão ao risco. O Bacen teve que interferir no câmbio vendendo posição à vista em montante próximo de US$ 2 bilhões. Até a sessão de 28/10, os investidores tinham aplicado R$ 3,2 bilhões, mas o saldo do ano mostrava saídas líquidas de R$ 84,6 bilhões. Em outubro, a Bovespa fechou com queda de 0,68% e no ano de 2020 perde ainda 18,75%.
Principais Indicadores
BOVESPA -7,21 (93.951)
DOW JONES -6,47%
NASDAQ -5,80%
DÓLAR R$ 5,74 (-1,99%)
Perspectivas
A próxima semana já começa complicada por conta do feriado de finados no Brasil, exigindo eventualmente alguma correção nas aberturas de terça-feira. Porém, na terça-feira os investidores estarão voltados para a eleição americana, principalmente a contagem de votos antecipados na Flórida e depois Pensilvânia. O grande risco, como dissemos, é que o resultado demore e que haja judicialização da eleição caso a diferença seja pequena em áreas fundamentais. Afinal, todos sabem da característica beligerante de Trump.
Os olhos estarão voltados também para a expansão (ou não) da contaminação pela covid-19 e novas medidas restritivas que podem até causar novas recessões em países e até nos EUA. Cada vez mais se fala de “duplo mergulho” em algumas economias, especialmente na Alemanha. Melhora mesmo provavelmente só quando houver uma vacina eficiente e disponível para as populações e segurança de contato social. A semana também reserva dados importantes que serão anunciados, terminando com o payroll e a criação de vagas na economia americana.
Por aqui, além desses fatos interferirem nos nossos mercados, vamos nos preocupar e questionar todos os problemas relacionados com a deterioração fiscal e como isso será resolvido no futuro. A semana tem na agenda a votação da independência do Bacen marcada no Senado para 3/11 e os vetos do presidente ao marco do saneamento e desonerações. Vamos ver se isso irá mesmo ocorrer. Como se diz no jargão popular, o Congresso está “mais parado que saci andando de patinete”
No mercado, não deveríamos perder a faixa de 93.300 pontos do Ibovespa sob pena de acelerar perdas e ir buscar inicialmente a faixa de 89 mil pontos. Melhora só quando ultrapassarmos novamente os 98 mil pontos e em seguida o patamar de 103 mil pontos.
Alvaro Bandeira
Sócio e economista-chefe do banco digital Modalmais
Fonte: www.modalmais.com.br/blog/falando-de-mercado